Por Gram Slattery
RIO DE JANEIRO (Reuters) - No feriado de 1º de maio deste ano, uma sexta-feira, dois trabalhadores da plataforma "offshore" PXA-1, que pertence à Petrobras (SA:PETR4), foram à enfermaria da instalação queixando-se de dores de cabeça e febre.
Um dia depois, mais um funcionário da Petrobras ficou visivelmente doente, conforme disseram três trabalhadores da plataforma à Reuters.
A doença se espalhou ainda mais nos dias seguintes, gerando apreensão entre os 45 trabalhadores embarcados --mais tarde, todos eles, com exceção de um, testariam positivo para o novo coronavírus, segundo o Sindicato dos Petroleiros do Ceará e Piauí (Sindipetro CE/PI).
Embora todos tenham se recuperado desde então, os três funcionários, que falaram em condição de anonimato por não estarem autorizados a se comunicar com a imprensa, afirmaram estar profundamente chateados, pois acreditam que a Petrobras falhou em tomar medidas (agora padronizadas) para evitar a disseminação do vírus, como a testagem de trabalhadores antes do embarque ou o fornecimento de máscaras de alta qualidade.
Os três funcionários e o diretor de Saúde do Sindipetro CE/PI, Paolo Valterson, questionaram por que os trabalhadores só foram levados para Fortaleza, cidade próxima à plataforma, quatro dias depois dos primeiros funcionários apresentarem sintomas. Eles foram colocados em quarentena por 15 dias em um hotel na capital cearense, de acordo com Valterson.
Nos últimos meses, pelo que apurou a Reuters, o coronavírus afetou a produção de petróleo e expôs a Petrobras, que emprega mais de 45 mil pessoas e é a maior empresa da América Latina em diversas métricas, a possíveis problemas judiciais.
Até meados de junho, procuradores federais já haviam iniciado 25 investigações sobre a conduta da companhia em instalações marítimas no que diz respeito ao coronavírus, segundo dados obtidos por meio da Lei de Acesso à Informação.
Em comunicado, o Ministério Público local disse que abriu uma investigação sobre o incidente na plataforma PXA-1.
Em resposta a perguntas enviadas pela Reuters sobre o surto e as investigações, a Petrobras disse que está em contato com autoridades para demonstrar que suas medidas de saúde e segurança estão "entre as mais rígidas adotadas pela indústria do petróleo".
A companhia confirmou a ocorrência de um surto de coronavírus na plataforma PXA-1, mas não revelou o número de trabalhadores infectados.
A Petrobras afirmou à Reuters que toda a equipe foi desembarcada da plataforma, sem especificar a data em que isso ocorreu. A empresa acrescentou ter realizado mais de 70 mil testes entre funcionários e terceirizados em todo o país.
Isso, porém, não impediu que o vírus avançasse por cerca de 155 plataformas "offshore" no Brasil, segundo análises de dados públicos e confidenciais e entrevistas com médicos, trabalhadores, executivos e autoridades do governo.
Até 10 de julho, o Brasil havia registrado 1.427 casos de coronavírus entre funcionários de plataformas de petróleo, de acordo com a Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP). O número indica que cerca de 3% dos trabalhadores do setor contraíram o vírus, incidência cerca de seis vezes maior que a registrada no Brasil, país com maior número de casos da doença na América Latina.
Em um desenvolvimento não noticiado anteriormente, duas grandes plataformas pertencentes à japonesa Modec que produzem petróleo para a Petrobras -- a Cidade de Mangaritiba e a Cidade de Angra dos Reis -- deixaram de operar em maio devido a surtos de Covid-19, disse a ANP à Reuters.
Dados da agência reguladora mostram que a produção das duas plataformas em maio recuou em cerca de 125 mil barris por dia ante os níveis de fevereiro, uma diferença equivalente a 4,5% da produção total do Brasil.
A Petrobras se recusou a comentar o incidente.
A Modec confirmou a interrupção das operações, afirmando que a medida foi elaborada para proteger os trabalhadores. A empresa de serviços em petróleo disse que controla de forma rigorosa o acesso às instalações "offshore" e testa todos os trabalhadores para a doença antes do embarque.
Ao menos seis operadoras de campos de petróleo no Brasil registraram casos de coronavírus entre funcionários e terceirizados, segundo três pessoas com conhecimento do assunto, que pediram anonimato para falar à imprensa.