O mercado financeiro se deu conta de que a trégua passageira firmada entre Estados Unidos e China mais prolonga as incertezas em relação à guerra comercial do que elimina um dos focos de tensão atual nos negócios globais. Com isso, teve fôlego curto o rali dos ativos de risco ontem - no Brasil, o dólar seguiu acima da faixa de R$ 3,80. E hoje os investidores também devem reduzir o apetite, diante da inesperada pausa em Wall Street amanhã.
A morte do “Bush pai” na noite da última sexta-feira, aos 94 anos, interrompe o pregão nas bolsas de Nova York nesta quarta-feira, em respeito ao Dia Nacional do Luto, que homenageia o presidente norte-americano que selou o fim da Guerra Fria e saiu vencedor na Guerra do Golfo. O depoimento do presidente do Federal Reserve, Jerome Powell, ao Congresso, previsto para amanhã, também foi cancelado e ainda não há nova data.
Já nesta terça-feira a agenda econômica no exterior está esvaziada, trazendo apenas as vendas de veículos pelas fabricantes norte-americanas em novembro. Na Europa, sai o índice de preços ao produtor (PPI) em outubro, pela manhã. No fim do dia, na Ásia, saem dados sobre a atividade no setor de serviços na China e no Japão.
Com isso, os investidores aproveitam para avaliar se a reação positiva do mercado financeiro ao cessar-fogo entre as duas maiores economias do mundo não foi exagerada ou se ainda há uma “janela de oportunidade” para engatar um rali de fim de ano, considerando-se também o tom mais suave (“dovish”) do Federal Reserve em relação à alta de juros. A questão é que para ir além, os ativos precisam de um gatilho mais potente.
Por ora, parece que a festa acabou. As bolsas asiáticas tiveram uma pausa, com oscilações laterais em Hong Kong (-0,2%) e em Xangai (+0,4%), ao passo que Tóquio teve queda firme de mais de 2%, em meio ao fortalecimento do iene. A moeda norte-americana perde terreno para as demais moedas rivais, como o euro e a libra, diante da suspensão de novas tarifas nos próximos 90 dias, abrindo espaço para uma valorização do petróleo.
Em Nova York, os índices futuros das bolsas amanheceram no vermelho, em meio à reversão na curva de rendimento (yield) dos títulos norte-americanos pela primeira vez desde 2007. O movimento reforça a impressão de que o Fed está se aproximando do fim do ciclo atual de aperto monetário. Com isso, o yield do bônus de três anos está acima do de cinco anos, enquanto a diferença entre o yield do papel de dois e o de 10 anos é de cerca de 15 pontos.
O problema é que inversões na curva de rendimento dos títulos norte-americanos também tendo sido um indicador confiável de recessões passadas, o que lança uma sombra sobre a perspectiva para a economia dos EUA em 2019. Assim, o que a curva de rendimento está dizendo, cada vez mais, é que há uma desaceleração econômica iminente à frente. Nesta manhã, o rendimento da T-note seguia abaixo de 3%.
No Brasil, o mercado financeiro continua dando o benefício da dúvida ao próximo governo, avaliando que ele segue em uma curva de aprendizado, mas apontando para a direção correta. Hoje, o presidente eleito Jair Bolsonaro inicia uma série de encontros com partidos, de modo ampliar a base de apoio e garantir articulação política para o avanço da agenda de reformas no Congresso.
Aliás, a disputa pela presidência da Câmara e do Senado continua com Rodrigo Maia e Renan Calheiros como peças-centrais., o que pode complicar o modelo de governabilidade pretendido por Bolsonaro. O próprio Renan teria aconselhado o futuro ministro da Economia, Paulo Guedes, a dialogar com senadores para obter apoio às propostas de Estado enxuto e privatizações - tida como pilares da Escola de Chicago.
Já a reforma da Previdência a ser encaminhada pela equipe econômica logo no início do mandato do futuro presidente não deve gerar “grandes tumultos”, em meio à ausência de rupturas com o atual sistema vigente. Resta saber se a proposta de novas regras para a aposentadoria será suficiente para ajustar o lado fiscal e, principalmente, se irá agradar às agências de classificação de risco na sinalização para equilibrar o rombo das contas públicas.
O governo ainda espera um reforço no caixa vindo do megaleilão de áreas do pré-sal, que pode render até R$ 100 bilhões. A expectativa ainda é pela votação do projeto de lei no Senado neste ano, mas a equipe de transição de governo já admite que uma solução pode ficar para 2019. O principal impasse é sobre as regras de repartição dos recursos.
Entre os indicadores econômicos, o destaque do dia fica com a produção industrial brasileira (9h), que deve interromper três meses seguidos de queda e crescer 1,00% em outubro em relação a setembro. Na comparação com um ano antes, a indústria nacional deve avançar 2,00%, voltando a subir, após interromper três altas consecutivas no resultado anterior.