SÃO PAULO (Reuters) - O matemático autodidata indiano Srinivasa Ramanujan (1887-1920) é o foco da cativante cinebiografia “O Homem que Viu o Infinito”, em que o diretor britânico Matt Brown lança-se ao desafio de concretizar minimamente raciocínios muito abstratos.
Também autor do roteiro, Brown acerta ao focar seu filme num retrato sensível das dificuldades de adequação de Ramanujan (Dev Patel), um gênio intuitivo, a um tempo e um espaço ainda despreparados para compreendê-lo. Assim, observa-se com interesse os esforços do jovem pobre para sobreviver em Madras, sul da Índia.
Órfão de pai, sem dinheiro nem educação formal, ele luta para sustentar mãe e esposa (Devika Bhise). Não o ajuda muito sua obsessão permanente por fórmulas matemáticas que lhe chegam à mente naturalmente, como uma revelação divina – o que, aliás, ele acredita que seja o caso. “Deus fala comigo”, ele diz.
Conseguindo, a duras penas, um emprego num escritório – até por sua habilidade com as contas -, ele inicia uma correspondência que mudará sua vida, com um professor do renomado Trinity College, de Cambridge, G.H. Hardy (Jeremy Irons).
Com o professor, ele compartilha algumas de suas teses, surpreendendo Hardy ao ponto de intrigá-lo, pois sabe que se trata de uma pessoa simples do interior da Índia. Hardy decide, então, convidá-lo a vir para Trinity.
O choque cultural do jovem no ambiente elitista da escola inglesa é tratado com eficiência pelo filme. Ramanujan, que nunca deixara seu povoado indiano, é confrontado com toda espécie de hostilidade, do clima frio à alimentação pesada (ele é vegetariano), passando pela necessidade de usar sapatos, o que ele desconhece (só calçava sandálias). Pior que isso é a atitude francamente racista e desdenhosa da maioria dos professores de Trinity, que não veem com bons olhos a presença do camponês indiano sem diplomas entre eles.
O enredo tira bom proveito do contraste entre o próprio Ramanujan, místico e apaixonado pela intuição, e seu protetor Hardy, racionalista e ateu, empenhado em convencer o rapaz de que ele precisa assimilar procedimentos acadêmicos formais para poder comprovar a profusão de teorias que assaltam sua mente brilhante.
Nem todos são inimigos do novato, no entanto. Hardy tem no amigo e colega John Littlewood (Toby Jones) um aliado irônico e sagaz e mais aberto a relações pessoais do que o reservado Hardy. Num meio acadêmico altamente competitivo e conservador, também desperta como simpatizante deste pequeno núcleo independente o rebelde Bertrand Russell (Jeremy Northam). Mas é fato que são minoria.
Tal como fez em filmes anteriores, como “Quem quer ser um milionário” e “O exótico Hotel Marigold”, o protagonista Dev Patel não economiza energia para encarnar seu original personagem – embora aqui esteja ligeiramente mais contido em sua tendência para o overacting. Essa contenção contribui para que o filme não perca o foco.
Não exagerando no jargão matemático, “O Homem que Viu o Infinito” ressalta o preconceito de uma época contra o pioneirismo de um outsider, cujas teorias, quase um século depois de sua morte, vêm sendo não só comprovadas como aplicadas no desenvolvimento de computadores, na economia e no estudo dos buracos negros.
(Por Neusa Barbosa, do Cineweb)
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