(O autor é editor-chefe do Serviço Brasileiro da Reuters. As opiniões expressas são do autor do texto)
Por Cesar Bianconi
SÃO PAULO (Reuters) - Passado o primeiro mês de Joaquim Levy à frente do Ministério da Fazenda, aqueles que esperavam um interlocutor mais eficiente do que o antecessor Guido Mantega podem estar um pouco frustrados.
O ministro, que vem sendo o alicerce para a retomada da confiança na economia brasileira, tem cumprido a promessa de aparecer menos em público do que Mantega, que falava praticamente todos os dias com jornalistas na portaria do ministério em Brasília.
Isso é louvável, já que parte do descrédito do ex-ministro residia justamente na excessiva frequência com que se pronunciava.
Mas o novo chefe da equipe econômica do governo da presidente Dilma Rousseff tem gerado ruído quando fala.
No mais recente episódio, nesta sexta-feira, Levy sugeriu que não havia intenção de se manter o câmbio artificialmente valorizado, durante palestra em evento organizado pelo Bradesco BBI.
O dólar, após iniciar a sessão perto da estabilidade, disparou ante o real quando a fala do ministro piscou nos terminais de notícias em bancos e corretoras.
E isso numa sessão especialmente delicada para o mercado: trata-se do último dia de negócios do mês, quando há uma briga pela formação da Ptax mensal, taxa calculada diariamente pelo Banco Central que é referência para diversos contratos cambiais.
O que se viu em seguida foi uma ação que virou rotina para os assessores de Levy em janeiro, buscando esclarecer que as colocações do ministro teriam sido mal interpretadas. Segundo sua assessoria, o ministro estava falando do câmbio no mundo, e não no Brasil.
O estrago, porém, estava feito. A divisa norte-americana ganhou ainda mais ímpeto, subindo quase 3 por cento na máxima e voltando a se aproximar dos 2,70 reais.
Na semana passada, Levy foi a estrela do governo brasileiro em Davos, tendo sido bastante elogiado por empresários, investidores e autoridades presentes no Fórum Econômico Mundial.
No transcorrer do fórum, o Ministério da Fazenda publicou duas notas de esclarecimento à imprensa, contestando reportagens do Financial Times e da agência Dow Jones produzidas a partir de entrevistas a esses veículos concedidas por Levy.
Ao Financial Times, o ministro falou sobre as recentes mudanças nas regras de acesso a benefícios trabalhistas, em particular o seguro-desemprego, com as quais o governo federal espera economizar 18 bilhões de reais por ano. Medidas essas que, a propósito, foram concebidas ainda sob tutela do ex-ministro Mantega.
Levy disse ao jornal britânico que o sistema de benefícios previdenciários do Brasil estava "out of date", ou desatualizado na tradução literal, no momento em que cresciam as manifestações de centrais sindicais contra as mudanças.
Em nota, sua assessoria esclareceu que a observação "teve como objetivo ampliar o debate pela modernização das regras desse benefício diante das transformações do mercado trabalho nos últimos 12 anos".
Dias depois das declarações de Levy ao FT, fontes do governo reconheceram que as novas regras para o seguro-desemprego poderiam ser revistas, com avaliação das demandas de sindicalistas.
O presidente do Credit Suisse no Brasil, José Olympio Pereira, afirmou recentemente que seria "um sinal extremamente negativo ao mercado" um retrocesso nas medidas de ajuste do seguro-desemprego.
O ministro da Fazenda, dono de alta credibilidade, deve redobrar o cuidado com cada mensagem que deseja transmitir. Ou não vai demorar muito para que Dilma intervenha, como fez já no dia da posse do ministro do Planejamento, ao desautorizar declarações de Nelson Barbosa sobre mudanças na fórmula de reajuste do salário mínimo.
* Esta coluna foi publicada mais cedo no terminal financeiro Eikon, da Thomson Reuters.