SÃO PAULO (Reuters) - O título e o cartaz de filme francês “A Viagem de Meu Pai”, de Philippe Le Guay, sugerem um road movie. A expectativa que se constrói em torno dessa viagem, que tem por destino a Flórida, alimenta o clima de uma complexa e delicada relação familiar, envolvendo um pai octagenário e afetado pelo Alzheimer, Claude (Jean Rochefort) e uma filha, Carole (Sandrine Kiberlain).
Partindo de uma peça de teatro – “Le Père”, de Florian Zeller – o diretor e corroteirista Le Guay joga habilmente com as tensões geradas pela doença do pai, que é voluntarioso e implicante com todas as suas cuidadoras, evitando jogar a história toda num abismo de melodrama.
Sem escamotear o alto custo para Carole de sua recusa de internar Claude numa residência para idosos, projeta-se o relacionamento dos dois como uma troca afetuosa, ainda que sujeita a uma constante gangorra emocional.
Interpretada com sutileza e segurança pela experiente Sandrine Kiberlain, Carole é uma personagem feminina centrada e respeitável. Não é nada simples o equilíbrio que mantém à frente de um lar em que convivem, além do pai exigente de cuidados, seu filho adulto (Clément Métayer) e um novo marido (Laurent Lucas). Fora dali, coube a ela salvar o negócio familiar, assumindo-o quando a sanidade do pai declinou.
A sombra de uma irmã que há anos foi para os EUA é o elemento desagregador. Claude insiste no projeto de visitar a filha distante, constantemente dissuadido por Carole, no que parece uma reação de ciúme ou rejeição.
Há mais sobre isso do que convém comentar aqui e a maneira como este segmento se encaixa na trama é particularmente bem-sucedida para que o filme não se transforme num vale de lágrimas.
Contribui enormemente neste sentido a interpretação generosa do veterano Jean Rochefort, o ator conhecido por sucessos e cults como “O Marido da Cabeleireira” e “Caindo no Ridículo”.
Quando consegue dominar seus lapsos de memória, ele mostra seu aspecto sedutor, malandro e imaginativo ao tratar com sua nova cuidadora, a jovem Ivona (a romena Anamaria Marinca, da Palma de Ouro 2007 “4 meses, 3 semanas e 2 dias”), e em suas conversas com o neto. Estes momentos revelam algo do homem que ele foi, do qual se enxergam apenas fragmentos.
(Por Neusa Barbosa, do Cineweb)
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