O comunicado pós-reunião do Comitê de Política Monetária do FED (FOMC), na última quarta-feira, sugeriu que finalmente o BC americano pretende iniciar, de forma “relativamente rápida”, o processo de ajuste no seu balanço. Malgrado seja um movimento esperado, penso que precisamos estar muito atentos a essa inflexão na política monetária dos EUA.
Em 2008, o FED iniciou uma nova (e ousada) política. Esse processo foi, inclusive, seguido por vários bancos centrais, como o BCE. O problema é que tal forma de atuar tornou os mercados globais anestesiados, pois as taxas de juros caíram para zero. Era como se os BCs despejassem dinheiro de helicóptero sobre os mercados financeiros, uma época de dinheiro fácil. Mas por que isso se deu?
Como escrevi em artigo de novembro de 2015, aqui para o blog, “para mitigar os efeitos da crise, o BC americano adquiriu uma infinidade de títulos dos bancos americanos, injetando bilhões de dólares no sistema bancário. O problema é que, pela teoria econômica, esse verdadeiro derrame de moeda traria um real risco inflacionário, no médio prazo. Assim, por conta desse temor, o FED inovou ao remunerar os depósitos voluntários dos bancos comerciais (e não somente os compulsórios, como de hábito). Dessa forma, ao colocar as taxas em 0,25% a.a., os bancos hesitariam em despejar toda essa moeda no mercado. Ademais, por causa da alta inadimplência, a ideia de deixar os dólares em caixa não era descabida, ainda mais sendo os bancos remunerados.” (…) “Na prática, essa montanha de dólares faz a taxa de juros americana, no interbancário (como se fosse nosso CDI), ficar em zero. Assim, a elevação para 0,5% das taxas básicas terá impacto não desprezível no balanço operacional do FED, daí o cuidado da autoridade monetária em agir”.
Passado o tempo, a taxa dos fed funds já se encontra entre 1%-1,25% e a situação parece calma. Assim, a hora de mexer pode mesmo ser esta, quando a economia abre uma janela de oportunidade. Mas será que a autoridade monetária sairá vendendo os títulos que carrega em seu balanço como se não houvesse amanhã, afetando as taxas de juros privadas?
Sinceramente, creio que não (mas é puro achismo). O que me aflige, no entanto, não é como, mas quem conduzirá essa transição? Em outras palavras, não vejo ninguém falando seriamente sobre um evento que tem poder de sacudir os mercados financeiros globais.
Minha pergunta procede, pois creio que Donald Trump substituirá Janet Yellen da presidência do FED em janeiro próximo. E tal substituição fará uma brutal diferença, a depender do perfil do próximo presidente (caso minha percepção se concretize). As especulações são incipientes, e um dos nomes mais cotados é o de Gary Cohn, ex-Goldman Sachs, e atual presidente do Conselho Econômico Nacional.
Não estamos aqui questionando competência de ninguém; não se trata disso. O ponto crucial é saber como um (possível) novo presidente dará prosseguimento a uma tarefa que Yellen iniciara. Não é trivial! E, o que mais me amedronta, é que não vejo os mercados discutindo sobre essa eventual mudança.
Com os mercados de ações nos píncaros, e com a curva de juros americanos quase “flat”, temo que o processo de normalização dar-se-á com alguma turbulência e volatilidade. Assim sendo, é para colocar esse tema no radar.
Por aqui, seremos impactados (todos serão!). Aqueles países que fizerem seu dever de casa serão menos penalizados na hora do rearranjo da liquidez global a um novo patamar. Daí precisarmos batalhar pelas reformas e sinalizarmos um ajuste fiscal definitivo. Não é possível dependermos de sorte ou que precisemos elevar nossa Selic, que, aliás, vem caindo com consistência (graças à competência do nosso BC). Seria um retrocesso lamentável.