Por Lisandra Paraguassu
CURITIBA (Reuters) - Em frente ao Tribunal da Justiça Federal do Paraná o clima de calmaria nesta terça-feira era traído pela quantidade excessiva de policiais nas redondezas, em preparação para um dos principais atos da operação Lava Jato, o depoimento do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, marcado para as 14h desta quarta-feira.
A alguns quilômetros dali, no entanto, a movimentação era outra. Já no meio da tarde, cerca de duas mil pessoas --a maioria militantes do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST)-- montavam um acampamento próximo à linha férrea, na entrada de Curitiba.
Era uma parte dos milhares de militantes que os movimentos sociais prometem colocar nas ruas de Curitiba em apoio a Lula.
"É um ato convocado espontaneamente pelos movimentos sociais, nosso movimento está fazendo uma defesa da democracia, não podemos retroceder nos direitos sociais", disse à Reuters Cedenir de Oliveira, da coordenação do MST.
O discurso em defesa de Lula se confunde com a crítica ao atual governo e às reformas.
"Acho que um governo que não foi eleito não tem o direito de mexer nos direitos do povo", argumenta Gabriel Marshall, 18 anos, assentado em Querência do Norte, no noroeste do Paraná, quando perguntado porque apoiava Lula.
"Se provarem tudo que ele fez de errado eu ainda voto nele, porque de todos que estão aí foi o único que não roubou dos pobres", disse.
Em meio às cozinhas comunitárias e às barracas de lona preta típicas dos acampamentos de sem-terras, também havia simpatizantes de Lula que não eram do MST, como as amigas Sandra Lúcia, de São Paulo, Odisséia Carvalho, do Rio de Janeiro, e Carla Migliorini, de Curitiba.
De vermelho, com um adesivo "Fora Temer", no casaco, a aposentada Sandra conta que veio na semana passada a Curitiba com um grupo de amigos, na expectativa do depoimento de Lula.
"Dessa vez vim sozinha, de carro, porque o meu grupo já não pode vir. Mas eu tinha de vir. A gente está vivendo um momento de ruptura institucional. Defender Lula é defender o estado democrático de direito", disse.
Outros ônibus estão programados para chegar na manhã desta quarta-feira à Curitiba. Os organizadores falam entre 30 e 50 mil pessoas para apoiar o ex-presidente e, de acordo com fontes petistas, o próprio Lula se movimentou ao longo da semana para obter manifestações públicas de apoio. Conversou com dirigentes partidários e de movimentos sociais que apoiaram a ação em Curitiba.
Do outro lado, a pouco menos de um quilômetro do Fórum de Curitiba, uma pequena turma de apoiadores de Sérgio Moro fazia barulho na esquina do museu Oscar Niemeyer. Não mais de 10 pessoas, o grupo costuma ser parte da paisagem em frente ao Fórum, vendendo camisetas a favor da Lava Jato sob uma barraca branca, mas teve que sair do local predileto por causa da interdição determinada pela PM.
"Está chegando mais gente. Imaginamos ter umas 3 mil pessoas aqui amanhã. Mas como demoraram muito para acertar o esquema de segurança, muita gente ficou com medo e não se acertou para vir. Aí ficou tarde, Estamos tentando mobilizar pelas redes sociais", disse à Reuters a porta-voz do grupo, Nalu Rezende.
Segundo Nalu, o grupo vai ficar por ali na quarta-feira, das 10h até às 19h, em uma vigília. Em um megafone, um dos membros do grupo toca músicas contra Lula. De vez em quando, um carro passava buzinando seu apoio. Um corajoso gritou "Lula lá" ao passar, e ouviu como resposta alguns desaforos acompanhados de "Lula na cadeia".
"Não vamos fazer passeata, vamos cumprir o que a PM determinou", disse Nalu. "O que não queríamos era que se passasse a impressão que Curitiba é uma cidade vermelha, petista. Curitiba é uma cidade verde e amarela."
EXPECTATIVAS
O ex-presidente só chega na manhã de quarta-feira à capital paranaense, algumas horas antes de seu depoimento, marcado para às 14h, em uma estratégia para evitar mais confusões. Antes de ir para o Fórum, deverá almoçar e se reunir com seus advogados. A ex-presidente Dilma Rousseff também virá a Curitiba e se encontrará com Lula antes do depoimento.
Entre os dirigentes petistas que se reuniram na cidade nesta terça-feira, há quem avalie que o depoimento se transformará em uma disputa entre dois rivais políticos, mesmo que um deles seja, na prática um juiz.
"Acho que Moro vai tentar controlar o discurso do Lula. Não vai querer deixar ele transformar o depoimento em uma defesa do governo dele", avaliou um dirigente petista, que pediu para não ser identificado. "Vamos ver o que ele vai conseguir."
O ex-presidente tentou de todas as formas tornar público seu depoimento. Foi pedido a Moro que o encontro fosse transmitido ao vivo, o que foi negado.
Também se chegou a iniciar um movimento para que os jornalistas pudessem assistir à audiência e, por último, os advogados entraram com dois pedidos --a Moro e, depois de negado, ao Tribunal Regional Federal da 4ª região que autorizasse a gravação do depoimentos pelos advogados de Lula.
"Há uma expectativa positiva para o depoimento. O presidente está muito tranquilo, seguro, muito convincente na sua inocência. Ao lado disso há uma mobilização muito grande", disse o senador petista Humberto Costa (PE).
Existe a expectativa dos movimentos sociais de que Lula vá ao encontro deles em um ato marcado para o final da tarde de quarta-feira.
De acordo com petistas ouvidos pela Reuters, ainda não há uma decisão. Vai depender da avaliação de segurança e da própria intenção do presidente de marcar o final de seu depoimento com um ato político.