Num dos 10 maiores negócios imobiliários fechados em São Paulo este ano, o fundo de investimento imobiliário Vinci Offices, gerido pela Vinci Partners, arrematou a sede da TV Globo em São Paulo por R$ 522 milhões. O negócio vai se dar por meio de um contrato atípico do tipo sale & leaseback (a Globo vendeu e vai continuar no imóvel como locatária) com prazo de 15 anos, a uma taxa de retorno estimada (cap rate) de 7,6% ao ano.
Inaugurado em 1999, o complexo, que inclui escritórios e estúdios da maior rede de televisão do país em São Paulo, tem 56 mil m² de área construída (dos quais 39 mil m² são considerados área bruta locável). O terreno de 43 mil m² fica na avenida das Nações Unidas (Marginal Pinheiros), com frente também para rua Jornalista Roberto Marinho e avenida Dr. Chucri Zaidan, um dos principais distritos de negócios da capital.
Em nota, a Globo disse que a venda da sede paulistana é parte da “revisão do seu modelo operacional, implementando medidas que visam apoiar a transformação da empresa em sua estratégia D2C” (direct-to-consumer, direto ao consumidor) e que a operação deixa a empresa “mais leve, ágil e flexível.”
Do ponto de vista estritamente imobiliário, segundo analistas ouvidos pela Bloomberg Línea nesta segunda-feira, o Vinci Offices pagou R$ 13,4 mil pelo metro quadrado – um negócio que aproveitou o momento de baixa do mercado imobiliário em São Paulo. Prédios corporativos na região da Chucri Zaidan – principal alternativa à superlotada Faria Lima – estão sendo negociados em uma faixa entre R$ 15 mil e R$ 20 mil/m².
Embora não sirva diretamente como termo de comparação direta por se tratar de um complexo de torres AAA na mesma região, o Rochaverá foi negociado por R$ 1,255 bilhão em fevereiro (R$ 22 mil/m²). A sede da Globo é um imóvel já reformado, com um inquilino com patrimônio de R$ 15 bilhões e com a classificação mais alta pelas agências de rating que operam no país (AAA, em escala nacional, segundo a Fitch).
Um estudo da SiiLa, uma empresa que monitora negócios imobiliários de alto padrão, indicava que no final do terceiro trimestre deste ano o preço médio pedido pelo m² na região da Chucri Zaidan estava em R$ 104. Entre o preço pedido e o negócio fechado, contudo, há uma certa distância: a Enel (MI:ENEI), um dos pesos-pesados do setor elétrico no país, saiu de Barueri para a região da Chucri Zaidan pagando R$ 70/m² de aluguel.
A estrutura do negócio
O aspecto financeiro da operação é o mais desafiador. O Vinci Offices é um fundo imobiliário com 97 mil cotistas e que fechou o mês passado valendo, no mercado, R$ 696 milhões. Com a aquisição da Globo, o ativo praticamente dobra de tamanho, mas a gestora vai precisar realizar nova emissão de cotas justamente num momento em que muitos investidores estão em um movimento de migrar dos ativos imobiliários para a renda fixa (por causa da alta da Selic).
O pagamento à Globo será através de recursos captados em uma nova emissão de cotas que deve representar 35% do valor total (R$ 182 milhões). O restante, R$ 340 milhões, será levantado através da estruturação de uma cédula de recebíveis imobiliários, utilizando os recebíveis do próprio contrato com a Globo, com uma remuneração de IPCA + 6% ou NTN-B (títulos do Tesouro indexados à inflação) + 1,5% – o que for maior quando da conclusão da securitização).
Em geral, alavancagens não são um problema quando atendem dois critérios: a) se o título de dívida tem período igual ou inferior ao do contrato atípico; 2) se o contrato de aluguel e o e o título de dívida são corrigidos pelo mesmo índice. Quando isso ocorre, a tendência é haver ganho no longo prazo porque o retorno do investimento (cap rate) tende a superar a correção da dívida.
Novas emissões, contudo, costumam ser vistas com desconfiança do atual cotista porque elas tendem a aumentar o risco porque diluem o ativo entre mais pessoas. Quando a nova emissão sai abaixo do valor patrimonial dos imóveis então, é um pesadelo para quem está comprado porque o mercado recalcula imediatamente o valor da cota para baixo.
Hoje, o valor patrimonial da cota do Vinci Offices é de R$ 58 enquanto o papel fechou em R$ 55,60 nesta segunda (no ano, atingiu o pico em janeiro, batendo R$ 63,79). A estratégia da gestora para não canibalizar os seus próprios cotistas com uma nova emissão foi contratar a Cushman & Wakefield para fazer uma reavaliação dos ativos já existentes e só depois disso lançar a emissão.
A oferta será destinada prioritariamente aos atuais cotistas do fundo e será ancorada pelo próprio vendedor, “reforçando assim o alinhamento de interesses”, segundo disse a gestora. A Vinci Partners fez um IPO na Nasdaq este ano e estima-se que ela tenha captado no exterior em torno de US$ 250 milhões.
A Vinci Partners foi procurada pela Bloomberg Línea, mas nenhum gestor da empresa quis comentar o negócio em virtude do período de silêncio determinado pela regulação em relação à futura emissão.
A íntegra da nota da Globo sobre o negócio: “Como tem falado de forma recorrente, a Globo está em pleno processo de revisão do seu modelo operacional, implementando medidas que visam apoiar a transformação da empresa em sua estratégia D2C. Neste sentido, a empresa vem buscando ampliar a sua eficiência através da captação de novas fontes de receita, da racionalização na gestão de custos e da ampliação da sinergia entre suas operações, gerando valor em tudo o que faz. A operação de sale & leaseback da sede da Globo em SP é parte da estratégia de tornar a empresa mais leve, ágil e flexível.”