Por Daniel Trotta
HAVANA (Reuters) - Por décadas, essa foi a primeira resposta de Cuba às críticas.
Mau desempenho econômico? Um óbvio efeito do embargo comercial dos EUA, resultante em um bloqueio à ilha por uma provocadora superpotência.
Prisões de dissidentes? Um ato legítimo de auto-defesa contra mercenários que trabalhavam para o país mais rico do mundo, que apoiou a fracassada invasão da Baía dos Porcos e tramas de assassinatos ao líder revolucionário Fidel Castro.
Agora, no entanto, com Washington concordando em restaurar laços diplomáticos que estavam cortados desde o início dos anos 1960, o governo comunista de Cuba pode não ser capaz de culpar tão prontamente sua nemesis da Guerra Fria.
"O grande lobo mau do imperialismo ianque está suavizando sua mordida - então eles não mais terão um bode expiatório pronto para explicar o que está errado com a ilha", disse um diplomata latino-americano que costumava morar em Cuba e ainda acompanha os eventos no país.
Cuba buscou repetidamente dispersar a ideia de que secretamente desejava a continuidade do embargo, dizendo que se os norte-americanos assim acreditassem, deveriam desafiar Cuba, suspendendo as sanções.
Mas, como agora essa possibilidade é maior, também são os riscos.
Estados latino-americanos e outros países que apoiaram Cuba em sua longa batalha contra os EUA podem se tornar menos tolerantes a seu governo de um só partido, à repressão a dissidentes e aos rígidos controles sobre a economia e a imprensa caso a ameaça dos EUA desapareça.
"Não haveria nenhuma justificativa de que estamos em estado de guerra, porque os americanos estão constantemente nos atacando. Eles não serão capazes de justificar isso, pelo menos não para seus amigos", disse José Daniel Ferrer, líder da União Patriótica Cubana (Unpacu), maior organização dissidente do país.
O presidente dos EUA, Barack Obama, deixou claro que espera melhorias nos direitos humanos em Cuba como parte do acordo para restaurar inteiramente as relações. O governo dos EUA chamou isso de um "foco crítico ao nosso maior comprometimento".
A reaproximação anunciada na quarta-feira incluiu uma troca de prisioneiros - o cidadão dos EUA Alan Gross e um cubano que espionava para os EUA foram libertados em troca de três agentes cubanos que estavam presos nos EUA.
Um represente dos EUA disse que Cuba também libertou 53 pessoas consideradas prisioneiros políticos por Washington.
Mesmo assim, o acordo estabelece atenção sobre o histórico de direitos humanos de Cuba, à medida que seus críticos acusam Obama de ceder demais em troca de Gross, cuja inocência o governo dos EUA sempre insistiu.
Cuba já soltou a maior parte de seus prisioneiros políticos, e a Anistia Internacional disse que o número agora tem apenas um dígito, enquanto a Unpacu afirma estar entre 90 e 100.
O presidente Raúl Castro, de 83 anos, tem feito esforços para implementar reformas econômicas alinhadas com o mercado desde que assumiu o lugar do fragilizado Fidel, em 2008.
No dia que assumiu o cargo, ele disse que os cubanos não deveriam utilizar o embargo como uma desculpa para falta de abastecimento e dificuldades econômicas.
Mas suas reformas estão lentas e ele disse que uma meta mais ampla é fortalecer o socialismo cubano, não enfraquecê-lo.
Então não foi surpresa que, mesmo quando foi anunciada a trégua entre EUA e Cuba, Castro também tenha relembrado ao mundo que as sanções ainda estão ativas.
"Isso não significa que o problema esteja resolvido", disse ele. "O bloqueio econômico, comercial e financeiro que causa à nossa nação grandes danos humanos e econômicos deve parar."
Cuba estima que as sanções já custaram à sua economia cerca de 117 bilhões de dólares em comércio perdido e custos extras, incluindo quase 4 bilhões de dólares na mais recente estimativa anual.
(Reportagem adicional de Andrew Cawthorne em Caracas)
((Tradução Redação Rio de Janeiro; 55 21 2223 7141)) REUTERS FP MPP