O mercado de açúcar encerrou a semana novamente em queda. O vencimento maio de 2015, que normalmente reflete a entrada da safra de cana do Centro-Sul, despediu-se da semana cotado a 12.13 centavos de dólar por libra-peso, uma retração de 55 pontos equivalente a 12 dólares por tonelada. Em reais por tonelada também houve queda acentuada de 5% em relação à semana passada. E durma-se com um barulho desses: os fundos estão vendidos a descoberto nada menos que 115.000 contratos.
O ritmo das exportações brasileiras está mais lento. Nos primeiros dois meses de 2015 as exportações de açúcar somaram 3.4 milhões de toneladas, queda de 13.5% comparando com o mesmo período do ano passado. No acumulado de doze meses, as exportações alcançam 23.6 milhões de toneladas, retraindo 12.7% em relação ao mesmo período anterior. Esse volume acumulado é o menor desde outubro de 2012. O valor total das exportações de açúcar somam no acumulado de doze meses US$ 9.12 bilhões com queda de mais de 20% e o menor valor arrecadado na exportação desde maio de 2010. Uma ótima informação para os baixistas. Mesmo que a exportação de março chegue a 1.475.000 toneladas, segundo estimativa de um trader, o acumulado de doze meses permanece inalterado já que as exportações de março do ano passado chegaram a 1.56 milhão de toneladas.
As exportações de etanol nos dois primeiros meses foram pouco acima dos 220 milhões de litros, retraindo 13% em relação a janeiro e fevereiro do ano passado. No acumulado de doze meses o total exportado é de 1.36 bilhão de litros com derretimento de 48% em relação ao período anterior.
No nosso primeiro comentário de 2015, quando o mercado negociava ao redor de 15 centavos de dólar por libra-peso dissemos o seguinte: “Imagine que você tenha US$ 1 milhão que deve ser obrigatoriamente apostado numa opção digital, ou seja, você tem que apostar que o mercado ou chega a 12 centavos de dólar por libra-peso ou que chega a 18 centavos de dólar por libra-peso. Onde você apostaria? Mande sua opinião”. Dois terços das respostas recebidas apontavam 12 centavos, que estão a apenas 10 pontos de colocar a mão no prêmio fictício de US$ 1 milhão. Não é fácil ser trader de açúcar nesses dias.
Tenho sido indagado com alguma frequência por leitores sobre algumas operações de balcão mais usadas no mercado de açúcar, em especial os chamados acumuladores. Os acumuladores são contratos nos quais uma das partes é obrigada a comprar da outra parte um determinado número de contratos futuros de açúcar em NY num preço pré-determinado em uma série de datas pré-determinadas ao longo de um período de tempo especificado. Se o preço de fechamento do açúcar em determinada data ficar acima ou abaixo do nível de “desaparecimento” estabelecido entre as partes, todas as acumulações restantes no período especificado são canceladas.
O valor nocional do contrato pode aumentar periodicamente, aumentando assim a alavancagem (e o risco) caso uma condição pré-definida seja acionada, por exemplo, se o preço do açúcar ficar acima ou abaixo de determinado nível concordado entre as partes. Um acumulador é diferente de um contrato de opção negociado em bolsa. Como são opções que dependem da trajetória de preços, tanto seu apreçamento quanto o cálculo das gregas (fatores de sensibilidade) são muito mais difíceis de gerenciar.
Sempre utilizei os mercados de balcão quando era trader, até mesmo em função da necessidade de hedge da empresa que ia além do que o mercado futuro podia oferecer em termos de liquidez naqueles tempos. Não posso, portanto, ser contra os acumuladores e entendo que as operações de balcão em algumas situações são bem melhores do que as opções negociadas em bolsa (em especial para empresas consumidoras industriais) dependendo dos perfis de risco e comercial da empresa e das suas características de negociação.
O que tenho visto, no entanto, é a conjunção de alguns fatores de risco que podem trazer problemas para quem compra ou vende esses instrumentos: primeiramente, para negociar opções de balcão o trader, o gestor de risco, o controller, para mencionar alguns, precisam obrigatoriamente entender a extensão dos riscos assumidos (vide os casos que ocorreram no passado recente com empresas do mercado de soja e mesmo do açúcar); segundo, não é prudente utilizar a totalidade das fixações de preço usando acumuladores. Vi recentemente o caso de uma empresa que, numa simulação de cenários de preço, estaria ora com apenas 50% do seu volume fixado (se o mercado caísse), ora com 200% (se o mercado subisse). Não há como não dizer que faltou um pouco de bom senso por parte dos gestores de permitir que a totalidade de suas fixações de preço fosse feita se utilizando desse instrumento. Apenas a titulo de curiosidade, os acumuladores também são conhecidos no mercado acionário pelo sugestivo nome de “I-Will-Kill-You-Later”. Por razões óbvias ninguém mencionou esse nome para o mercado de commodities.
Hoje há uma variedade de produtos de balcão que combinam segurança com apetite ao risco. Vale sempre a máxima de não se colocar todos os ovos na mesma cesta. Como diria Peter Bernstein, autor do delicioso livro “Against the Gods” (em português, Desafio aos Deuses) um derivativo é como uma lâmina de barbear, serve para fazer a barba, mas também pode matar.
Tenham uma excelente semana
Arnaldo Luiz Corrêa