Por Letícia Fucuchima
SÃO PAULO (Reuters) - O ressarcimento pelos crescentes cortes de produção de usinas eólicas e solares é alvo de uma disputa judicial envolvendo geradores renováveis e a agência reguladora Aneel, que divergem sobre os valores devidos e os impactos aos consumidores de energia, responsáveis por pagar essa conta.
As entidades ABEEólica e Absolar, que movem a ação judicial, dizem ter direito à compensação por um volume muito maior de cortes do que o fixado na regulamentação atual, ponto que é contestado pelo regulador, que por sua vez destaca um potencial impacto de milhões de reais aos consumidores via Encargo de Serviços do Sistema (ESS), cobrado na conta de luz.
Geradores eólicos e solares estão amargando perdas financeiras relevantes desde o ano passado com interrupções da produção de suas usinas determinadas pelo Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS), um problema que pode tornar projetos inteiros inviáveis e impactar decisão de investimentos futuros.
A ABEEólica calcula que os prejuízos aos geradores podem chegar a 700 milhões de reais entre agosto de 2023, quando os cortes se agravaram, e o fim deste ano. Mas aponta que existe ainda um passivo anterior que também precisa ser pago.
Em documento judicial, a entidade afirmou que houve compensação de apenas 7,6% dos cortes da fonte eólica em 2022 e de 0,3% em 2023, enquanto no primeiro semestre deste ano a compensação "beira a zero".
Para a fonte solar, o ônus até o momento é menor, uma vez que a regulamentação para ressarcimento é mais recente.
Já na avaliação da Aneel, os geradores não têm direito a serem compensados por todo tipo de cortes, apenas por aqueles relacionados à "indisponibilidade externa", quando há falha em equipamentos de terceiros, por determinado tempo, que afeta o escoamento da energia.
O regulador considera que não cabe aos consumidores pagarem aos geradores quando o ONS interrompe a produção das usinas por questões de segurança do sistema --principal motivo dos cortes atuais-- ou quando há um excedente de energia.
Em nota à Reuters, a Aneel ressaltou que "os valores referentes às compensações financeiras são da ordem de centenas de milhões de reais, e que a inclusão disso nos encargos setoriais obrigaria os consumidores industriais, comerciais e residenciais a arcarem com esse custo adicional em suas contas de energia elétrica".
"Nossas contas mostram que o impacto (ao consumidor) é pífio diante da gravidade para o setor eólico e solar", disse Carlos Dornellas, diretor técnico da Absolar.
Na discussão judicial, as entidades apontam que os valores de ressarcimento calculados pela própria Aneel de 2021 a 2023, de 91,3 milhões, é muito inferior aos quase 20 bilhões de reais pagos de ESS pelos consumidores, para outras finalidades, nesse mesmo período, incluindo mais de 2 bilhões para importação de energia.
Elbia Gannoum, presidente da ABEEólica, defendeu que os custos com os cortes de geração não devem ser alocados no gerador, já que não estão relacionados ao desempenho dos empreendimentos, mas são custos do sistema, e por isso devem ser pagos pelos usuários.
Ela ressaltou ainda que essa tese está baseada na lei de 2004, que reestruturou o setor elétrico, e que os efeitos de cobrar dos consumidores via ESS são menos prejudiciais do que levar a uma deterioração dos negócios dos geradores, que passariam a cobrar mais pela energia no futuro.
(Por Letícia Fucuchima)