SÃO PAULO (Reuters) - Desde o título, “Sob Pressão”, o novo filme do diretor Andrucha Waddington, anuncia o clima de emergência que caracteriza essa história, em torno da crise permanente no atendimento público de saúde no Brasil.
Partindo do livro “Sob Pressão – A rotina de guerra de um médico brasileiro”, o filme explora experiências relatadas pelo médico Márcio Maranhão, que funcionou como consultor técnico nas filmagens, garantindo um realismo contundente, não raro assustador.
A situação-base é um dia infernal, o que não é raridade no setor de emergências de um hospital público, ainda mais em se tratando, como este cenário do filme, de uma instituição localizada num extremo do Rio de Janeiro.
Ao final de mais um plantão, o exausto dr. Evandro (Julio Andrade), chefe da emergência, se depara com um quadro dramático. Tem que decidir se opera primeiro um traficante ou um policial militar, ambos colhidos em mais uma guerra do tráfico nas imediações. A chegada de um menino de classe média alta, filho de um dono de jornal, ferido por uma bala perdida, completa o impasse, já que o centro cirúrgico é um só.
Numa verdadeira situação de guerra, Evandro é pressionado por diversas frentes – como o capitão PM (Thelmo Fernandes) que exige que ele opere o seu homem, abandonando o traficante, e a administradora do hospital, Ana Lucia (Andréa Beltrão), temerosa das consequências da demora no atendimento ao filho do dono de jornal.
Evandro lida ainda com seus próprios fantasmas, o pior deles a dependência química – fato não incomum em profissionais da saúde como ele, corroídos pelas angústias dilacerantes do trabalho e a disponibilidade de psicofármacos ao alcance das mãos.
Diretor experimentado em gêneros diversos, da comédia (“Eu Tu Eles”) ao documentário (“Viva São João”), Waddington mostra mão segura na manutenção de um clima de permanente tensão nos corredores deste hospital despojado, em que repercutem algumas das mazelas do Brasil. E o faz de maneira a privilegiar o lado humano de seus personagens, cujo coração bate sempre no ritmo da história.
Premiado no Festival do Rio, Julio Andrade mostra, mais uma vez, por que é um dos mais respeitados atores da atualidade no país, compondo um protagonista marcado por falhas que nunca se afasta da ética pessoal, afirmando sua responsabilidade profissional diante de tudo.
Ao seu lado, fazem bonito outros médicos jovens da equipe, especialmente Carolina (Marjorie Estiano), a recém-chegada que pega no tranco em seu primeiro dia de trabalho, e Paulo (Ícaro Silva), um dedicado assistente que se contrapõe eventualmente a Evandro, mas nunca lhe nega lealdade. Também premiado no Rio, o coadjuvante Stepan Nercessian injeta, de vez em quando, racionalidade e simpatia no meio do caos.
Filmado em setores abandonados da Santa Casa de Cascadura, zona norte do Rio, “Sob Pressão” tem seu ponto alto num realismo que chega a requintes de quase crueldade. Mais apavorante é pensar que no dia a dia de tantos hospitais do país situações iguais ou piores possam estar se repetindo neste exato momento.
(Por Neusa Barbosa, do Cineweb)
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