(Corrige no 9º parágrafo para "inflação acima de 100% no acumulado em 12 meses", em lugar de "inflação acima de 100% ao mês")
Por Lisandra Paraguassu e Bernardo Caram
BRASÍLIA (Reuters) - Em meio à deterioração da economia argentina, o presidente do país, Alberto Fernández, chegou a Brasília nesta terça-feira para tentar fechar o acordo que permita ao país ter crédito para comprar de empresas brasileiras, com a desvalorização do peso no centro da questão.
O modelo, em que o Brasil financia as empresas e recebe garantias da Argentina com liquidez internacional para evitar prejuízos, já está desenhado. É o acertado em janeiro, antes da viagem do presidente Luiz Inácio Lula da Silva a Buenos Aires.
O que precisa ser detalhado, segundo uma fonte, e o que Fernández veio discutir, é a conversibilidade do peso com o real nessas operações, já que a Argentina hoje tem pouquíssimos acesso a dólares para pagar suas negociações.
Em entrevista a jornalistas nesta terça-feira, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, afirmou que equipes técnicas trabalharam no fim de semana para apresentar uma proposta a Lula de um mecanismo de crédito.
“O que queremos é não perder espaço de exportação para a Argentina. São mais de 200 empresas brasileiras que não só não estão exportando, como muitas não estão recebendo, estão com valor retido na Argentina em virtude da falta de divisas”, disse Haddad.
O país é vizinho é o terceiro parceiro comercial do Brasil, atrás da China e dos EUA.
De acordo com analistas privados consultados pela Reuters na Argentina, no início de março a Argentina tinha apenas 4,4 bilhões de dólares, o que praticamente impede o pagamento de importações na moeda americana.
A intenção dos dois países é que os pagamentos sejam feitos em reais e pesos. No entanto, o derretimento da moeda argentina - e as várias cotações usadas pelo governo, que opera com uma cotação oficial geral e várias cotações para diferentes situações, todas inferiores ao dólar blue, usado pela população - dificulta a implementação da proposta.
Em um cenário de inflação acima de 100% no acumulado em 12 meses, a Argentina viu o peso afundar em 2023. No intervalo de um mês, o dólar blue subiu cerca de 21% ante o peso, considerando os preços desta terça-feira. No acumulado do ano, o dólar blue subiu 37%.
"É isso que eles (os argentinos) vem fazer aqui, discutir essa conversibilidade", disse uma fonte diplomática.
Uma das intenções do acordo brasileiro e argentino era de dar um prazo mais longo para que os empresários argentinos pudessem pagar suas importações. Um dos diagnósticos era de que, por ter que oferecer prazos de até 30 dias pelos problemas de garantia, o Brasil perdia diversas exportações para os chineses, capazes de oferecer prazos mais longos.
No entanto, as dificuldades com a desvalorização do peso aumentam a possibilidade de perdas cambiais para o Brasil. O Ministério da Fazenda trabalha em um modelo para minimizar esses riscos.
O modelo desenhado até o momento prevê a abertura de crédito de bancos brasileiros para importadores argentinos e o uso do fundo garantidor de exportações (FGE) pelo governo brasileiro para garantir o pagamento dos empréstimos. Uma ideia é reativar as linhas de crédito ao exterior do BNDES.
Nessa operação, segundo explicou à época uma fonte da equipe econômica, o banco paga diretamente o exportador brasileiro, com garantia do Tesouro nacional, enquanto o Brasil recebe da Argentina o mesmo valor, depositado em Nova York, de títulos com liquidez internacional.
As garantias colaterais poderiam ser, por exemplo, títulos chineses, contratos de compra de gás, de trigo. Garantias com liquidez internacional que permitam ao Brasil, no caso de não pagamento pelo importador argentino, acessá-los para compensar.
Na conversa com os jornalistas nesta terça, Haddad disse que a oferta de garantias pela Argentina segue em discussão. “A forma de dar essa garantia é que está sendo estudada."
(Reportagem adicional de Fabrício de Castro.)