Por Andrew Downie
RIO DE JANEIRO (Reuters) - Há tempos o Brasil é visto como um país capaz de dar grandes festas, desde que os convidados não se incomodem de chegar a uma casa que ainda está sendo arrumada.
A 100 dias da abertura da Olimpíada do Rio de Janeiro, uma nação conhecida por fazer as coisas na última hora se depara com uma situação nova: a organização não é o problema, e sim a grave crise política e uma certa apatia com relação aos Jogos de agosto.
"As pessoas não estão prestando atenção. Zero", disse Julia Michaels, moradora de longa data do Rio que fala sobre a cidade em seu blog Rio Real. "Ninguém está falando nada sobre isso porque há muitos outros assuntos sobre os quais falar."
Desta vez há poucos temores de que os locais de competição não estejam prontos. O problema é que a presidente Dilma Rousseff está lutando contra um impeachment, a economia está passando por sua pior recessão em décadas e os brasileiros estão ao mesmo tempo revoltados e focados em questões distantes da Olimpíada.
Quando o Rio de Janeiro conquistou o direito de sediar os Jogos em 2009, o Brasil era um dos queridinhos do mundo em desenvolvimento. A economia cresceu em um ritmo consistente durante a maior parte daquela década, 30 milhões de pessoas haviam saído da pobreza e o país assumia um papel maior na arena internacional.
Mas desde então a economia desmoronou e a presidente está prestes a ser afastada do cargo.
Estas questões estão dominando o país, e a Olimpíada praticamente desapareceu das manchetes dos jornais e dos noticiários da televisão. Em uma nação na qual o futebol é um dos assuntos prediletos, a política é o único jogo que tem rendido assunto.
"O Brasil está atravessando uma crise política, e a situação ainda tem que se definir", disse à Reuters a jogadora de vôlei de praia Agatha. "É natural que as pessoas estejam se concentrando nisso, mas não acho que os brasileiros se esqueceram da Olimpíada. Acho que só precisamos resolver a questão política e depois as atenções das pessoas irão se voltar ao esporte."
INSTALAÇÕES PRONTAS
Felizmente para os organizadores, as instalações estão quase todas prontas. Só o velódromo, que não será finalizado a tempo para um evento-teste, e o Estádio Olímpico, onde a pista de corrida ainda está sendo assentada, não estão 100 por cento concluídos. As autoridades afirmam que ambos estarão à disposição bem antes da abertura dos Jogos, que começam no dia 5 de agosto, a 100 dias a partir de quarta-feira.
Cerca de 35 eventos-teste já foram realizados em arenas e estádios, assim como nas praias e montanhas.
Mas a recessão levou a cortes de última hora. Os organizadores voltaram atrás nos planos de instalar assentos temporários em alguns locais de competição, reduziram o número de voluntários e até cogitaram descartar os planos de disponibilizar quartos com ar condicionado para os atletas, o que foi descartado.
O Comitê Olímpico Internacional (COI) visitou a cidade neste mês e se declarou satisfeito com os progressos, embora com a ressalva de que há "milhares" de detalhes ainda por finalizar.
DESAFIOS
A outra grande questão é a cidade em si mesma.
As promessas de limpeza da Baía de Guanabara, onde vão acontecer as provas de vela, não foram cumpridas, e embora as autoridades digam que as raias estarão em condições o compromisso de apresentar águas despoluídas não será mantido.
Também há dúvidas sobre o término da nova linha de metrô que vai até a Barra da Tijuca, local do Parque Olímpico – a linha ainda tem que ser finalizada e será inaugurada sem muitos testes, e provavelmente atenderá a um público reduzido durante a Olimpíada.
A violência continua sendo uma grande preocupação. Foram assassinadas no Rio 432 pessoas nos três primeiros meses do ano, segundo estatísticas do governo.
Relatos como este podem ser em parte responsáveis pela venda lenta de ingressos –só 62 por cento foram vendidos até o momento, de acordo com o comitê organizador Rio 2016, que espera que mais perto dos Jogos o país irá mostrar seu apoio ao evento.