Por Alexandra Ulmer
CARACAS (Reuters) - Logo após o amanhecer, dezenas de venezuelanos se juntaram em uma escura estação de ônibus em Caracas. Cada um arrastava uma grande mala, assim como cobertores, papeis-higiênicos, pães e garrafas d’água. Esposas em lágrimas, crianças confusas e pais idosos se abraçavam várias vezes até o momento de checar passagens e pesar malas, esperando horas até o ônibus sair.
Quando o ônibus finalmente saiu, os passageiros olharam para seus entes queridos, batendo nos vidros e mandando beijos, enquanto saíam rápido da capital em ruínas do país.
A bordo do ônibus, o web designer Tony Alonzo havia vendido seu violão de infância para ajudar a pagar sua passagem para o Chile. Durante meses ele ia dormir com fome para que seu irmão de 5 anos pudesse comer algo no jantar.
Natacha Rodríguez, uma operadora de máquinas, foi assaltada com arma três vezes no ano passado. Ela também seguia para o Chile, esperando dar uma vida melhor para seu filho.
Roger Chirinos deixou sua esposa e dois filhos pequenos para trás em busca de trabalho no Equador. Sua empresa de publicidade em outdoors chegou a um fim amargo: manifestantes destruíram seus outdoors para transformá-los em barricadas durante violentas manifestações contra o presidente Nicolás Maduro.
O ônibus deles conta a história de um país outrora rico em uma queda livre, enquanto centenas de pessoas fogem diariamente de uma terra onde fome e escassez é o novo normal.
No momento em que o sol nasce em Caracas, pessoas famintas já estão revirando lixos, enquanto crianças imploram do lado de fora de padarias. Quando escurece, muitos venezuelanos se fecham dentro de suas casas para evitar assaltos e sequestros.
Em um país com as maiores reservas comprovadas de petróleo, algumas famílias agora cozinham com madeira, porque não conseguem encontrar gás. A comida é tão escassa e cara que o venezuelano médio perdeu 10 quilos no ano passado.
“Eu sinto que a Venezuela sucumbiu para um mal irreversível”, disse Chirinos.
Muitos atribuem o íngreme declínio do país ao governo de Maduro, que aumentou sua força no poder, se apegando a políticas estatizantes que têm estrangulado a economia. Seu governo diz que está enfrentando uma conspiração liderada pelos Estados Unidos para sabotar a esquerda na América Latina ao acumular bens e alimentar a inflação.
Mais pobres a cada dia, centenas de milhares de venezuelanos concluíram que a fuga é a única opção. Com a moeda venezuelana praticamente sem valor e viagens aéreas fora do alcance de quem não é da elite, ônibus se tornaram caravanas da miséria da Venezuela, rodando dia e noite para as fronteiras e voltando amplamente vazios para começar o processo novamente.
Os 37 venezuelanos fugindo neste dia haviam vendido tudo --motos, TVs, até mesmo alianças de casamento-- para pagar pela fuga. A maioria nunca havia saído do país antes.
Por nove dias, uma repórter e um fotógrafo da Reuters acompanharam os imigrantes enquanto seguiam para o que esperam ser dias melhores no Equador, Peru, Chile e Argentina.
Por quase 8 mil quilômetros, eles passaram por algumas das paisagens mais espetaculares da América do Sul, incluindo a vasta cadeia montanhosa dos Andes e o deserto mais seco do mundo, no Chile.
Embora os venezuelanos estivessem admirados com as paisagens vistas pelas janelas, suas cabeças estavam na terra que deixaram para trás, e na incerteza nas terras para onde seguem.