Por Victor Borges e Fabricio de Castro
(Reuters) - O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, anunciou nesta quinta-feira que o governo comunicou ao Conselho Monetário Nacional (CMN) que decidiu adotar uma meta de inflação "contínua" a partir de 2025 e que o colegiado optou por manter, em 2026, a mesma meta de 3% já vigente para 2024 e 2025, com 1,5 ponto percentual de tolerância para mais ou para menos.
Haddad fez o anúncio após participar de reunião do CMN com o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, e a ministra do Planejamento e Orçamento, Simone Tebet.
A nova dinâmica para cumprimento da meta será estabelecida por decreto a ser publicado pela Presidência da República, conforme Haddad. Segundo ele, a decisão por iniciar a meta contínua em 2025 ocorreu porque este ano marcará o início do mandato do próximo presidente do BC. Campos Neto permanecerá no cargo apenas até o fim de 2024.
Haddad pontuou ainda que o horizonte para cumprimento da meta contínua será de 24 meses.
"Na pratica, você trabalha com 24 meses, porque você define uma trajetória de atingimento daquela meta e, quando você tem crises, você não abre mão da meta, porque o que se fazia no Brasil era abrir mão da meta para cumprir o ano-calendário", explicou Haddad.
"Agora você faz o contrário, você mantém a meta abrindo mão do ano-calendário. É uma diferença de metodologias, você dá, efetivamente, um horizonte de longo prazo para a autoridade monetária, independente das circunstâncias políticas."
Além disso, segundo ele, o BC terá que prestar contas sobre seu trabalho para perseguir a meta de inflação de forma "mais frequente". Ele sinalizou que isso deve ocorrer anualmente. Os detalhes estarão especificados no decreto.
Atualmente, o presidente do BC é obrigado a prestar contas, por meio de carta aberta ao ministro da Fazenda, como presidente do CMN, apenas quando a meta de inflação é descumprida.
A mudança na dinâmica de cumprimento da meta surge 24 anos depois de o CMN ter estabelecido, pela primeira vez, uma meta de inflação a ser perseguida pelo BC. Em resolução de junho de 1999, o CMN definiu pela primeira vez uma meta de inflação para o BC, dando início ao chamado “regime de metas”.
Haddad ressaltou que, com a mudança no horizonte para a meta, o Brasil se alinhará à grande maioria dos países que adotam esse regime. Segundo o ministro, os índices de preços no Brasil já estão convergindo para a meta de inflação vigente. Ele também defendeu que, em agosto, o BC inicie o processo de cortes da taxa básica Selic, atualmente em 13,75% ao ano.
"Há uma grande expectativa na área econômica do governo que a partir de agosto tenhamos cortes consistentes da taxa de juros", disse.
Haddad, no entanto, não deixou claro o que seriam "cortes consistentes". Na curva de juros brasileira, a precificação atual majoritária é de corte de 0,25 ponto percentual em agosto. Porém, existem chances menores, precificadas na curva, de um corte de 0,50 ponto percentual.
"Queremos garantir para a sociedade brasileira um 2024 melhor do que 2023", disse Haddad, ao justificar a mudança na dinâmica para o cumprimento da meta de inflação.
Haddad afirmou ainda que, considerando as próprias comunicações do BC, haveria espaço para cortes consistentes da Selic. Ao mesmo tempo, ele disse que a decisão sobre juros é da autarquia.
"Eu não estou torcendo, eu estou falando a realidade do país. O Brasil é o país que pratica a maior taxa de juros do mundo", disse durante a coletiva. "Agora, o que o BC vai fazer, ele vai fazer com a autonomia que o Senado concedeu. Minha opinião é de que há espaço consistente para a queda da taxa de juros."
DECISÃO DO GOVERNO
O ministro também foi questionado sobre a decisão em si sobre a meta contínua, que foi apenas comunicada ao BC.
"O que eu fiz hoje foi comunicar, até por lealdade ao Banco Central, para que ele não fosse surpreendido pelo decreto do presidente. Por dever de lealdade ao órgão de Estado, eu disse: 'nós vamos alterar o decreto'."
Durante entrevista coletiva na manhã desta quinta-feira, o presidente do BC, Roberto Campos Neto, qualificou a possível adoção da meta contínua como um "aprimoramento" do sistema, mas disse que seria preciso "entender como será feita a aferição". Em vários momentos, ele afirmou que não adiantaria seu voto no CMN.
Pelas palavras de Haddad, Campos Neto foi apenas comunicado da mudança, que é atribuição do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. A coletiva de imprensa no Ministério da Fazenda contou com a presença de Haddad e Tebet. Campos Neto não apareceu. A partir desta sexta-feira, Campos Neto estará de férias.