O ano era 1992...
Havia poucas razões para comemorar... Não para o Jóquei J.Ricardo, mais conhecido como "Ricardinho". Com seu extraordinário cavalo Falcon Jet, debaixo de dilúvio, e diante de cerca de 35 mil pessoas, Ricardinho vence seu primeiro GP Brasil de Turfe, no Hipódromo da Gávea, no Rio de Janeiro. A reta final foi histórica; brigou "cabeça a cabeça" por 600 metros com 2 "monstros": o jóquei Juvenal Machado da Silva, e um outro cavalo marcante, Flying Finn.
Um repórter, num daqueles momentos raros, 2-3 minutos após a corrida, entregou a Ricardinho um rádio para um rápido comentário para as TV's que faziam a transmissão do Grande Prêmio:
“Eu ganhei "Seu Ernani"! Eu ganhei!", explodia em emoção J.Ricardo ao responder a um comentário feito pelo locutor oficial do Jóquei Clube Brasileiro, Ernani Pires Ferreira.
Entretanto, o Brasil era muito diferente daquele momento captado numa tarde chuvosa do Rio de Janeiro.
O país, meses antes, havia passado por um "confisco da poupança"; tecnicamente, uma retirada de praticamente 80% do meio circulante, com o objetivo de acabar com uma hiperinflação, cujo ápice se aproximou de 80% ao mês. As Finanças Públicas, diante de uma moeda que se desvalorizava cerca de 2% ao dia, eram uma verdadeira bagunça A sociedade se virava como podia; se estocava no início do mês ou aplicava suas parcas poupanças no "overnight".
Pra piorar, o Brasil enfrentou um impeachment do Presidente da República no final do mês de setembro.
Talvez, em alguns momentos, de uma forma precipitada, alguns possam avaliar a atual situação numa perspectiva mais otimista do que aquela vivida em 1992.
Não... não é... pelo menos, pra mim.
Não vivemos uma hiperinflação; porém, uma inflação de 10% ao ano é tão agressiva ao poder aquisitivo da população, quanto uma de 60´%-70%-80% ao mês, principalmente quando comparamos dinâmicas de gatilhos salariais e indexações, próprios dos anos 80 e parte dos 90. Numa outra direção, faltam estudos, visões, comparações e percepções muito mais profundos, justos e técnicos comparando as 2 realidades; a de 1992, e a de hoje. O Brasil ainda é um país novo, uma "República" nova... se ainda o é, imagine há 25-30 anos atrás.
Demarcando eventos históricos, o início dos anos 90 marcava essencialmente um período de apenas 30 anos de uma intensa industrialização brasileira, a partir da vinda das montadoras automobilísticas garantida pela Política Econômica de Juscelino Kubitschek.
Bolhas de ativos, quando não passageiras e raras, inexistiam completamente.
O país era um grande país fechado.... fechado a tudo, informática, capitais e muitos produtos industrializados, muitas vezes, para preservar os oligopólios brasileiros. Estatais dominavam tudo, ou quase tudo, desde telecomunicações, geradoras de energia, até fabricante de aviões, como a Embraer (SA:EMBR3).
O mercado financeiro reproduzia esse quadro; 3 bancos de investimento dominavam as mesas de operações, o Banco Garantia, o Banco Icatu e o um recém-chegado Banco Pactual, fundado e erguido por ex-executivo do Banco Garantia, Luiz Cezar Fernandes.
George Soros, através de seu fundo "Quantum", era uma parte infinitesimal de todo o bolo, com suas aplicações no Banco Pactual. Portanto, os níveis de complexidade, relações, inter-relações, a troca com o mundo externo, seja por capitais e/ou investimentos, eram nulos, quando não ridiculamente baixos.
Por consequência, os impactos, quando pensados ou previstos, não permitiam grandes distensionamentos; talvez um susto aqui, outro ali.
Falamos de 1992... antes do Plano Real, e com toda a teia montada e relacionada no início do texto. Estamos em 2016...
O Brasil mudou muito de lá pra cá... Podemos dizer que temos um "Brasil antes do Plano Real" e um "Brasil depois do Plano Real". O país modernizou-se, abriu sua economia, globalizou-se, pra usarmos uma "expressão comum", executou privatizações por vários setores, atraiu grandes investimentos, diretos ou não, por meio de fundos ou não, pessoas físicas e jurídicas, pequenas e grandes empresas.
O Mercado financeiro, por sua vez, volta a refletir a mudança; as mesas de operações cresceram, não temos "apenas" Garantia, Icatu e Pactual; temos o brasileiro BTG Pactual (SA:BBTG11) e tantos outros estrangeiros olhando e operando por aqui. O capital externo entra e sai do Brasil a reboque de mínimos movimentos promovidos nos Bancos Centrais mundo afora. Assim, a presença e a gestação de bolhas de ativos ao longo dos últimos anos são tão ou mais fortes do que bolhas de ativos vistas nas economias maduras; agora, a despeito de nos caracterizarmos como "emergentes", somos vulneráveis a quaisquer movimentos de capital.
Dentro desse contexto, o quadro político-econômico e social em que nos encontramos Daqui a poucos dias, o país enfrentará uma votação do Impeachment da atual Presidente da República, Dilma Rousseff. Impedida ou não, o que acontecerá depois?
Revejam os parágrafos acima, reflexos dos 2 momentos; 1992 e o atual. O foco foi muito mais econômico.
E é por aí que começamos a revisá-lo O país está parado, completamente parado nos últimos meses, em particular, nos últimos 40-50 dias, período em que se intensificou a dinâmica da votação do Impeachment. As variáveis levantadas, explicita ou implicitamente ao longo do texto, pioraram, e muito o quadro econômico. Tudo isso, montado sobre uma estrutura bem mais complexa do que 1992.
E, depois do Impeachment? Passando ou não...
Do ponto de vista político, o que esperar no "D+1”? Fala-se hoje que não temos um Líder na Oposição que "lidere" ou "coisa assim" um momento "Pós-Impeachment". Hummmm...é mesmo ? Em 1992 existia? Talvez Lula, um "ex-operário" na liderança de um partido que já se mostrava forte. Curiosamente, coube a quem liderar o país para uma transformação? Coube ao sociólogo Fernando Henrique Cardoso, que estava no Ministério das Relações Exteriores, e de forma inesperada foi levado para o Ministério da Fazenda. Dali, mesmo sem ser o principal nome do PSDB, partido que, assim como o PT, já se mostrava forte, Fernando Henrique Cardosos liderou e chancelou um grupo de economistas na formulação e criação do Plano Real, que acabou levando-o a Presidência da República em 1995. O que pesa aqui, no quesito "política", não é o nome em si; nomes e lideranças são construídos; o problema principal, no âmbito político, é que em 1992, tínhamos pouco mais 2 anos até novas eleições. Agora, temos 6 meses a mais...
E, pra piorar, o partido do governo, não um "partido qualquer"; "morto" ou não, tem em suas mãos os "ditos movimentos sociais"; muito diferente do que 1992; ali, toda essa "teia" estava do lado do Impeachment Como agiriam PT, suas conexões e os "ditos movimentos sociais" após o Impeachment? Tal característica molda, além da variável política, o "social”.
Mais uma vez, o "2016" é muito mais complexo do que "1992".
Chegamos ao Bovespa... O rali, visto nos últimos 3 meses, quando o Bovespa saiu de 37.000 para a faixa de 52.200, tocado semana retrasada, se sustenta? Tem fundamento? Tem consistência?
Um impeachment, depois de tudo o que foi dito acima, dará mais "gás" ao índice, ou tudo que foi feito até agora apenas recalibrou alguns exageros, sejam em commodities, reflexo do exterior, sejam em setores internos?
Tecnicamente falando, apenas o Bovespa recalibrou ativos excessivamente sobrevendidos, pelos mais variados instrumentos e rastreadores gráficos, ou irá subir mais ainda?
Destacarei 2 gráficos que podem nos servir de alguma bússola.
O primeiro, que cobre 5 anos, mostra a faixa de 52.500 muito forte e um divisor extremamente importante. Também mostra uma LTB passando ali por volta de 53.500.
O segundo gráfico, de 12 anos, mostra uma LTB mais longa, passando ali por volta de 58.000....e mais uma vez, a indicação do poderoso divisor de 52.500.
Bovespa, Semanal, escala logarítmica, período 5 anos
Bovespa, Semanal, escala logarítmica, período 12 anos
Além desses 2 gráficos, algo me diz que a "tabela períódica" abaixo descrita está sobre as mesas de operações de vários bancos...
Pra vender ou comprar? Até onde? 42.500 ou 25.000?