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Reunião tensa com militares teve ameaça de prisão a ex-presidente

Publicado 15.03.2024, 18:11
© Reuters Reunião tensa com militares teve ameaça de prisão a ex-presidente

O ex-comandante da Aeronáutica, brigadeiro Carlos de Almeida Baptista Junior, relatou em depoimento à Polícia Federal o clima de tensão que marcou a reunião, em dezembro de 2022, na qual o então presidente Jair Bolsonaro (PL) sondou a cúpula das Forças Armadas sobre a tentativa de um golpe de Estado. Ele afirmou que não aceitou receber a minuta discutida por Bolsonaro, se levantou da mesa e deixou a sala.

O brigadeiro também relatou que, em outra reunião, na qual Bolsonaro voltou a aventar a hipótese do golpe de Estado, por meio de Garantia da Lei e da Ordem (GLO), estado de defesa ou estado de sítio, o ex-chefe do Exército Marco Antônio Freire Gomes foi taxativo. "O general Freire Gomes afirmou que, caso (Bolsonaro) tentasse tal ato, teria de prender o presidente da República", declarou Baptista Junior no depoimento. Procurada, a defesa de Bolsonaro não se manifestou oficialmente.

'Conhecimento e revisão'

O encontro, no dia 14 de dezembro de 2022, foi convocado pelo então ministro da Defesa, Paulo Sérgio Nogueira. Ali, Nogueira disse aos comandantes que teria uma minuta que gostaria de apresentar para "conhecimento e revisão". Baptista Junior disse ter questionado: "Esse documento prevê a não assunção do cargo pelo novo presidente eleito?" As indicações estão no termo de depoimento do brigadeiro à PF, dentro das investigações da Tempus Veritatis.

Baptista Junior e Freire Gomes relataram aos investigadores que se colocaram contra os planos de Bolsonaro. Já o ex-comandante da Marinha, Almir Garnier Santos, alinhado com o ex-presidente, teria colocado tropas à disposição.

Anderson Torres

Ainda segundo o brigadeiro, nas reuniões com os comandantes das Forças e o então ministro da Defesa, Bolsonaro apresentava opções para solucionar o que chamava de uma possível "crise institucional", caso perdesse as eleições. Nesse contexto, Baptista Junior implicou o ex-ministro da Justiça Anderson Torres, destacando que ele participou de uma das reuniões com os chefes das Forças Armadas, na qual "procurou pontuar aspectos jurídicos que dariam suporte às medidas de exceção".

O depoimento de Torres à PF sobre o assunto foi marcado por negativas, a principal delas sobre a participação em reuniões em que foi discutida a trama antidemocrática. No entanto, além de Baptista Junior, o ex-comandante do Exército Marco Antônio Freire Gomes também pôs em xeque a versão de Torres, em cuja casa foi encontrada uma "minuta de golpe". Os militares apontam a presença de Torres em ao menos uma reunião com Bolsonaro e a cúpula das Forças para tratar do golpe.

"O ex-ministro, citado de modo genérico e vago por duas testemunhas, esclarece que houve grave equívoco nos depoimentos prestados", afirmou o advogado Edmar Novaki, que defende Torres.

Está registrado no depoimento feito à PF: "O depoente (Baptista Junior) deixou claro a Bolsonaro, em uma dessas reuniões, que tais institutos não serviriam para manter o então presidente da República no poder após 1.º de janeiro de 2023. O ex-presidente ficava assustado. O então comandante do Exército, Freire Gomes, também tentava convencer o então presidente a não utilizar os referidos instrumentos".

Entre os dia 1.º e 19 de novembro de 2022, o brigadeiro foi cinco vezes ao Palácio da Alvorada, por ordem do ex-presidente. Segundo o militar, inicialmente Bolsonaro estava resignado com o resultado das eleições, mas depois aparentou ter esperança de reverter a derrota nas urnas com as alegações de fraudes.

O brigadeiro foi questionado pelos investigadores se acreditava que houve fraudes nas eleições. Afirmou que, "conforme os resultados obtidos pela Comissão de Fiscalização do Ministério da Defesa, tem certeza de que não existiu qualquer fraude no sistema eletrônico de votação".

Baptista Junior relatou ainda encontro com o general Augusto Heleno, ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), em São José dos Campos (SP), durante formatura no Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA).

'Atônito'

Segundo o brigadeiro, Heleno ficou "atônito" e "desconversou" ao receber uma negativa de tentativa de golpe do principal nome da Força Área Brasileira (FAB). Procurado diretamente e por meio de seu advogado, Heleno não respondeu ao Estadão até a publicação deste texto.

O encontro ocorreu, de acordo com o documento da PF, no dia 16 de dezembro de 2022, quando o atual presidente Luiz Inácio Lula da Silva já havia vencido o pleito daquele ano. A conversa entre Heleno e Baptista Junior começou quando o ex-chefe do GSI perguntou se o brigadeiro poderia reservar um assento para ele em voo da FAB para retornar às pressas a Brasília por determinação de Bolsonaro.

Heleno estava na formatura de seu neto e tentou convencer Bolsonaro a desistir da convocação pessoal, o que foi negado pelo ex-presidente, conforme o documento. Baptista Junior disse que foi nesse momento que levou Heleno para uma sala reservada e afirmou "categoricamente" que a FAB não "anuiria com qualquer movimento de ruptura democrática". Ele disse ainda ter pedido a Heleno para levar o recado para o ex-presidente, que havia chamado um reunião de última hora com os comandantes em um fim de semana.

O então comandante da FAB não foi convocado para se reunir com Bolsonaro. O general Heleno, então, "ficou atônito e desconversou", de acordo com Baptista Junior, que pilotou o avião da Força Aérea Brasileira em retorno à capital federal. O ex-ministro-chefe do GSI esteve no voo.

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