Hoje, o título deste artigo é um duplo exercício de abstração. Primeiro, porque não sabemos quem ganhará as eleições de 2018. Daí surge, justamente, o segundo ponto: apesar de não sabermos quem irá vencer o pleito, tudo indica que a resposta está entre Haddad e Bolsonaro. É extremamente difícil, portanto, que o candidato pedetista chegue ao segundo turno, quem dirá ser presidente do Brasil.
Por outro lado, ainda é cedo para descartá-lo (assim como Alckmin) da corrida. Política é areia movediça e qualquer candidato pode ser engolido em questão de dias. O que vemos é que, conforme diminui o tempo até a votação, diminuem também as probabilidades de Ciro alcançar o turno seguinte. O mesmo vale para Alckmin.
Ciro tem leve vantagem percentual nas pesquisas em relação a Alckmin: o último mês que o ex-governador do Ceará teve menos de 10% em mais de uma pesquisa foi agosto. Desde então, ele tem mantido suas intenções entre 10 e 14%. O tucano, por sua vez, parece não conseguir quebrar a barreira dos 10%, oscilando entre 6 e 9% em praticamente todas as pesquisas de setembro.
Poderia escrever sobre o que aconteceria com o mundo dos investimentos se Alckmin ganhasse as eleições, mas me parece muito óbvio. O ex-governador de São Paulo sempre foi o preferido do mercado e com certeza traria muitos frutos, como as reformas, as privatizações e tantas outras medidas liberais.
Pela falta de obviedade sobre o que ocorreria no governo de Ciro Gomes – fique calmo, vou explicar o porquê da incerteza –, prefiro analisar o programa econômico de seu plano de governo. Para facilitar, o texto será dividido em eixos: previdência, privatizações, política fiscal e outros aspectos importantes da economia.
É evidente que o mercado, dado o temperamento de Ciro e seu apreço ao desenvolvimentismo, o classificou como contrário às reformas. Apesar de entender a classificação, considero o candidato melhor que, por exemplo, Fernando Haddad no campo da economia. Não seria um candidato ideal mas, até aí, Bolsonaro também não parece ser.
Aos fatos:
1. Previdência: diferentemente do PT (oh céus…), Ciro Gomes admite a necessidade de reformar a previdência e defende um sistema único previdenciário via regime de capitalização. O desenho da reforma é semelhante às propostas de Álvaro Dias e Marina Silva e diferente dos modelos de Alckmin e Bolsonaro. Ainda assim, a discussão sobre a capitalização não é unânime entre os economistas mais respeitados.
2. Privatizações: talvez o ponto mais azedo para os investidores. Nesse ponto, o pedetista é radicalmente contrário à privatização das grandes estatais, como Eletrobras (SA:ELET3), BB (SA:BBAS3) e Petrobras (SA:PETR4). Ciro defende ainda a suspensão do acordo entre Embraer (SA:EMBR3) e Boeing. Seu assessor econômico, Mauro Benevides, afirmou que 77 das 148 estatais poderiam ser privatizadas eventualmente – atitude longe de agradar o setor privado
3. Política fiscal: nesse quesito, o candidato também desperta desconfiança do eleitorado mais liberal. Isto porque o próprio Ciro Gomes já deixou claro que revogaria o teto de gastos, medida que considera insustentável. No entanto, sua equipe propõe no programa a manutenção da PEC desde que ela sofra algumas mudanças, como a retirada dos investimentos do limite.
A verdade é que o pedetista acredita fortemente no Estado como propulsor do desenvolvimento econômico e, por isso, deve estimular o setor de infraestrutura para aumentar a porcentagem do investimento no PIB brasileiro. A grande ameaça desse modelo é a ocorrência dos mesmos erros da política das campeãs nacionais executada no governo Dilma, cujo resultado já conhecemos e repudiamos.
É inconclusivo se o candidato conseguirá se comprometer com a austeridade fiscal, como se propõe, e adotar o modelo de desenvolvimento descrito acima. Mal comparando, é o mesmo tipo de incerteza que paira sobre a candidatura de Bolsonaro e a efetividade sua "guinada liberal".
4. Destaques sobre economia:
O principal destaque negativo de seu programa é a flexibilização do tripé macroeconômico na parte de câmbio. O candidato acredita que o câmbio deve oscilar em um patamar competitivo para a indústria nacional, reduzindo a volatilidade. A ideia parece pouco sustentável por ir contra às leis naturais do mercado. Esse é um dos pontos nevrálgicos do programa, que pode comprometer a economia brasileira.
O programa econômico de Ciro ainda propõe algumas medidas para reformar o sistema tributário brasileiro. Entre elas, está a adoção de um Imposto sobre o Valor Agregado, para simplificar os tributos – medida essa que também consta no programa de Alckmin para a economia. Outra forte bandeira visando o incentivo ao consumo e aquecimento da economia é "limpar" o nome dos brasileiros endividados no SPC. A medida é considerada muito ambiciosa, mas foi bem recebida pelo mercado pela iniciativa de flexibilizar as condições de pagamento das dívidas. Obviamente, especialistas cobram mais detalhes.
É fácil identificar quais são as lacunas de Ciro, partindo de uma perspectiva liberal. Em um mundo ideal, ele seria rapidamente descartado de qualquer projeto encabeçado pela economia mais ortodoxa. Contudo, como estamos falando de um Brasil que pode ter os responsáveis pela maior crise da história do país de volta ao poder – e cometendo os mesmos erros – não hesitaria, tivesse a decisão em minhas mãos, em escolher o ex-governador do Ceará. Se o ditado popular crava "o bom é inimigo do ótimo", eu digo: o regular é inimigo do péssimo.