Arturo Escarda
Moscou, 26 nov (EFE).- A menos de quatro meses para as eleições na Rússia, ninguém duvida que Vladimir Putin seguirá por outros seis anos no Kremlin, ao contrário do primeiro-ministro Dmitri Medvedev, um político que pode ser substituído por um de seus piores inimigos, o ex-ministro de Finanças Alexei Kudrin.
Considerado um dos políticos mais liberais no entorno de Putin, Kudrin se ofereceu neste fim de semana a presidir o Governo depois das eleições presidenciais do próximo mês de março.
"Não corresponde a mim a decisão (...) mas estou disposto a tudo para que o próximo Governo tenha mais sucesso do que o anterior", disse ao ser questionado sobre os rumores que o colocam à frente do Executivo depois das eleições, em entrevista transmitida neste fim de semana pelo canal de televisão estatal "Rossia".
Kudrin dirigiu durante 12 anos as finanças russas, desde a chegada de Putin ao poder em 2000 e até o final de 2011, e embora tenha saído do Governo pouco antes da volta do atual presidente ao Kremlin, nunca deixou de ser elogiado por este como um dos melhores especialistas financeiros da Rússia.
O ex-ministro deixou o Governo por diferenças com o presidente Dmitri Medvedev, e desde então sempre se manteve firme na sua determinação de não voltar ao poder enquanto o atual primeiro-ministro seguisse à frente do Executivo.
Agora que faltam meses para as eleições presidenciais - às quais Putin concorrerá com toda segurança para ser reeleito -, a popularidade de Medvedev está baixa e praticamente ninguém dá nada pela sua continuidade na política.
O atual mandato de Putin esteve marcado pela volta ao autoritarismo e as tensões com Ocidente, sobretudo após a anexação da Crimeia, mas também pela estagnação da economia e a notável queda da qualidade de vida dos cidadãos.
Talvez Kudrin - um liberal que deu ao presidente russo seus melhores resultados no âmbito econômico, que rejeita o isolamento internacional e os políticos exteriores agressivos, e que aposta por reformar a economia e o sistema de Governo - seja a carta na manga para dar um inesperado giro em toda a política de Putin.
O ex-ministro de Finanças, à frente do "think tank" Comitê de Iniciativas Civis, está há vários anos trabalhando por incumbência do líder russo em uma estratégia de desenvolvimento para o país, e as reuniões entre ambos são regulares.
Kudrin é partidário de uma dolorosa reforma econômica estrutural capaz de relançar o crescimento anual até números muito acima dos 2% com o qual o país deve terminar este ano no melhor dos casos.
Ao contrário de muitos no Governo de Medvedev, sua política liberal aposta, entre outras medidas, por aumentar a idade de aposentadoria até os padrões europeus (na Rússia os homens se aposentam aos 60 anos e as mulheres, aos 55); liberalizar os mercados, aflorar a economia submersa mediante uma reforma tributária e afrouxar o controle do Estado sobre as empresas.
Mas, além disso, - e este é um dos pontos que mais lhe afastam de Putin - defende uma drástica redução das despesas em Defesa para dirigir esse dinheiro à educação, saúde, políticas sociais e investimentos em infraestruturas.
Putin escuta Kudrin, inclusive ordena ao Governo de Medvedev que estude a viabilidade de suas propostas, mas até agora fez muito pouco.
Em abril de 2013 ofereceu que Kudrin voltasse ao Governo, e fez isso em público, durante a tradicional linha direta com os cidadãos transmitida por todas as televisões estatais do país.
Mas então, diante de milhões de telespectadores, Kudrin respondeu ao chefe do Kremlin que não voltaria a um Executivo de "medidas e reformas médias" que dirige por inércia "ao invés de fazer políticas reais".
Eram tempos de crise econômica na Europa e relativa abundância na Rússia; Crimeia seguia sendo ucraniana e Putin, inclusive criticado por reprimir os protestos antigovernamentais nas ruas de Moscou, era ainda um líder respeitado no mundo.