BRASÍLIA (Reuters) - O Conselho de Ética da Câmara adiou a votação de parecer pela cassação do presidente afastado da Casa, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), que estava prevista para esta terça-feira.
Integrantes do colegiado devem retomar a discussão na quarta-feira, após o relator do caso, Marcos Rogério (DEM-RO), pedir mais tempo para analisar voto em separado apresentado pelo deputado João Carlos Bacelar (PR-BA), pedindo a suspensão do exercício do mandato de Cunha por três meses, em vez da cassação.
“O prazo que solicitei leva em conta especialmente o voto apresentado em separado. É um voto que apresenta várias preliminares e ao final sugere uma condenação alternativa”, defendeu o relator.
“Não seria correto da parte deste relator simplesmente ignorar a manifestação apresentada.”
O adiamento da votação também atende aos anseios de deputados que defendem a cassação de Cunha, já que a sessão desta terça-feira não contava com a presença da deputada Tia Eron (PRB-BA), considerada voto decisivo no conselho.
“Fiz uso de uma previsão regimental”, disse Rogério a jornalistas. “Se isso veio a calhar com a ausência desse ou daquele parlamentar no colegiado hoje, obviamente não foi o objetivo central do relator.”
Em nota após a suspensão da sessão do conselho, a deputada Tia Eron afirmou que está em Brasília e que não se “furtará” de cumprir seu dever. Argumenta ainda que a reunião desta terça serviu para a discussão do parecer de Rogério, e que se a votação tivesse ocorrido, teria apresentado seu voto.
“A referida sessão não foi suspensa porque eu não me fiz presente, mas pelo fato de o relator, deputado Marcos Rogério, ter pedido vistas do voto em separado”, disse a parlamentar. “Estou convicta da grande expectativa que há em nosso país, referente a esta representação.”
O parecer do relator sustenta que Cunha quebrou o decoro parlamentar ao negar ter contas bancárias em seu nome no exterior. Após votação no Conselho de Ética, o parecer ainda precisa ser submetido ao plenário da Câmara.
A sessão do Conselho de Ética desta terça ocorria horas após a imprensa divulgar que o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, pediu ao Supremo Tribunal Federal (STF) a prisão de Cunha e de outros integrantes da cúpula do PMDB – o presidente do Senado, Renan Calheiros (AL), o ex-presidente da República José Sarney, e o senador Romero Jucá (RR).
Janot teria argumentado em seu pedido de prisão de Cunha que o deputado permanece promovendo articulações políticas em benefício próprio, apesar de seu afastamento determinado pelo Supremo.
Em nota, Cunha disse que não conhece o conteúdo do pedido de Janot, razão pela qual não poderia contestar suas motivações. Afirmou, no entanto, que vê “com estranheza” o pedido “absurdo”, divulgado, na opinião do deputado, com o objetivo de constranger os parlamentares que defendem sua absolvição.
INFLUÊNCIA DE CUNHA
Rogério preferiu não afirmar categoricamente, mas ponderou que há evidências da possível atuação de Cunha na Casa para evitar sua cassação.
“Não é o relator que tem que fazer essa afirmação, são as evidências, as trocas permanentes no Conselho de Ética, as manobras no sentido de tentar limitar o poder do plenário da Câmara”, disse Rogério a jornalistas.
Já o deputado Alessandro Molon (Rede-RJ) afirma de maneira mais direta que Cunha continua “operando politicamente”, em “desobediência” à determinação da Suprema Corte.
“Aqui na Câmara, que nós acompanhamos de perto, são evidentes os sinais de que o deputado Eduardo Cunha tenta atrapalhar o andamento do caso contra ele aqui no Conselho de Ética e também evidentemente as investigações, eu não tenho a menor dúvida disso”, disse Molon a jornalistas.
O processo contra Cunha corre há mais de sete meses no Conselho de Ética e já teve de voltar à estaca zero quando houve uma troca de relatoria.
No ano passado, em audiência na CPI, o então presidente da Câmara afirmou ter apenas as contas bancárias declaradas em seu Imposto de Renda. Mas documentos dos Ministérios Públicos do Brasil e da Suíça apontaram contas em nome de Cunha e de familiares no exterior. O parlamentar nega as irregularidades.
Ao se defender pessoalmente em uma audiência no conselho, o deputado afastado negou ser o dono das contas, mas admitiu ser o beneficiário de um trust.
A tramitação do processo ainda pode ser modificada por eventual decisão da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara, que deve votar na tarde desta terça-feira um parecer sobre o rito da cassação. A partir de uma consulta do presidente interino da Câmara, Waldir Maranhão (PP-MA), o deputado Arthur Lira (PP-AL) elaborou parecer em que defende que o processo de cassação seja encaminhado ao plenário como projeto de resolução, sem a possibilidade de apresentação de emendas que prejudiquem o acusado.
Além do processo no Conselho de Ética, e do pedido de prisão divulgado nesta terça pela mídia, Cunha é réu em um processo no Supremo Tribunal Federal, acusado de ter recebido 5 milhões de dólares em propina do esquema de corrupção na Petrobras (SA:PETR4) investigado pela operação Lava Jato.
No início de maio, o Supremo determinou a suspensão de seu mandato parlamentar a pedido da Procuradoria-Geral da República, sob a acusação de que estaria utilizando seu cargo em benefício próprio.
(Reportagem de Maria Carolina Marcello)