Por Lisandra Paraguassu e Maria Carolina Marcello
BRASÍLIA (Reuters) - Primeira mulher eleita presidente do país, Dilma Rousseff teve o mandato cassado nesta quarta-feira, condenada pelo Senado por crime de responsabilidade, em um processo de impeachment que se arrastou por nove meses e colocou fim a um período de 13 anos do PT no comando do país.
Por 61 votos contra 20, os senadores condenaram Dilma no segundo processo de impeachment no país em 24 anos. Em uma votação em separado, no entanto, seus direitos políticos foram mantidos. A decisão inédita deverá ser contestada no Supremo Tribunal Federal e causou estranhamento na base parlamentar do agora presidente Michel Temer.
Foram seis dias de sessões marcadas por discussões duras, mas o resultado anunciado pelo Palácio do Planalto há vários dias se confirmou: Dilma Rousseff, afastada desde maio do cargo, teve apenas 20 votos a seu favor. No último minuto, até mesmo o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), que defendia sua "neutralidade", votou contra Dilma.
A agora presidente cassada, declarou pouco depois de o resultado ser proclamado que o Senado tomara uma decisão que entrará para a "história das grandes injustiças".
"É o segundo golpe de Estado que enfrento na vida... uma inequívoca eleição indireta, em que 61 senadores substituem a vontade expressa por 54,5 milhões de votos. É uma fraude, contra a qual ainda vamos recorrer em todas as instâncias possíveis", disse em discurso no Palácio da Alvorada, acompanhada do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e de aliados políticos e apoiadores.
No Senado, assim que o resultado foi mostrado no telão do plenário, senadores da atual base governista começaram a cantar o Hino Nacional, ajudado por convidados que ocupavam a galeria.
Ao mesmo tempo, apoiadores de Dilma levantavam pequenos cartazes com os dizeres "É Golpe!" e "É Fraude!". Quando a sessão foi encerrada, já finalizadas as duas votações, uma senadora gritou "golpistas" e "a história não perdoará vocês".
A decisão de manter Dilma habilitada para o exercício de cargos públicos, mesmo com o impeachment foi encarada como um consolo para a petista, mas além de gerar desconforto na base de Temer, promete se transformar em uma batalha jurídica.
Em discursos emocionados, os senadores Kátia Abreu (PMDB-TO), João Capiberibe (PSB-AP) e Jorge Viana (PT-AC) alegaram que a manutenção dos direitos políticos de Dilma seria um gesto de conciliação.
"Não estamos em Ouro Preto, enforcando alguém para depois esquartejar para ter certeza que foi morto. Vamos ter divergências para sempre, mas nesse momento é um apelo que faço. Vamos ter que seguir convivendo. Vamos fazer isso pela democracia", disse Viana, ao encaminhar voto favorável a Dilma.
O próprio Renan, depois de votar pelo impeachment, defendeu a manutenção dos direitos políticos de Dilma e declarou que votaria a favor. Apesar da pressão de DEM e PSDB, a base governista não conseguiu chegar aos dois terços necessários -a votação ficou em 42 a 36.
DESCONFORTO COM "ACORDÃO"
O resultado dessa segunda votação incomodou parlamentares do DEM e PSDB que cobraram compromisso do PMDB com o governo Temer, após peemedebistas votarem pela manutenção dos direitos de Dilma.
"Temos que poder transmitir a toda sociedade o que aconteceu aqui hoje. Vamos recorrer ao STF. A presidente foi cassada mas a Constituição foi modificada com um destaque", disse o senador Ronaldo Caiado (GO).
O presidente em exercício do PMDB, senador Romero Jucá (RR) negou a existência de um acordo e empurrou a responsabilidade ao STF.
"Vai ter que julgar lá (no STF). As penas são concomitantes, mas pelo jeito ficaram com pena e acharam um jeito de aliviar", disse o Jucá. "Deram um jeitinho para criar um fato e ir para no Supremo. Está se criando uma jaboticaba."
O líder tucano no Senado, Cássio Cunha Lima (PB), disse que "essa votação terá não só desdobramentos na cassação de (deputado suspenso) Eduardo Cunha (PMDB-RJ) como poderá ter repercussões nas relações(do partido) com o governo".
Sete peemedebistas votaram pela manutenção dos direitos políticos da ex-presidente. Além de Eunício, Valdir Raupp (PMDB-RO) também se absteve.
A sessão que finalmente definiu o destino de Dilma Rousseff durou menos de três horas. Eram 13h34 quando o resultado foi anunciado no painel. Abalados, apesar de admitirem o resultado desde a madrugada, senadores petistas passaram a discutir se assinariam ou não a ata da sessão. Mais exaltado, Lindbergh Farias defendeu que a assinatura legitimaria o "golpe", enquanto outros senadores queriam assinar para mostrar que participaram da sessão. No final, a decisão será pessoal.
Com a saída definitiva de Dilma, Temer tomou posse da Presidência no mesmo plenário em que horas antes a petista foi cassada. Sem discursar, o presidente embarca para a China ainda nesta quarta-feira.
Temer gravou um pronunciamento à nação logo depois da aprovação do impeachment, programado para ir ao ar na noite desta quarta-feira.
(Reportagem adicional de Marcela Ayres)