Por José de Castro
SÃO PAULO (Reuters) - O dólar saltou 1,93% nesta terça-feira, na maior alta diária em três semanas e voltando a superar uma resistência técnica, o que deixou o real entre os piores desempenhos globais ao fim de uma sessão brutal para divisas de risco e correlacionadas às commodities, por temores sobre juros mais altos e riscos de recessão e geopolíticos.
O dólar à vista fechou em 5,2771 reais, um pulo de 10 centavos de real ante o encerramento anterior. A cotação variou no pregão de 5,1861 reais (+0,17%) a 5,2813 reais (+2,01%).
A valorização no fim do dia é a mais forte desde 11 de julho (+1,94%), e o patamar de encerramento é o mais alto desde 26 de julho (5,3518 reais).
A moeda, assim, voltou a fechar acima de sua média móvel linear de 200 dias, movimento que, se sustentado, pode anteceder novas valorizações.
O dólar ampliou acentuadamente os ganhos no Brasil e no mundo na parte da tarde, em sintonia com a forte abertura das taxas dos títulos do Tesouro dos Estados Unidos, após declarações de autoridades do banco central norte-americano indicarem prontidão do Fed para subir os custos dos empréstimos o quanto for necessário para minar a inflação.
Juros mais altos nos EUA aumentam a atratividade da renda fixa norte-americana, estimulando conversão de moedas estrangeiras para o dólar, o que o valoriza.
O índice do dólar contra uma cesta de rivais acelerou os ganhos para 0,9% no fim da tarde.
Moedas de commodities, como os dólares australiano, neozelandês e os vizinhos latino-americanos peso mexicano, peso chileno, peso colombiano e sol peruano, foram as mais golpeadas.
Os mercados de forma geral repercutiram ainda as tensões envolvendo China e EUA, com a presidente da Câmara dos Deputados norte-americana, Nancy Pelosi, em visita à Taiwan, ilha autogovernada e reivindicada por Pequim, que fez alertas a Washington.
A China é o principal comprador de insumos vendidos por vários dos países da América Latina, por exemplo, e qualquer noticiário mais cauteloso sobre a segunda maior economia do mundo pode chacoalhar ativos da região.
O real não fugiu à regra e voltou a sentir com mais força a aversão a risco, em parte por seu "beta" (uma medida de sensibilidade) mais alto.
Analistas dizem que a moeda brasileira está se aproximando de um período mais delicado e pode enfrentar dificuldades para uma apreciação mais consistente.
"Os ruídos das eleições, junto com o cenário global pouco favorável para commodities e com o dólar se fortalecendo contra as demais moedas do G3 (euro, libra e iene), devem dificultar a valorização do real", disseram gestores do fundo Neo Multimercado em material compilado pelo banco digital modalmais.
"Além disso, entramos no período sazonal de mais saídas líquidas. O diferencial de juros tem evitado uma desvalorização maior que a dos pares (peso chileno, peso colombiano, rand sul-africano), mas provavelmente não levará a um carregamento ajustado pela volatilidade alto o bastante para atrair novos fluxos", completaram.
Para o braço de gestão de recursos do BNP Paribas (EPA:BNPP), as recentes medidas do governo brasileiro enfraquecem o quadro fiscal e acabam por ampliar a magnitude do movimento de aversão a risco observado no exterior. A gestora carrega posição vendida em real --ou seja, que ganha com a desvalorização da moeda brasileira.