Por Eduardo Simões
SÃO PAULO (Reuters) - A equipe econômica da presidente Dilma Rousseff e seu articulador político, o vice-presidente Michel Temer (PMDB), vieram a público nesta quarta-feira para enfatizar a gravidade da situação econômica e fiscal do país e fazer um apelo ao Congresso Nacional para que não a agrave.
A movimentação veio um dia após o Congresso retomar as atividades e sinalizar que não dará trégua ao governo, que está tentando implementar uma agenda de ajuste fiscal, em meio a um cenário de retração da atividade econômica, aumento do desemprego e forte perda de popularidade.
"Não vamos ignorar que a situação é razoavelmente grave, não tenho dúvida que é grave. E é grave porque há uma crise política se ensaiando, há uma crise econômica precisando ser ajustada", disse Temer a jornalistas, após um dia de reuniões com ministros e parlamentares da base aliada.
"Mas para tanto é preciso contar com o Congresso Nacional... Há uma certa preocupação, não posso negar isso. Daí a razão dessa espécie de convocação, no sentido de que todos trabalhemos juntos", acrescentou.
Além da necessidade de apoio do Congresso para aprovar as medidas do ajuste, o governo da presidente Dilma precisa contar com a boa vontade dos parlamentares para não aprovar matérias que impliquem elevação dos gastos como, por exemplo, a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 443 que eleva a remuneração de servidores da advocacia-geral.
"É preciso que alguém tenha capacidade de reunificar a todos, de reunir a todos, de fazer esse apelo e eu estou tomando essa liberdade de fazer esse pedido, porque caso contrário nós podemos entrar numa crise desagradável para o país", disse Temer.
Apesar apelo, o deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), presidente da Câmara, onde se concentram as maiores dores de cabeça para o Planalto, disse nesta quarta-feira que a tendência é o governo continuar sofrendo novas derrotas na Casa.
Cunha rompeu com o governo no mês passado, após ser citado por um delator da operação Lava Jato. Ele nega a acusação de ter pedido 5 milhões de dólares em propina ao empresário Julio Camargo e acusa o governo de fazer uma manobra com o Ministério Público para constrangê-lo.
Na terça-feira, logo na volta dos trabalhos do Congresso após o recesso, a base aliada não teve força para aprovar requerimento para adiar a votação da PEC 443 que, se aprovada, elevará os gastos públicos em 9,9 bilhões de reais, segundo cálculos do Ministério do Planejamento.
"Não é adequado propor reajustes dessa magnitude no momento em que várias empresas e trabalhadores enfrentam dificuldade, especialmente no setor privado, com redução do salário real e queda na geração de empregos", disse o Ministério do Planejamento em nota divulgada nesta quarta-feira.
O ministro da Fazenda, Joaquim Levy, também veio a público enfatizar que a situação econômica do país é "séria" e a fiscal é "muito séria". Levy disse que o governo assumiu o custo da popularidade ao tomar as medidas que considera necessárias para fortalecer a economia, e que é preciso continuar com o diálogo.
Entre as principais preocupações do Executivo está a possibilidade de o Brasil perder o grau de investimento dado pelas agências de classificação de risco, o que aprofundaria ainda mais a debilidade da economia, que deve enfrentar neste ano a pior recessão em 25 anos.
CMARA
O risco de perda do rótulo de bom pagador vinha, inclusive, sendo usada por Temer para sensibilizar os parlamentares a evitarem a aprovação das chamadas "pautas-bomba".
Em encontro na segunda-feira, ficou acertado entre Temer e lideranças da base que essas matérias não prosperariam no Legislativo, segundo duas fontes ligadas ao articulador político de Dilma. Um dia depois, no entanto, o acerto naufragou na Câmara com o avanço da PEC 443.
"O pessoal fala um negócio na reunião e depois vai na Câmara e implode o que foi acordado", disse uma das fontes próximas a Temer à Reuters, sob condição de anonimato.
A articulação política do governo avalia que o principal problema do Planalto reside na Câmara e, após também se reunirem com Temer nesta quarta, senadores da base aliada disseram que a funcionarão como "amortecedor" para as pautas-bomba que chegarem da Câmara.
Além do apoio da base no Senado, o governo aposta, segundo uma fonte próxima ao núcleo do Executivo, em aproveitar uma proposta de enxugamento de ministérios a ser encaminhada pelo Ministério do Planejamento para abrir nova negociação de participação dos partidos da base.
O foco principal será em uma nova divisão de poder com o PMDB visando apoio e empenho do partido na aprovação dos projetos que reforçam o ajuste fiscal no Congresso.
"O enxugamento dos ministérios vai levar a uma redução do espaço de todo mundo e isso vai exigir a negociação de participação dos partidos da base no governo com base em um novo apoio. A presidente vai avaliar tudo isso e fará uma reforma com calma e não ao calor das tensões do momento", disse a fonte.
(Reportagem adicional de Maria Carolina Marcello e Luciana Otoni, em Brasília)