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CVM diz que 23% dos rendimentos de fundo imobiliário Mérito vinham de novas cotas

Publicado 21.07.2018, 17:44
© Reuters.  CVM diz que 23% dos rendimentos de fundo imobiliário Mérito vinham de novas cotas

Arena do Pavini - Relatório da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) sobre irregularidades no fundo imobiliário Mérito Desenvolvimento Imobiliário I, que teve sua negociação em bolsa suspensa esta semana, revela que o fundo obtinha grande parte dos recursos para distribuir para os investidores da cobrança de taxa nas novas emissões de cotas e na reavaliação de ativos de sua carteira. A CVM afirmou ter detectado indícios de pirâmide financeira na forma como o fundo, gerido pela Mérito Investimentos e administrado pela Planner Corretora, funcionava.

Segundo a CVM, a investigação começou a partir de uma denúncia de um investidor, que estranhou que o fundo, apesar de ainda estar em fase de investimento e ter vários projetos em maturação, distribuía religiosamente o mesmo percentual de rendimentos aos cotistas, como um título de renda fixa. Além disso, o fundo promovia constantes aumentos de capital, apesar de ter uma grande parcela de recursos em caixa, que poderiam ser usados para os investimentos.

Rendimento constante de 1% ao mês

Entre junho de 2013 e maio de 2018 o fundo distribuiu em torno de R$ 30.290 mil de rendimentos sobre um capital integralizado médio mensal de R$ 51.397 mil, e um valor de mercado médio mensal de R$ 55.065 mil. Os rendimentos distribuídos, desta forma, representaram uma rentabilidade líquida de 93,47%, no período, e de 1,11% ao mês, estima a autarquia. Isso apesar de seus projetos terem uma maturação estimada em 48 meses, ou seja, quatro anos. Isso explica também a popularidade do fundo, que tem cerca de 8 mil cotistas.

Taxa de ingresso respondia por 23% das receitas

O que a CVM constatou é que, desde sua criação em 2013 até este ano, 23% da receita do fundo, ou R$ 15,3 milhões, vieram da chamada taxa de ingresso, cobrada na emissão de novas cotas. Essa taxa foi subindo com o tempo, de 6% para os que já eram cotistas e 10% para os novos na primeira emissão, para 20% e 30% respectivamente na última. Consultado pela B3 sobre por que cobrar uma taxa de ingresso tão alta em vez de reduzir o valor da cota, o gestor do Mérito respondeu que a taxa de ingresso entrava como receita para o fundo, e portanto poderia ser distribuída como rendimento.

A conclusão da CVM é que o fundo usava as novas ofertas, atraindo novos investidores, para aumentar o rendimento a ser distribuído aos investidores, o que se assemelhava a um esquema de pirâmide financeira. Sem as emissões, o Mérito I teria acumulado um prejuízo de R$ 19,9 milhões em sua existência, desde 2013, estima a CVM. “O fundo nunca gerou caixa proveniente de suas atividades operacionais como demonstrado nas suas demonstrações financeiras auditadas correspondentes aos exercícios de 2013 a 2017”, diz a CVM.

Reavaliação de ativos respondia por 62% das receitas

Outra constatação da CVM foi que a maior parte da receita do Mérito I, R$ 41,7 milhões, ou 62% do total, veio de ajustes do valor justo de seus investimentos, baseados em laudos de avaliação tanto dos empreendimentos imobiliários quanto da carteira de títulos e valores mobiliários lastreados em ativos imobiliários. Segundo a CVM, a distribuição de lucros com base nessa receita de avaliação dos ativos representa na verdade uma antecipação de resultado, que poderá ou não se realizar no futuro. “Assim, juntamente com a distribuição de R$ 15 milhões de taxa de ingresso, também representa uma devolução do capital investido”, diz o relatório da CVM. Ou seja, o dinheiro dos próprios cotistas sendo distribuído para eles de volta.

A investigação constatou também que o fundo investia em Sociedades em Conta de Participação (SCP), o que não se enquadraria como opção para os fundos imobiliários. Isso porque, na prática, essas operações funcionavam como empréstimos aos parceiros, incorporadores e construtores para desenvolver empreendimentos específicos, o que é proibido para esse tipo de fundo. Em caso de quebra de uma dessas sociedades, o fundo se tornaria credor quirografário e entraria na liquidação, o que confirmaria o caráter de empréstimo da operação.

Taxa de performance

A CVM destacou ainda a cobrança pelo gestor do fundo de taxa de performance, que era justificada pelo rendimento constante do fundo, mas que na verdade vinha das taxas de ingresso das emissões e da reavaliação dos ativos. “Além disso, a distribuição fixa desses rendimentos períodicos, pagos ora com as mencionadas taxas de ingresso, ora com reavaliações de investimentos em carteira, acabam por simular uma operação de renda fixa, de forma a alavancar o apelo comercial do fundo e, dessa forma, atrair volumes crescentes de novos cotistas, o que de fato tem ocorrido”, diz a CVM. “Ocorre que tal engenharia financeira pode engendrar um círculo vicioso de liquidez, em que o fundo necessita, precipuamente, de novas emissões e das respectivas taxas de ingresso delas decorrentes para viabilizar o pagamento dos rendimentos, que se impõe em volume cada vez maior, face o crescimento do patrimônio líquido do fundo, em dinâmica equivalente a de uma pirâmide financeira”, diz a CVM.

A CVM constatou também uma operação com suspeita de irregularidade feita pelo fundo, com a compra de cotas de outro fundo imobiliário gerido pela própria Planner e de um derivativo para obter um retorno como uma aplicação de renda fixa. Nas contas da B3, a operação teria dado um prejuízo de R$ 6 mil, mas o fundo reportou um ganho de R$ 327 mil.

A autarquia chamou a atenção também que a gestão do fundo imobiliário deve ser feita por uma instituição financeira, corretora ou banco, e não por uma gestora, como ocorria com o Mérito I. O gestor poderia cuidar apenas dos ativos mobiliários, ou seja, não dos imóveis. Mas, no caso do Mérito, Alexandre Despotin, sócio responsável da Mérito Investimentos, fazia a gestão dos empreendimentos imobiliários do fundo e assinou a maior parte dos contratos, parcerias escrituras de compra e venda dos imóveis, como procurador da Planner. A CVM considera que a Planner não poderia delegar a um terceiro as atividades de gestão dos ativos imobiliários do fundo.

Por Arena do Pavini

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