SÃO PAULO (Reuters) - "Spotlight - Segredos Revelados" é um filme que não tem medo de fazer grandes perguntas sobre o papel da imprensa no mundo contemporâneo.
Qual a missão de um jornal: apenas informar ou também tentar mudar a sociedade na qual está inserido? A partir de uma história real – que se desenrolou entre 2001 e 2002 –, o diretor Tom McCarthy ("O Agente da Estação") investiga essas duas proposições.
Seguindo os passos de outros filmes sobre investigações jornalísticas – como "Todos os Homens do Presidente" –, o diretor, que assina o roteiro com Josh Singer, estrutura o longa na forma de um suspense.
Concorrendo em três categorias no Globo de Ouro – melhor filme drama, diretor e roteiro – , o longa já ganhou diversos prêmios, entre eles, Filme do Ano pelo American Film Institute, National Board of Review, e pelas associações dos críticos de Nova York e Los Angeles.
Hoje a história já é conhecida, tendo resultado na acusação de 249 padres e mais de 1500 vítimas na região de Boston, além da renúncia de um cardeal, que acabou transferido para Roma.
Mas McCarthy a conta com a urgência do tempo presente em que ela se desenrola. Nesse sentido, "Spotlight" está tão interessado no processo jornalístico quanto na descoberta da equipe do jornal "The Boston Globe", que desvendou os crimes cometidos por religiosos e acobertados pela Igreja local.
O ponto de partida é a chegada de um novo editor, Martin Barton (Liev Schreiber), que instiga o editor da seção "Spotlight" do jornal, responsável por reportagens mais profundas, a investigar as acusações de abuso sexual contra alguns padres.
Walter 'Robby' Robinson (Michael Keaton) e sua equipe – composta pelos repórteres Mike Rezendes (Mark Ruffalo), Sacha Pfeiffer (Rachel McAdams) e Matt Carroll (Brian d'Arcy James) – começam a puxar o fio, e descobrem não apenas que há uma história de abusos sistêmicos como que o próprio "Globe", o jornal mais importante da cidade, foi negligente diversas vezes no passado recente, quando as primeiras acusações e acordos vieram à tona. Estes renderam, no máximo, uma pequena matéria, sem qualquer sequência.
Há um quê de idealismo e responsabilidade moral que pautam esses repórteres. Eles sabem que estão diante de algo grande e importante, que se revela ainda maior na medida em que avançam nas investigações.
O filme acompanha todo o processo jornalístico, com as vitórias e contradições, sem nunca transformar jornalistas em heróis, mostrando os dois lados do trabalho – tanto o do sucesso quanto o preço pessoal que pagam por se entregar dessa forma a essa missão.
O que McCarthy não se aprofunda tanto em sua equação é a questão financeira. Apenas no começo, um figurão do jornal alerta que a maioria dos leitores são católicos, e os crimes que seriam investigados e, mais tarde, expostos, poderiam incomodá-los, levando-os a deixar de ler a publicação. Ao que o editor Baron responde: "Mas isso também é de interesse dos leitores".
Deixando de lado este aspecto da sustentação econômica do jornal, o diretor do filme concentra-se no papel da imprensa e da liberdade de expressão – que parece entrar em xeque quando o assunto envolve uma instituição poderosa, no caso, a Igreja Católica.
É a partir daí que McCarthy investiga os interesses da mídia na produção de suas matérias. Sua saída talvez seja um pouco idealista, mas não totalmente irreal, protagonizada por jornalistas empenhados. Por serem o elo mais fraco na cadeia de produção, talvez o combustível deles é mais a missão de informar ou transformar do que lucrar – embora, é claro, existam casos reais nos quais a fórmula se inverteu.
No fundo, o filme é sobre a disputa de dois tipos de fé – a religiosa e a da liberdade de expressão – embalada pela nostalgia de uma era
(Por Alysson Oliveira, do Cineweb)
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