Por Gustavo Bonato
SÃO PAULO (Reuters) - O Brasil deverá exportar menos milho que o esperado na atual temporada, em meio a uma quebra de safra no Centro-Oeste e à variações no câmbio e nos preços domésticos em patamares recordes, apontou uma pesquisa da Reuters.
A retração nos embarques do Brasil, o segundo maior exportador do cereal, potencialmente abre espaço no mercado global para países concorrentes, como os Estados Unidos e a Argentina.
As exportações de milho do Brasil deverão cair para 26,1 milhões de toneladas no ano comercial entre fevereiro de 2016 e janeiro de 2017, ante 28,9 milhões de toneladas estimadas em uma pesquisa semelhante publicada pela Reuters em novembro do ano passado. Em abril, a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) chegou a projetar embarques de 30,4 milhões de toneladas neste ano comercial.
No período entre fevereiro de 2015 e janeiro de 2016, o Brasil embarcou um recorde de 30,17 milhões de toneladas, ajudado por uma safra recorde e bons preços internacionais.
"O Brasil exportou demais e agora está tendo problemas com a oferta. Se o Brasil tiver problemas com disponibilidade em outubro, então o Japão (maior importador mundial de milho) irá mudar para Argentina ou Ucrânia", disse o presidente de uma trading japonesa Nobuyuki Chino, em Tóquio, acrescentando que o grão dos Estados Unidos também está mais competitivo que o brasileiro.
A pesquisa com sete consultorias também mostra como a quebra de safra da atual temporada, com a persistente seca em Estados como Goiás e Mato Grosso, torna difícil projetar os volumes que estarão disponíveis para a exportação.
No levantamento de novembro, a diferença entre a maior e a menor previsão era de 4,5 milhões de toneladas. Na atual pesquisa, a diferença é de mais de 14 milhões de toneladas.
"Existe muita incerteza ainda... Estamos em maio, tem bastante chão ainda", disse um operador sênior de milho de uma grande multinacional, para quem os embarques na temporada deverão ficar, inclusive, abaixo de 26 milhões de toneladas.
O clima adverso em Mato Grosso e Goiás levou todas as consultorias e agentes do mercado a reduzirem drasticamente suas previsões para a segunda safra de milho de 2015/16 (ano comercial 2016/17), que está em fase inicial de colheita. Muitos produtores terão até que renegociar suas entrega, porque não terão grãos suficientes para cumprir os contratos de venda antecipada.
A chamada "safrinha" é responsável por dois terços da produção anual do Brasil e é a grande responsável por abastecer os embarques de milho, que ocorrem no segundo semestre e têm colocado o Brasil em posição de destaque no cenário global.
A consultoria Agroconsult, por exemplo, projeta que os embarques no ano calendário 2016 deverão atingir 23 milhões de toneladas, ante 28,9 milhões de toneladas em 2015.
"Os estoques foram embora, exportamos esses estoques, e por isso que está todo mundo desesperado", disse o analista Marcos Rubin, da Agroconsult, avaliando a atual escassez de milho no mercado doméstico.
O cenário, inclusive, deve levar o Brasil a fechar maio com o segundo menor volume de exportações de milho da história.
COMPETIÇÃO
Com exportações recordes na temporada passada, sobrou pouco milho para as indústrias e granjas de aves e suínos do Brasil manterem suas operações antes da nova colheita. O setor reclama dos altos preços do cereal e, principalmente, da dificuldade em encontrar lotes disponíveis.
Essa forte necessidade das indústrias brasileiras para garantir suprimento deverá ser outro fator a pressionar as exportações.
"Os preços no interior estão acima das cotações nos portos, o que inviabiliza novos negócios, além de os portos estarem entupidos com soja... As exportações só voltarão a crescer se os preços no interior se ajustarem à paridade de exportação. Se isso não ocorrer, as exportações podem ficar abaixo dos volumes vistos no ano passado", destacou o consultor independente Carlos Cogo.
Os embarques que estão comprometidos foram realizados há alguns meses, quando o dólar chegou a ultrapassar 4 reais. No atual cenário de câmbio a 3,5 reais e altos preços do milho no mercado doméstico, o Brasil perde competitividade no mercado internacional.
O milho no mercado à vista atingiu o recorde nominal de 52,91 reais por saca (60 kg) na sexta-feira, conforme o indicador Cepea/Esalq. Convertido ao câmbio atual, o milho brasileiro é precificado, no porto, a cerca de 250 dólares por tonelada.
Segundo o analista Aedson Pereira, da Informa Economics FNP, os principais competidores do Brasil têm ofertado o grão muito mais barato. A tonelada está em 165-170 dólares na Argentina e 175-180 dólares nos Estados Unidos.
"O foco das tradings é cumprir os contratos que fixou lá atrás. Elas não têm condições de comprar milho para oferecer à exportação num mercado como esse", disse ele.
Na avaliação da Informa, as exportações entre fevereiro de 2016 e janeiro de 2017 deverão alcançar 27 milhões de toneladas, ante um potencial calculado inicialmente para embarques de até 32 milhões de toneladas.
"Olhando para o futuro, a oferta do Brasil está ficando apertada, e compradores do Sudeste Asiático que realmente preferem o milho do Brasil, terão que voltar-se para o milho dos Estados Unidos", disse um operador de Cingapura.
(Reportagem adicional de Naveen Thukral, em Cingapura)