Agus Morales.
Islamabad, 1 dez (EFE).- Os ataques de aviões espiões dos Estados Unidos nas áreas tribais do Paquistão se transformaram em uma peça central na estratégia americana para eliminar terroristas, mas a aura secreta do programa torna difícil checar a identidade dos mortos.
Entre 2004 e 2007, na gestão de George W. Bush, foram registrados nove ataques deste tipo, contra 34 em 2008, 53 em 2009 e 106 este ano, o que demonstra a confiança de seu sucessor, Barack Obama, nesta 'guerra virtual' para domesticar a indomável fronteira afegã-paquistanesa.
Segundo uma base de dados da organização "New American Foundation", elaborada a partir de notícias divulgadas pela imprensa, em 72 destes casos os veículos de comunicação não puderam determinar qual havia sido o alvo atingido, enquanto em outras ocasiões foi constatado que eram insurgentes talibãs ou membros da Al Qaeda.
Entre 972 e 1.436 pessoas morreram desde 2004 neste 'conflito à distância', sendo aproximadamente a metade deles apenas em 2010, segundo as estimativas deste banco de dados.
Entre eles há alguns líderes, como o chefe dos talibãs paquistaneses, Hakimulá Mehsud, oficialmente morto no início deste ano.
Em 2010, a grande maioria dos ataques de aviões não tripulados se registrou na região tribal do Waziristão do Norte, onde há a busca por abrigos de facções talibãs, tanto paquistanesas como afegãs, e por células da Al Qaeda. A zona, porém, está vedada à imprensa e as autoridades praticamente não têm acesso a ela.
"Às vezes, os talibãs são atacados, mas a maioria dos mortos são civis", sustentou em entrevista concedida à Agência Efe Karim Khan, aldeão do Waziristão do Norte.
Khan, que diz trabalhar como jornalista, se deslocou a Islamabad para pedir à CIA e ao Governo americano uma indenização de US$ 500 milhões pela morte de um filho e um irmão em um destes ataques, registrado em 31 de dezembro de 2009.
Na nota enviada às autoridades norte-americanas, Khan ameaça ir aos tribunais se suas reivindicações não forem acolhidas.
Os mísseis do avião espião destruíram a sala de convidados de sua casa, na aldeia de Machi Khel, e mataram seus dois familiares e um pedreiro que estava hospedado nela, segundo seu relato.
Alguns veículos de imprensa asseguraram que um líder talibã, identificado como Haji Omar, morreu em um ataque registrado na aldeia no mesmo dia, algo que ele nega de forma veemente.
"Não havia talibãs nem membros da Al Qaeda" na casa, disse Khan, que suspeita que alguém da região lançou em sua casa um chip eletrônico que serve à CIA para identificar alvos.
"Os aviões espiões sobrevoam o Waziristão durante as 24 horas do dia", explicou.
Seu advogado, Shahzad Akbar, ressaltou à Efe que "esta é a primeira vez que alguém questiona a legalidade" deste tipo de ações, argumentou que as leis internacionais não punem os EUA por efetuá-las e centrou na CIA, e não nas autoridades paquistanesas, as eventuais responsabilidades legais.
O advogado constatou que a maioria dos habitantes destas regiões tribais, predominantemente pashtuns e alheios às instituições desde a independência do Paquistão, não conhece seus direitos.
"Meu cliente me disse que não fazia parte do Paquistão. Eu lhe disse que sim", explicou.
Consultada pela Efe, uma fonte de segurança assegurou que estes ataques "se baseiam em inteligência operacional no terreno, são muito precisos" e foram sendo aperfeiçoados com o tempo.
A fonte lembrou que "há um acordo com os paquistaneses" para efetuá-los e indicou que o sentimento popular contra os ataques não é tão forte como se poderia imaginar porque são contra insurgentes.
Mas saber com toda certeza se há "efeitos colaterais" é uma tarefa difícil, já que são zonas controladas pelos talibãs, que retiram os cadáveres e não permitem a intervenção alheia, reforçou.
EUA e Paquistão não admitem publicamente os ataques dos "drones", algo que dificulta ainda mais o trabalho de apuração deste fenômeno que se afasta dos parâmetros de um conflito convencional.
Khan constatou que os cadáveres decorrentes destes ataques são enterrados logo em seguida e que o agente político da região, uma espécie de delegado do Governo, "não sai de seu escritório" por medo.
O mesmo Khan não é alheio à guerra no vizinho Afeganistão e tem fortes convicções sobre ela.
"Não há diferença entre Afeganistão e Paquistão e outros países muçulmanos. Como podemos aguentar isto?", finalizou. EFE