Por Bernardo Caram e Ricardo Brito
BRASÍLIA (Reuters) - Após um início de ano sem avanços na agenda econômica no Congresso, o Ministério da Fazenda foi avisado que projetos microeconômicos defendidos pela pasta terão tratamento prioritário no Legislativo e devem avançar com celeridade, disseram três fontes que acompanham as negociações, em cenário ainda incerto para iniciativas fiscais e reformas estruturantes.
Em ano curto para os trabalhos legislativos, que devem perder força no segundo semestre com as eleições municipais, a Fazenda quer avançar com projetos menos polêmicos enquanto tenta superar o tema da reoneração de setores da economia. O encaminhamento da regulamentação da reforma tributária sobre o consumo deve ficar para abril, disseram as fontes, que vislumbram a reforma do Imposto de Renda votada apenas em 2025.
As atenções do governo e do Legislativo no início de 2024 foram consumidas pelo embate envolvendo a reoneração da folha salarial e as negociações para o comando de comissões temáticas das duas casas do Congresso, além de ruídos sobre possíveis interferências do governo na Petrobras (BVMF:PETR4) e na Vale (BVMF:VALE3).
“As medidas enviadas em janeiro (sobre reoneração), suas idas e vindas, complicaram um pouco a agenda de reformas estruturais... E ainda surgiu a confusão da Petrobras e da Vale”, disse uma autoridade do Ministério da Fazenda sob condição de anonimato. “Muitos temas ao mesmo tempo, todos para atrapalhar a agenda.”
As negociações, ainda não solucionadas, envolvem propostas para reonerar a folha salarial de 17 setores, limitar compensações tributárias feitas por empresas e ajustar benefícios ao setor de eventos e a municípios.
O governo chegou a propor uma medida provisória sobre esses temas, mas após pressão de parlamentares aceitou discuti-los em projetos de lei. Segundo duas fontes, a expectativa é que as medidas sejam flexibilizadas na tramitação no Congresso, o que pode dificultar o trabalho da equipe econômica para zerar o déficit fiscal neste ano.
APOSTA MICROECONÔMICA
Um sinal de que a pauta pode começar a destravar veio de reunião de líderes partidários da Câmara na terça-feira, quando foi fechado um acordo para acelerar a tramitação de oito projetos que estão no Legislativo e tratam de temas microeconômicos.
Entre as medidas estão o marco do setor de seguros, ajustes na lei de falências e regras para instituições financeiras em crise. Os textos também tratam de normas para a incidência de juros em processos judiciais, regras de proteção a acionistas minoritários de empresas e uma simplificação em execuções extrajudiciais.
Segundo as fontes, a ideia é agilizar a escolha de relatores para as matérias e aprovar requerimentos para que entrem em regime de urgência, o que permite o avanço de etapas na tramitação dos textos, que, para a Fazenda, podem impulsionar o crédito no país, reduzir custos financeiros e estimular a economia.
O passo seguinte, segundo os relatos, será avançar na reforma tributária sobre o consumo, aprovada pelo Congresso no ano passado e que depende de regulamentação. Os grupos técnicos que discutem as propostas devem concluir os trabalhos nesta semana e a expectativa é que os projetos de lei sejam apresentados em abril, após conclusão de análise jurídica dos textos.
A regulamentação tratará de temas espinhosos e cercados de pressões setoriais ao definir, por exemplo, a lista de alimentos que estarão na cesta básica e terão tributação zerada, bem como a especificação de produtos que terão desconto sobre a alíquota padrão do novo imposto.
Uma fonte ligada ao presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), disse estranhar o fato de o governo, até o momento, não tocar no assunto sendo que a regulamentação da reforma precisará passar pela Casa e pelo Senado. Após mais de duas décadas discutindo o tema, a promulgação da emenda constitucional da reforma tributária no final do ano passado foi tida como uma vitória histórica para o governo e para o Congresso.
Uma das fontes da Fazenda afirmou que a pasta ainda pretende enviar o projeto da reforma do Imposto de Renda ao Congresso neste ano “ao menos para iniciar uma discussão”, reconhecendo que a votação deve ficar para 2025. A outra fonte da pasta ressaltou que a ideia de votar o texto neste ano “subiu no telhado”.
A Reuters mostrou na última semana que o avanço da agenda econômica em 2024 vai depender ainda mais do ritmo a ser ditado pelo presidente da Câmara na avaliação de fontes do governo e do Congresso, após a eleição de uma deputada bolsonarista para o comando da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Casa e em meio a problemas na articulação política do governo.