Por Eduardo Simões
SÃO PAULO (Reuters) - A decisão do presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), de romper com o governo pode provocar o afastamento de seus aliados em um momento em que se encontra mais vulnerável, por estar sendo investigado por suspeita de envolvimento no esquema de corrupção pela operação Lava Jato, disseram analistas a Reuters.
Cunha anunciou nesta sexta-feira sua ida para oposição ao governo Dilma Rousseff, após um delator da Lava Jato afirmar em depoimento à Justiça Federal do Paraná que Cunha lhe pediu pessoalmente 5 milhões de dólares em propina. O deputado viu no episódio uma ação orquestrada do governo com o Ministério Público para constrangê-lo.
"Eu acredito que o Eduardo Cunha talvez tenha esticado a corda excessivamente", disse à Reuters o cientista político da Fundação Getúlio Vargas Claudio Couto.
"Ele também é vulnerável. Ele começou a cobrir demais essas apostas...de enfrentamento com o governo, e aí quando os problemas começam a aparecer para ele também, ...ele começa a se tornar enfraquecido", acrescentou.
O perigo, segundo analistas, é de que o discurso excessivamente agressivo contra o Palácio do Planalto afaste aliados que o ajudaram a chegar ao comando da Câmara no começo do ano, contra a vontade do Executivo.
"Ele (Cunha) está entrando numa seara perigosa porque essa atitude muito belicosa pode afastar quem esteve ao lado dele", disse Lucas Aragão, cientista político e sócio da consultoria Arko Advice.
"O que a gente tem que esperar é para ver nos próximos 10, 15 dias como vai ser a movimentação de parlamentares do PMDB e de outros partidos para ver quem fica com ele e quem não fica. Agora que ele vai mostrar a força dele", acrescentou.
IMPEACHMENT E AJUSTE FISCAL
A presença de um oposicionista na presidência da Câmara tem potencial de atrapalhar a vida do governo na Casa, embora o peemedebista tenha garantido que sua decisão pessoal não alterará seu posicionamento institucional.
Na pauta da Câmara no segundo semestre estão medidas do ajuste fiscal e um possível pedido de impeachment contra Dilma. Cabe a Cunha, como presidente da Câmara, decidir dar ou não seguimento a um eventual pedido de impedimento contra a presidente.
"Acuado, ele vai para o ataque. É isso que ele está fazendo agora. Ele está querendo retaliar o governo, talvez não só na questão do impeachment, mas também na votação de matérias importantes, como questões relacionadas ao ajuste fiscal", disse Couto, da FGV.
Para a consultoria política Eurasia Group, a possibilidade de impeachment da presidente Dilma é de 30 por cento. O analista da consultoria João Augusto de Castro Neves aponta que um eventual enfraquecimento de Cunha contribui para esse percentual baixo.
"A tendência é que a capacidade dele (Cunha) de agregar aliados é declinante. Reduz a nossa visão de impeachment também em função disso. A capacidade de um presidente da Câmara sendo investigado capitanear o impeachment se reduz", avaliou Castro Neves acrescentando, no entanto, que os riscos para a agenda do ajuste das contas públicas no Congresso aumentaram.
"Próximos seis meses serão extremamente difíceis. Poderá piorar tanto no lado político, quanto econômico", previu.
(Reportagem adicional de Walter Brandimarte, em São Paulo; e de Silvio Cascione, em Brasília)