Por Luciano Costa
SÃO PAULO (Reuters) - Os planos do governo federal de privatizar a Eletrobras (SA:ELET3) ainda em 2018, último ano do presidente Michel Temer no cargo, devem enfrentar ainda diversas barreiras políticas e jurídicas, principalmente em meio às incertezas que cercam as eleições presidenciais do país neste ano.
A aprovação no Congresso Nacional de um projeto de lei para viabilizar o negócio pode se tornar uma luta com fortes contornos políticos, enquanto opositores da medida, como sindicatos e partidos de esquerda, podem também buscar diversas medidas legais para travar o processo, disseram especialistas à Reuters.
Atualmente, um trecho de uma medida provisória que retirou vetos à possibilidade de desestatização da companhia está suspenso por uma decisão da Justiça Federal de Pernambuco, mantida mesmo após recurso do governo ao Tribunal Regional Federal da 5ª Região.
"Muito provavelmente em algum momento essa liminar vai cair... mas certamente o governo ainda vai ter muito trabalho com liminares, até o último momento... vai ter uma enxurrada", disse à Reuters a sócia do escritório de advocacia Machado Meyer, Ana Karina Souza.
Ela ressaltou, no entanto, que o governo provavelmente está preparado para a batalha nos tribunais e que o principal desafio deve ser a passagem do texto pelo Congresso, quando deputados federais e senadores poderão inclusive propor alterações no projeto de lei da desestatização.
O coordenador do Grupo de Estudos do Setor Elétrico da Universidade Federal do Rio de Janeiro (Gesel-UFRJ), Nivalde de Castro, tem avaliação semelhante.
"Com esse Congresso, você não sabe o que vai sair... é até difícil para nós analisar esse tema. Esse será um processo muito mais político do que outra coisa, ainda mais em ano eleitoral", afirmou.
O projeto da Eletrobras deve ser relatado na Câmara pelo deputado federal José Carlos Aleluia (DEM-BA). Segundo informações da assessoria do parlamentar, já há um acordo para que assuma a relatoria e ele agora buscará ouvir as partes interessadas.
Aleluia, no entanto, avalia que o PL está mais focado na arrecadação a ser gerada para o Tesouro do que em benefícios para o setor elétrico, o que abre caminho para mudanças no texto.
Após a passagem pela Câmara, o projeto sobre a Eletrobras ainda deverá ser aprovado no Senado, presidido por Eunício Oliveira (MDB-CE).
"Na Câmara passa... o problema vai ser o Senado", disse à Reuters um analista político, que falou na condição de anonimato porque não tem autorização para falar com a imprensa.
Procurado, o senador Eunício disse, por meio da assessoria de imprensa, que não vai comentar a desestatização da Eletrobras neste momento.
O ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, disse na terça-feira, ao falar com jornalistas em Davos, na Suíça, que a privatização será "um desafio enorme" e "uma luta grande" para o governo.
OPOSIÇÃO FORTE
A proposta do governo prevê transformar a Eletrobras em uma corporação sem controlador definido por meio de uma oferta de ações que diluiria a fatia da União na empresa. A companhia utilizaria os recursos da operação para pagar ao Tesouro um bônus de 12,2 bilhões de reais em troca de melhores condições nos contratos de suas hidrelétricas.
Uma fonte do governo disse à Reuters que o modelo é "o possível" de ser aprovado no prazo previsto para a conclusão da operação e defendeu que o objetivo principal é recuperar a companhia e reduzir a influência de políticos em sua gestão.
Mas a proposta gerou críticas mesmo de alguns especialistas favoráveis à privatização, como o ex-presidente e ex-chefe do Conselho da Eletrobras, José Luiz Alquéres.
"O valor a arrecadar no curto prazo é pífio... está se destruindo valor", disse Alquéres à Reuters.
Ele afirmou que a transformação da companhia em uma corporação vai atrair fundos com interesse em lucro no curto prazo, o que pode gerar até mesmo disputas entre acionistas como as vistas na operadora de telefonia Oi (SA:OIBR4).
O engenheiro Felipe Chaves, diretor da Associação de Empregados de Furnas, também criticou a proposta do governo. Ele defendeu que alternativas como a venda em separado de subsidiárias da companhia poderiam ser mais benéficas ao país.
"Tem que abrir o leque das possibilidades. Fazer uma privatização dessa na correria pode ser um problema grande que a gente vai ter que resolver lá na frente, depois de um aumento explosivo de tarifas", afirmou.
Já o consultor Roberto D' Araújo, ex-conselheiro de Furnas, tem se posicionado publicamente contra a desestatização.
Ele defendeu que a crise financeira enfrentada pela Eletrobras nos últimos anos é resultado da forte interferência política, que teria prejudicado a eficiência da companhia a ponto de seus problemas agora serem utilizados pelo governo para justificar a privatização.
"Essa fragilização da Eletrobras não é de agora, vem desde 1995, por diversos governos", afirmou.