Por Luciana Otoni e Aluísio Alves
BRASÍLIA/SÃO PAULO (Reuters) - O governo federal anunciou nesta quarta-feira uma enxurrada de medidas para tentar estimular o mercado de crédito, que vem perdendo fôlego num momento em que a atividade econômica se mostra cada vez mais fraca e há risco de o país entrar em recessão técnica neste ano eleitoral.
O Banco Central anunciou medidas que têm potencial de injetar 25 bilhões de reais na economia, enquanto o Ministério da Fazenda tomou medidas para facilitar a recuperação de créditos inadimplentes e impulsionar o financiamento imobiliário.
Entre as medidas está a criação de Letras Imobiliárias Garantidas (conhecidas como "covered bond"), que serão isentas de Imposto de Renda e servirão para melhorar o funding das instituições financeiras que trabalharem neste segmento.
Também foi anunciado que imóveis quitados poderão ser usados como garantia de operações de crédito de qualquer natureza. Segundo o secretário-executivo do Ministério da Fazenda, Paulo Caffarelli, essa ação pode gerar cerca de 16 bilhões de reais em novas operações.
Os bancos também não precisarão recorrer à Justiça para reaver créditos inadimplentes sem garantia até o limite de 100 mil reais e, com garantia, de até 50 mil reais, com o objetivo de fazer deduções tributárias.
O ministro da Fazenda, Guido Mantega, disse que com essas ações, os custos das instituições financeiras serão reduzidos e, assim, os juros e os spreads bancários --diferença entre o custo de captação do banco e a taxa efetivamente cobrada do consumidor final-- poderão recuar também.
"Mas isso vai depender das instituições, o mercado é livre... Estamos trabalhando para isso", afirmou o ministro a jornalistas, poucas horas após o Banco Central também divulgar outra lista de ações para melhorar o mercado de crédito.
O Banco Central elevará a partir da próxima segunda-feira de 50 para 60 por cento a parcela do recolhimento compulsório a prazo que pode ser cumprida com operações de crédito, o que abre espaço para liberar 10 bilhões de reais.
Também decidiu restabelecer em 75 por cento o Fator de Ponderação de Risco (FPR) para todas as operações de crédito de varejo, independentemente do prazo, liberando outros 15 bilhões de reais. Até então, o FPR variava conforme o segmento de crédito e a extensão do empréstimo.
"(As medidas) representam uma importante modernização do marco regulatório brasileiro", disse o presidente da Federação Brasileira de Bancos (Febraban), Murilo Portugal, em nota. Ele ressaltou que as medidas aumentam as garantias na concessão do crédito e reduzem os custos e a burocracia, especialmente no crédito imobiliário.
Somando ações semelhantes adotadas pelo BC no fim de julho, a autoridade monetária abriu espaço para que entrem 70 bilhões de reais no mercado de crédito, que vem perdendo fôlego nos últimos meses diante também da falta de confiança na retomada da economia.
O banco Santander Brasil avaliou que as medidas terão reflexos positivos sobre a atividade econômica, tanto pela liberação de mais recursos de depósitos compulsórios para operações de crédito quanto pelo foco no financiamento imobiliário e para compra de veículos.
O presidente-executivo do Bradesco, Luiz Carlos Trabuco, disse que as medidas do BC serão positivas para os bancos, mas que ainda há espaço para maior flexibilização dos requerimentos de capital.
O mercado brasileiro de crédito tem perdido ímpeto, diante da fraca atividade econômica e confiança cadente de empresários e consumidores. A expectativa é que a economia cresça menos de 1 por cento neste ano, e o fraco desempenho econômico tem servido de munição para a oposição contra a presidente Dilma Rousseff, que tenta a reeleição em outubro.
Para a agência de classificação de risco Fitch, as medidas do BC para incentivar empréstimos por bancos locais podem não ser suficientes para superar as preocupações de muitos bancos com a qualidade de crédito, diante da desaceleração macroeconômica do país. [E6N0Q603O]
O Índice de Atividade Econômica do Banco Central (IBC-Br), espécie de sinalizador do Produto Interno Bruto (PIB), recuou 0,18 por cento em maio ante abril, reforçando as expectativas de que a economia deve ter recuado no trimestre passado e entrado em recessão técnica.
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Mantega também anunciou mudanças no crédito consignado, com desconto em folha de pagamento. A partir de agora, dentro do segmento do trabalhador privado, o empregador fará a transferência direta dos pagamentos para o banco que originou a operação, mesmo que a empresa mude posteriormente a sua folha de pagamento para outra instituição financeira.
O governo também está facilitando a recuperação de bens financiados com alienação fiduciária, permitindo que o tomador do crédito autorize em contrato a recuperação do bem.
(Reportagem adicional de Patrícia Duarte)