Por Ricardo Brito
BRASÍLIA (Reuters) - O advogado e futuro ministro do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) Admar Gonzaga indicou que a Corte poderá eventualmente decidir absolver o atual presidente Michel Temer e punir apenas a ex-presidente Dilma Rousseff no julgamento da chapa vitoriosa em 2014 levando em conta não apenas o que está nos autos da ação, mas também o atual momento do país.
"Não só a circunstância política e econômica, mas a circunstância do jogo político à época (da eleição)", disse Gonzaga em entrevista exclusiva à Reuters, em seu escritório de advocacia, na quarta-feira.
Gonzaga, que assume o mandato no dia 16 no lugar do ministro Henrique Neves, citou a Lei de Inelegibilidade (Lei Complementar 64 de 1990) em seu artigo 23.
"O tribunal formará a sua convicção pelo livre convencimento de fatos públicos e notórios, desde que preservem o interesse público e lisura eleitoral", disse. "Isso deve ser aplicado a todos, a gente tem que julgar diante da nossa visão do ambiente político."
O advogado argumentou ainda que todo juiz "tem responsabilidade política".
"Um juiz de primeiro grau da instância de piso, tem responsabilidade com aquilo que faz na comarca. No TSE, nós temos a participação de três ministros do STF (Supremo Tribunal Federal por conta do viés constitucional e os ministros são guardiões de uma carta política", disse. "O TSE tem responsabilidade política, tem que observar todos os elementos que seja razoável e proporcional."
O futuro ministro do TSE disse que o depoimento do casal João Santana, marqueteiro da campanha de Dilma e Temer em 2014, e da mulher dele, Mônica Moura, podem trazer "elementos fundamentais" para o julgamento porque trabalharam na eleição.
Ele observou, entretanto, que com base nas informações vazadas até o momento pela imprensa o casal foi "bastante enfático" a respeito da não-participação de Temer nas supostas irregularidades e que o TSE terá de analisar essa circunstância no julgamento.
Gonzaga disse que a tese da separação de contas da campanha entre o titular e o vice --que vem sendo advogado pela defesa de Temer para livrá-lo de punição-- não é um entendimento consolidado pelo TSE e que há, sim, casos de pena a um e não a outro. Questionado se teria simpatia pela tese, ele se esquivou.
"Eu não tenho como te avaliar e se tivesse, pela legislação, não poderia te adiantar porque é ilegal."
Os comentários de Gonzaga ocorrem num momento em que tanto governo como líderes empresariais defendem a importância da estabilidade política para que a retomada da confiança e da atividade econômica não sejam prejudicadas.
O futuro ministro concordou com a extensão de prazo à defesa pelo TSE para apresentação de alegações finais.
"Porque essa questão poderia chegar, por cerceamento de defesa, ao Supremo Tribunal Federal e aí que se teria um prejuízo enorme para o enceramento desse processo."
Mas discordou da decisão tomada na terça-feira pelo tribunal de tomar o depoimento de quatro novas testemunhas do processo ao considerar que essa posição pode atrasar ainda mais o julgamento da chapa Dilma-Temer e abrir margem para novos pedidos, por exemplo, de diligências e perícias.
"Se a gente continuar nessa toada, o processo fica nessa coisa sem limite e sem termo", avaliou.
Ainda assim, ele considera que o julgamento pode ser concluído até agosto pelo TSE.
ODEBRECHT
O advogado afirmou que a Corte também vai analisar uma eventual exclusão de provas do processo, como a delação feita por executivos da Odebrecht, por não constar do objeto inicial do pedido, segundo alegam as defesas de Dilma e Temer. Segundo ele, a causa tem de ser bem delimitada.
"Não pode ficar aí atirando em qualquer lugar e depois ver quem você matou", disse.
Gonzaga brincou com a torcida de integrantes do Palácio do Planalto de que, empossado, votará para absolver Temer. Afirmou que é natural essa torcida pelos governistas, mas, questionado se pode haver surpresas, frisou: "É que nem futebol, você está torcendo e pode ser surpreendido pelo adversário".
Gonzaga disse que não vai se declarar impedido para julgar Dilma-Temer, mesmo tendo sido advogado da mesma chapa na eleição anterior, a de 2010. Ressaltou que não se envolve com as pessoas da causa, mas apenas com a causa e frisou já ter advogado para a chapa adversária do PT nas eleições de 2002 e 2006.
"Sou advogado, advogado é isso. Eu não me envolvo com um criminoso porque eu advoguei para um criminoso. Se eu advogar na matéria penal para alguém que cometeu um crime eu vou fazer o meu trabalho para dar um tratamento de justiça adequado", resumiu.