Olá, caro leitor.
Nas semanas mais recentes, em específico após as eleições dos EUA, os preços de alguns ativos apresentaram fortes altas. Dentre esses ativos, destaca-se o Bitcoin, em máxima histórica (acima dos U$ 95 mil quando escrevo este texto) e acumulando valorização superior a 160% no ano, se considerado o preço em reais.
Dada a abruta alta recente, muitos investidores voltaram suas atenções para o ativo e passaram a se questionar se faz sentido incluí-lo em seus portfólios. Neste artigo, buscarei abordar essa questão não pela ótica da precificação (me propondo a indicar qual seria o preço justo para a criptomoeda) ou por aspectos técnicos (se o projeto é sólido e capaz de assumir o posto de “moeda do futuro”), mas sim pelo olhar da diversificação, conceito chave na gestão de portfólios.
A relação risco-retorno é recorrentemente mencionada no universo de investimentos: de forma simples e direta, espera-se que ativos mais arriscados sejam capazes de entregar retornos superiores quando comparados com alternativas mais conservadoras. Com base nessa relação, um investidor pode ser levado a crer que não é possível elevar o potencial retorno de seu portfólio sem que o risco assumido seja também superior. Essa linha de raciocínio tem fundamento, mas um aspecto adicional há de ser considerado.
De acordo com a Teoria Moderna de Portfólios, inicialmente apresentada por Harry Markowitz na década de 1950, o risco atrelado a um ativo pode ser dividido em duas porções: parcela sistemática e parcela específica. A primeira é atrelada às incertezas que afetam o mercado como um todo (taxas de juros, câmbio, inflação etc.), enquanto a segunda está associada a incertezas inerentes ao ativo avaliado (por exemplo, relativas ao segmento no qual está inserido, a regulamentações específicas e/ou à sua equipe de gestão).
Essa segmentação é importante, pois a parcela específica pode ser bastante reduzida caso o investidor componha sua carteira de forma eficaz. Em outras palavras, caso os ativos da carteira sejam selecionados adequadamente, espera-se que efeitos específicos se cancelem, restando ao investidor apenas a porção sistemática do risco. Por esse motivo, a parcela específica é também denominada diversificável.
Dessa maneira, ao se estudar potenciais ativos para compor uma carteira de investimentos, é fundamental avaliar o quanto seus retornos são correlacionados. Em que pese o clássico disclamer “desempenho passado não é indicativo de resultados futuros”, os históricos dos ativos podem trazer bons indicativos de quão forte é a relação entre eles.
Aplicando tais conceitos à questão central do texto, com base em dados extraídos da plataforma Quantum Axis, calculei o Coeficiente de Correlação de Pearson entre os retornos históricos do Bitcoin e os retornos históricos de alguns relevantes índices. Considerei dados mensais e três diferentes janelas temporais: dez, cinco e três anos. Trouxe para o estudo índices que representam classes de ativos que usualmente fazem parte das carteiras de investimentos dos investidores brasileiros:
- Índice Brasil 100 (IBrX 100) representando o mercado acionário brasileiro;
- Índice de Fundos de Investimento Imobiliários (IFIX) representando os FIIs;
- Índice de Hedge Funds ANBIMA (IHFA) representando os multimercados;
- Índice de Mercado Anbima (IMA-Geral) representando os títulos públicos; e
- S&P 500 (em reais) representando o mercado acionário dos EUA.
Os resultados são apresentados na tabela a seguir. O Coeficiente de Correlação de Pearson (LON:PSON) é uma medida adimensional que pode assumir valores entre -1 e 1. Os extremos indicam correlações perfeitas (negativa e positiva, respectivamente). Em termos gerais, pode-se considerar que um resultado superior a 0,7 indica alta correlação, algo entre 0,3 e 0,7 correlação moderada e abaixo de 0,3 baixa correlação.
Por meio dos dados, é possível perceber que historicamente o Bitcoin apresenta baixa correlação com as principais classes de ativos brasileiras e correlação moderada com o S&P 500. Com base na boa teoria de Finanças, portanto, sua inclusão na carteira pode ser um movimento estratégico, com o objetivo de aumentar o retorno potencial usufruindo do benefício da diversificação, o que se diz ter sido classificado por Markowitz como “o único almoço grátis em Finanças”.
A valorização recente não pode ofuscar o fato de se tratar de um ativo complexo, disruptivo e com altíssimo risco. Entretanto, mesmo investidores conservadores podem avaliar a inclusão em seus portfólios limitando, claro, sua exposição. Em muitos casos, 1% do total investido já será um limite superior adequado, tendo em vista a propensão a risco e os objetivos do investidor. A análise há de ser feita caso a caso.
Por fim e corroborando com os achados deste estudo, cabe destacar que a inclusão estratégica do Bitcoin em portfólios é um movimento que vem sendo realizado por diversos investidores institucionais pelo mundo não somente em carteiras mais agressivas, mas também em algumas tipicamente conservadoras, tais como fundos de pensão e endowments.
Espero que o texto agregue para suas decisões de investimento. Por favor, fique totalmente à vontade para compartilhar seus pensamentos sobre o assunto e/ou para sugerir temas para os próximos artigos.
Uma ótima semana!
Fabio Civiletti é Mestre em Finanças pela Université de Bordeaux (França), fundador e Diretor Executivo da iluminus - Academia de Finanças, além de sócio da CHC Finance. Mais informações sobre sua trajetória profissional constam em seu perfil do LinkedIn. O e-mail para contato é o fabio.civiletti@iluminus.com.br.