Por Lisandra Paraguassu
BRASÍLIA (Reuters) - O empresário Joesley Batista confirmou à Polícia Federal que fazia depósitos periódicos em uma conta no exterior a pedido do ex-ministro Guido Mantega, então titular da Fazenda no governo Dilma Rousseff, e que parte desses recursos foi usada na campanha à Presidência de 2014, por meio de caixa 2.
Em depoimento prestado no âmbito da operação Bullish na quinta-feira, ao qual a Reuters teve acesso, Joesley afirmou que extratos da conta eram apresentados periodicamente a Mantega para comprovação do pagamento.
A operação Bullish investiga possíveis fraudes no Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) para beneficiar a JBS (SA:JBSS3), controlada pela família Bastista.
Parte dos recursos seria usada depois na campanha presidencial de 2014, em transferências feitas dentro do Brasil e que estão destacadas no "planilhão" -um levantamento de todas as propinas pagas pela JBS a políticos e entregues pelo executivo em sua delação premiada.
"Todos os pagamentos foram realizados a mando de Guido Mantega, mas não havia registros de email, mensagens ou notas fiscais."
A investigação sugere que, em troca de pagamentos de propinas, a JBS teria sido beneficiada em negociações para obtenção de empréstimos no BNDES.
À Polícia Federal, no entanto, Joesley defendeu suas operações com o BNDES, negando ter recebido benefícios especiais, afirmando que suas negociações com o banco eram "duras".
No entanto, confirma que, quando Mantega era presidente do banco, acompanhou e pressionou os técnicos para liberarem empréstimos para a JBS comprar a empresa Swift Argentina, em 2005. "Se não fosse a pressão e acompanhamento de Guido Mantega o empréstimo não teria saído", disse Joesley no depoimento, confirmando que ele mesmo pediu ao então presidente do banco que acelerasse os trâmites.
O empresário afirma que as condições não foram boas, mas que não teria mais tempo de captar recursos com bancos privados. E que não sabia que tipo de pressão Mantega exerceu sobre os técnicos.
Joesley afirmou ainda que se aproximou de Mantega por meio do empresário Victor Sandri, do grupo Cimento Penha, de quem o ex-ministro seria amigo. Quando Mantega se tornou presidente do BNDES, a JBS passou a pagar 50 mil reais por mês a Sandri, para facilitar a aproximação com o político.
Em depoimento na operação Zelotes, em que Sandri é investigado, Mantega confirma que conhece Sandri por ter vendido a ele dois terrenos em São Paulo na década de 1990, mas diz que depois disso só o encontrou uma vez.
O advogado de Mantega, Fábio Tofic, classificou de mentirosa a declaraçção de Joesley e disse ter "prova material da mentira".
"A única conta no exterior que o ministro Guido Mantega tem ele já declarou à Justiça e o extrato vai comprovar que a declaração dada por Joesley é mentirosa", disse Tofic à Reuters.
"Este é o típico caso em que existe prova material da mentira do delator", acrescentou o advogado. "O delator nesse caso vai ficar em muitos maus lençóis."
CONSULTORIA DE PALOCCI
Joesley contou ainda à PF sobre sua aproximação com o também ex-ministro Antonio Palocci, de quem se dizia amigo "de frequentar a casa".
A JBS contratou o ex-ministro para fazer uma pesquisa de mercado nos Estados Unidos, por 2 milhões de reais, e para dar "consultoria política" à empresa sobre as relações no governo, por valores que variavam entre 30 mil e 50 mil reais. Mas, apesar da suposta amizade, Joesley nega saber que, à época, Palocci era deputado federal.
Em 2010, quando era também coordenador da campanha de Dilma Rousseff à Presidência da República, Palocci teria pedido 20 milhões de reais. Segundo Joesley, parte desse valor foi paga três empresas -que ele não dá nomes- e "não foram contabilizados como doação oficial".
Joesley cita ainda pagamentos feitos ao operador financeiro Lúcio Funaro. Segundo ele, essas negociações não tinham relação com o BNDES, mas com a liberação de recursos da Caixa para a aquisição da Eldorado Celulose e, depois, da Alpargatas (SA:ALPA4).
As informações confirmam o que foi dito por Funaro em seu depoimento no inquérito que investiga o presidente Michel Temer por corrupção passiva e participação em organização criminosa. Funaro afirma que facilitava essas negociações em nome da cúpula do PMDB.
Procurada, a defesa de Funaro disse que se reserva a prestar todos os esclarecimentos a todos os temas sob investigação, em inquéritos e ações respectivas, nos foros competentes.