Por Natalia Scalzaretto
SÃO PAULO (Reuters) - Empresas de aplicativos de transporte estão preocupadas com a discussão entre candidatos a prefeito de São Paulo sobre o funcionamento desta ferramenta na cidade e temem alterações na regulamentação vigente e até mesmo a proibição de serviços, disseram companhias do setor consultadas pela Reuters.
Três dos quatro principais candidatos na disputa paulistana já defenderam publicamente alterações nas regras aprovadas este ano pelo prefeito Fernando Haddad (PT), que tenta a reeleição e ocupa a quarta posição nas pesquisas de intenção de voto, mas especialistas criticam a falta de detalhamento dessas propostas.
Empresas como Cabify e 99 já estão operando na capital paulista e manifestaram preocupação com um eventual fortalecimento excessivo da regulamentação, mudanças na tributação e até o fim do serviço na capital. Procurada, a norte-americana Uber, umas das líderes do setor, não se manifestou sobre as propostas dos candidatos.
O modelo atual de operações foi definido em maio deste ano por meio de decreto editado pelo governo Haddad e conta com o apoio da 99 e da Cabify. Ele prevê como principal regra uma cobrança de até 0,10 real por quilômetro das empresas que gerenciam os aplicativos. À época da edição do decreto, a Uber classificou a medida como "um primeiro passo" para a operação dos aplicativos.
Primeiro candidato a se manifestar sobre os aplicativos ainda no início da campanha, Celso Russomanno (PRB) chegou a afirmar que a Uber "está na ilegalidade". Após repercussão negativa, no entanto, o candidato chegou a divulgar vídeo nas redes sociais negando a intenção de proibir o aplicativo e defendendo regulamentar o serviço.
Em declaração à Reuters, a campanha de Russomanno, atualmente o segundo colocado nas pesquisas, reiterou que, em um possível governo, não há intenção de proibir o Uber e os demais aplicativos, e sim de regulamentá-los sob condições que não prejudiquem os outros meios de transporte na cidade.
"Pretendo revisar a regulamentação, dando mais equilíbrio para o transporte individual na cidade e garantindo plenos direitos a trabalhadores do segmento e cidadãos que utilizam o serviço", disse a equipe do candidato.
Outros candidatos, como João Doria (PSDB) e Marta Suplicy (PMDB), também fizeram propostas sobre o funcionamento dos aplicativos de transporte.
A equipe de Marta, atual terceira colocada nas pesquisas, afirmou que o objetivo da candidata do PMDB é evitar concorrência predatória entre os diferentes serviços de transporte e citou posicionamento que a candidata já havia expressado durante a campanha.
"No meu governo, a Uber continuará gerando empregos e sendo mais uma opção para os passageiros. Mas, para que motoristas de táxi e Uber possam competir, eu vou retirar todas as taxas que a prefeitura cobra dos taxistas", disse a campanha da candidata em nota enviada à Reuters. A assessoria da peemedebista não informou se Marta fará, caso eleita, mudanças na regulamentação atual.
Já Doria, que lidera as pesquisas, disse que é contra a redução de taxas aos taxistas em um momento de dificuldade financeira da prefeitura e também insistiu na regulamentação dos aplicativos.
"Os aplicativos, desde que regulamentados, podem operar. Não há razão para impedir a livre concorrência e gerar oportunidade de transporte com menor custo para a população", disse o candidato do PSDB à Reuters, acrescentando que ele não pretende taxar adicionalmente os aplicativos.
PRECISA MEXER?
Especialistas, por sua vez, criticam a maneira como o assunto vem sendo abordado pelos candidatos.
"Todo mundo está falando que é necessário regulamentar o Uber, mas eu não vi como até agora. A minha ideia, pessoal e particular, seria criar fatias de mercado. Então a prefeitura, que, teoricamente, é a dona dos alvarás dos táxis teria que ter uma parte do mercado... o resto seria iniciativa privada", disse o professor da Universidade Presbiteriana Mackenzie Paulo Bacaltchuck, especialista em engenharia de tráfego, que fez ressalvas ao modelo de regulamentação atual.
"Acho que está faltando um pouco de clareza na regulamentação, transparência", disse.
As empresas veem eventuais mudanças no decreto que regulamentou o serviço de aplicativos na cidade mais cedo neste ano como prejudiciais ao modelo de negócios.
"O decreto criado na capital paulista, mesmo com a necessidade de alguns ajustes, é dos mais inteligentes que foram feitos... Qualquer direcionamento contrário a este decreto pode ser visto como um retrocesso jurídico, institucional", disse a Cabify em posicionamento enviado à Reuters.
João Sabino, gerente de relações governamentais da 99, disse que a empresa apoia as regulamentações, mas vê com preocupação algumas das propostas, em especial as de Russomanno.
"A proibição do serviço seria o pior de tudo, como também uma regulamentação excessiva. E aí eu estou dizendo, limitação de porcentagem de cobrança do aplicativo", avaliou.
TRANSPARÊNCIA
A liberação dos dados das empresas é um ponto controverso na regulamentação. Inicialmente a prefeitura publicou resolução proibindo a divulgação individual dos dados dos aplicativos, mas logo depois suspendeu a medida.
Entre os candidatos, Doria apoia a transparência total dos dados, que também é defendida por Bacaltchuck, do Mackenzie. As empresas consultadas, no entanto, preferem a divulgação em conjunto dos dados do setor.
Para Sabino, da 99, o mercado de transportes por aplicativo ainda é embrionário e, portanto, a divulgação de dados, como estratégia de negócios e participação de mercado de cada companhia, pode ser usado em uma concorrência predatória.
"Isso pode, em pouco tempo, chegar a quebrar uma empresa", disse Sabino, que também apontou o risco de monopólios no setor.