Por Luciano Costa e Rodrigo Viga Gaier
SÃO PAULO/RIO DE JANEIRO (Reuters) - A Argentina voltou a pedir ao Brasil um aumento na vazão da hidrelétrica de Itaipu com o objetivo ajudar na elevação do nível do rio Paraná, mesmo após acordo na semana passada entre os governos dos dois países para ampliar o fluxo de água, disseram à Reuters duas fontes próximas do assunto.
Uma forte seca que atinge a região Sul do Brasil e a Argentina levou o importante rio aos menores níveis em uma década na região do porto de Rosario, responsável pelo escoamento da maior parte das exportações de grãos do país vizinho.
O baixo volume de água aumenta custos para os argentinos ao reduzir a quantidade de milho ou soja que cada navio pode levar.
A Argentina, que está em meio à colheita de soja e milho, conseguiu convencer o Brasil a aumentar a vazão de Itaipu para acima de 7.000 metros cúbicos por segundo, segundo comunicado do Ministério de Relações Exteriores do país na sexta-feira passada, mas a manobra não foi suficiente para aliviar os efeitos da seca e as conversas continuam, segundo as fontes.
"Vai haver reunião amanhã (sexta-feira) entre Ministério de Relações Exteriores, Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) e Argentina para tratar do tema", disse uma das fontes, admitindo que "sempre se pode fazer mais".
Antes do acordo inicial entre os países, a usina de Itaipu operava com defluência de água média de 6.000 m³/s, volume que está agora em cerca de 8.000 m³/s, acrescentou a fonte, que falou sob a condição de anonimato.
Mas um eventual novo aumento de vazão precisa ser discutido junto ao Paraguai, sócio do Brasil na usina binacional, uma vez que iria contra a atual política de operação definida pelos dois países para Itaipu, disse uma segunda fonte, destacando que a estratégia atual é recuperar capacidade de armazenamento.
"Isso permite uma defluência melhor para a Argentina. Não é o que eles queriam. Mas é o acordo com o Paraguai", disse a fonte, que também falou sob anonimato.
Para o doutor em recursos hídricos Carlos Tucci, da Rhama Consultoria, o tema é complexo e os países deveriam ter iniciado as conversas antes --a seca que afeta o rio Paraná tem sido registrada desde meados de 2019.
"Existe essa incerteza... tem que avaliar, a jusante (em direção à foz do rio), se essas vazões que o Brasil poderia soltar realmente fariam a diferença, e o quanto eles (Argentina) precisariam. Não é um processo simples de tomar decisão", afirmou.
"É uma análise que tinha que ter sido feita antes, estabelecer critérios. Agora, na estiagem, fazer esse estudo, não dá tempo", acrescentou.
Uma fonte do Ministério das Relações Exteriores da Argentina admitiu que apesar do acordo com os brasileiros na semana passada a situação do rio Paraná segue como um problema.
"O acordo com o Brasil está sendo totalmente cumprido, mas a seca é muito forte", afirmou a fonte.
A Argentina deve produzir 49,5 milhões de toneladas de soja nesta temporada e 50 milhões de toneladas de milho, sendo que quase metade da oleaginosa já foi colhida, enquanto os trabalhos no milho avançaram 34,5% até o momento.
Entre técnicos do setor de energia do Brasil, há alguma resistência às manobras para aumento da vazão de Itaipu devido à preocupação em recuperar os níveis dos reservatórios do país.
Procurado, o Itamaraty não respondeu de imediato a um pedido de comentário. O ONS também não comentou, em meio a feriado no Rio de Janeiro, onde fica a sede da instituição.
(Reportagem adicional de Hugh Bronstein em Buenos Aires)