Por Jessica Bahia Melo
Investing.com - O avanço inflacionário americano é o foco no noticiário econômico desta semana, tendo em vista que o indicador servirá como base para tomada de decisão durante a próxima reunião das autoridades do Federal Reserve Fed, o banco central dos Estados Unidos.
A média das estimativas de analistas compilada pelo Investing.com é de uma disparada de 8,8% para a inflação anual em junho, o que seria o patamar mais alto da história recente. Para o indicador mensal, a projeção é de 1,1%, acima do 1% de maio. O núcleo do Índice de Preços ao Consumidor (IPC), que exclui itens voláteis como energia e alimentação, tende a mostrar aumento de 0,6% no mês e 5,7% no ano, segundo as mesmas estimativas dos agentes do mercado. Os dados serão divulgados nesta quarta-feira, às 9h30 (horário de Brasília).
Nicole Kretzmann, economista-chefe da Upon Global Capital, que considera as mesmas estimativas, reforça que esses valores são claramente muito altos, bem acima da meta do Fed, e são puxados em boa parte pelo aumento dos combustíveis. A economista considera dois pontos principais para avaliação nesta quarta.
“Se já está havendo queda do preço de bens de consumo causada por excesso de estoque dos principais varejistas e como virá a alta em serviços, que seguem sofrendo pressão altista pela dificuldade de contratação de mão-de-obra”, explica. Kretzmann destaca outros itens relevantes para ajuste de política monetária, como moradia e automóveis, que também serão acompanhados de perto. “Moradia é um termômetro importante de quanto a economia está aquecida e qual é a velocidade do repasse das altas recentes. Já os preços de automóveis são bons indicadores para determinar se as disrupções na cadeia global de produção estão sendo normalizadas”, completa.
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João Beck, economista e sócio da BRA, concorda que a inflação americana deve 8vir forte e surpreendendo por conta dos combustíveis. A projeção também é de que o IPC atinja seu pico e comece a declinar, com preços de commodities e combustível caindo, além dos efeitos da alta das taxas de juros do Fed. “Mesmo tendo cedido nos dias recentes, os combustíveis ainda devem deixar esse recuo somente para o registro de julho. O setor que deve contribuir também para uma inflação alta é o de tarifas aéreas e veículos (tanto novos quanto usados) em que a cadeia de produção ainda não mostra sinais de estabilização”, detalha.
IPC e Fed
Nesta segunda-feira, o presidente do Federal Reserve de Atlanta, Raphael Bostic, disse que se não houver uma melhora no ritmo do avanço inflacionário, a autoridade monetária teria justificativa para outro aumento de 0,75 ponto percentual na taxa básica de juros após a reunião no final deste mês. Segundo Bostic, a atual taxa dos fed funds - entre 1,5% e 1,75% - ainda estaria "estimulativa" para a atividade econômica americana.
“O controle inflacionário precificado se dará por uma eventual recessão para os americanos, algo que o Fed vem a todo custo tentando evitar. Mantemos por enquanto a perspectiva de que o Fed subirá o juro em 75bps, seguido de dois aumentos de 50bps e outros dois de 25bps, mas estes últimos parecem menos factíveis nesse momento”, acredita o economista-chefe da Ativa Investimentos, Étore Sanchez.
Já a previsão da Oxford Economics é de que o Fed leve seu juro básico para o intervalo de 3,75-4% ao ano já no início do ano que vem, o que considera um aperto monetário de aproximadamente 1,75-2 pontos acima do seu juro neutro. “Esse cenário toma como premissa uma projeção de inflação que vai ficar ao redor de 8,5% no próximo trimestre e começar a reduzir rápido depois disso, fechando esse ano em 7,3% e 1,7% no ano que vem. Estamos bastante otimistas e acreditamos que a inflação deve cair rápido no ano que vem por causa das nossas projeções para o preço de commodities”, diz o economista Felipe Camargo, que estima o barril de petróleo WTI, referência nos Estados Unidos, em R$90 no ano que vem.
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Influência nas ações
Como a inflação influencia na taxa de juros americana, também interfere nos preços de ativos de renda variável, como ações. Em nota a clientes, Christopher Harvey, analista sênior do Wells Fargo (NYSE:WFC) (BVMF:WFCO34), afirmou que ativos de risco podem ter recuperação de curto prazo após a divulgação do relatório de inflação de junho. Segundo o analista, as ações só cairiam em caso de uma “leitura de inflação muito acima do consenso”.
“Nossa expectativa é que as ações tenham um repique de curto prazo (rali de apetite para o risco) se o IPC geral vier em linha, levemente acima ou bem abaixo do consenso de 1,1% mensal (total) e 0,5% mensal (núcleo)”, pondera Harvey.
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Juros nos EUA e países emergentes
Altas nos fed funds americanos podem fazer com que outros países elevem também suas taxas de juros, visando normatizar o câmbio - e aumentando o risco em caso de grande comprometimento de dívidas públicas. Os impactos de elevações nas taxas de juros americanas podem ser elevados devido à relação com a solvência fiscal de muitos países, de acordo com o economista da Oxford Economics.
“Foi durante o aperto do Fed em 2018-19 junto da guerra comercial que a Argentina foi obrigada a pedir moratória e solicitar socorro ao FMI [Fundo Monetário Internacional], por exemplo. Países com elevado endividamento externo estão fortemente expostos a essas questões de solvência fiscal. Além disso, existem pressões na taxa de câmbio e demais preços de ativos locais, o real se depreciou 11,5% em junho, e estamos notando movimento similar em quase todos os latino-americanos desde então”, conclui Camargo.