As consequências político-econômicas do segundo governo Trump

Publicado 20.01.2025, 12:52
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O republicano Donald Trump retorna à Casa Branca sob a expectativa de que suas políticas devem levar uma grande transformação nos EUA, na economia internacional e na geopolítica. O Brasil, que não é uma ilha, pode ser impactado direta ou indiretamente por essas medidas.

As principais medidas de Trump com impacto nas economias americanas são as tarifas sobre produtos importados, a deportação em massa de imigrantes ilegais, o corte de impostos corporativos, a desregulamentação e transformações da máquina governamental. O objetivo é, na avaliação do republicano e sua equipe, fortalecer a economia dos EUA, com geração de empregos e reindustrialização do país, e ressuscitar a ordem unipolar sob égide dos EUA nas relações internacionais.

Tarifas

Duas vertentes serão disputadas para o uso das tarifas sob o governo Trump. Uma ala defende que elas sejam apenas um instrumento de retórica para pressionar outros países, independentemente de aliado ou adversário, para atingir outros objetivos econômicos e geopolíticos americanos. Estão entre os objetivos não-comercias para o uso de tarifas:

  1. Controle do fluxo migratório para os EUA.
  2. Pressão contra entrada de drogas ou matérias-primas de entorpecentes sintéticos no país.
  3. Reafirmar a posição do dólar como a moeda de reserva global.
  4. Posicionamento estratégico no Ártico com o derretimento das calotas polares.
  5. Deter a influência de outras potências nos países da América Latina, reafirmando a Doutrina Monroe ante a influência da China na região.
  6. Defesa das empresas dos EUA no exterior
  7. Transferência de riqueza

Os pontos 1 e 2 são diretamente ligados ao México e ao Canadá, país fronteiriços com os quais os EUA têm um acordo comercial assinado pelo próprio Trump em seu primeiro mandato. O ponto 3 é um recado para os países dos Brics, que já manifestaram interesse e a organização de um grupo de trabalho para a substituição do dólar nas trocas comerciais e nos investimentos entre os países do bloco, entre os quais o Brasil, que preside o bloco em 2025 e colocou a substituição do dólar como prioridade nos grupos de trabalho de sua presidência no bloco.

O ponto 4 envolve a ameaça de anexar a Groenlândia e o Canadá à soberania dos EUA. O aquecimento global está levando ao derretimento das calotas polares, o que vai facilitar a navegação com o encurtamento de distância para o transporte marítimo. Além disso, a região é rica em recursos minerais essenciais para a matriz de produção e energética atual e de transição energética.

O ponto 5 é colocar os países da América Latina na zona de influência americana. Isso significa que pode realizar, por exemplo, negócios com chineses, porém sem a contrapartida de apoio ao país asiático em fóruns internacionais e na governança global. O ponto 6 está relacionado ao uso da inteligência artificial e o impedimento de regulação de redes sociais na União Europeia e no Brasil.

Enquanto o ponto 7 é o uso de tarifas para aumentar a arrecadação americana, pois há a possibilidade de o país sancionado reduzir o preço das exportações e, assim, não levar consequência ao mercado consumidor. Essa explicação foi apresentada pelo futuro secretário do Tesouro, Scott Bessentt, em sua sabatina na semana passada no Congresso.

Outra vertente para o uso das tarifas é o seu uso para o retorno da produção industrial aos EUA atualmente encontrada em outros países, a maioria na Ásia, gerando emprego na maior economia do mudo. As tarifas serão utilizadas concomitantemente para os dois objetivos, mas um deles prevalecerá.

De qualquer forma, há riscos nessas estratégias, como reação dos países tarifados. A União Europeia já está estudando quais produtos americanos e de quais regiões podem ser tarifados, buscando retaliar regiões que deram vitória a Trump na eleição de 2024.

Fora que há sempre o receio de que as tarifas virem uma guerra comercial generalizada, o que comprometeria o crescimento da economia mundial e do comércio internacional, base da ordem global dos EUA desde o pós-guerra e da atual globalização. Os analistas de relações internacionais e historiadores econômicos vão fatalmente associar essa consequência com a guerra comercial dos anos 1930, após a Grande Depressão, que precedeu a Segunda Guerra Mundial.

Porém, há outro exemplo histórico a ser citado. O governo de Ronald Reagan, nos anos 1980, também foi uma administração republicano que modelou a ordem global no período. Uma política fiscal expansionista e monetária restritiva fortaleceu o dólar, reduzindo a competitividade da economia dos EUA contra produtos importados, especialmente do Japão e da Alemanha. Para evitar uma desvalorização unilateral do dólar, o governo Reagan levou à assinatura do Acordo de Plaza em 1985, quando as 5 principais economias industrializadas no período valorizaram suas moedas após negociações com Washington, dando um respiro à economia dos EUA no período.

Impacto econômico da imigração

Voltando ao presente, a perspectiva do mercado é de continuidade do fortalecimento do dólar sob o governo devido à adoção de tarifas, ao corte de impostos corporativos e desregulamentação para incentivo de setores tradicionais, como o petrolífero. O que vai impactar a condução da política monetária do Federal Reserve (Fed, banco central dos EUA), o que pode manter a taxa de juros no patamar atual ou até elevá-lo se as tarifas forem aplicadas. Por enquanto, a perspectiva do mercado é de que as tarifas sejam usadas como arma retórica e terão pouca aplicabilidade, o que pode contribuir para que o Fed reduza a taxa de juros em 1 ou 2 vezes em 2025, conforme a mediana das projeções das autoridades do Fed apresentadas em dezembro.

Outro ponto de pressão inflacionária é a política de deportação em massa de imigrantes ilegais, além de risco de endurecimento das regras de imigração legal. A imigração ilegal provê trabalhadores para setores intensivos em mão-de-obra, como no setor rural e no setor de alimentação fora de casa. O mercado espera um meio termo, com a deportação de imigrantes ilegais presos ou com passagem na política e o endurecimento de entrada com maior vigilância na fronteira, especialmente com o México. Dessa forma, os imigrantes ilegais que tenham trabalho, sem “ficha suja”, poderia continuar nos EUA.

Consequências para o Brasil

Tomando por base o que ocorreu durante o primeiro mandato de Trump, o agronegócio brasileiro pode ser beneficiado. A adoção de tarifas de produtos chineses entre 2017 e 2020 elevou as compras chinesas de soja e milho do Brasil. Mas, há risco de o agro não ser beneficiado caso Trump consiga um acordo similar ao que obteve no último ano de seu mandato, mas que foi atrapalhado pela pandemia: o compromisso chinês de comprar mais produtos americanos, entre os quais as commodities agrícolas.

Trump e Xi demonstraram na última sexta-feira um diálogo pacífico. Porém, o enfoque era a questão da continuidade da rede social chinesa TikTok continuar operando nos EUA. Mas, nada impede que esse seja a primeira aproximação de construção de um novo alinhamento geopolítico entre China e EUA.

Em relação ao comércio bilateral, o Brasil bateu recorde de exportações aos EUA, totalizando US$ 40,3 bilhões, um crescimento de 9,2% em relação ao ano anterior, segundo o Monitor do Comércio Brasil-EUA da Amcham Brasil. As exportações de bens industriais brasileiros para a maior economia do mundo atingiram US$ 31,6 bilhões. É um fluxo comercial equilibrado, com pequeno superávit para os EUA.

Porém, isso não deve impedir o Brasil como alvo de sanções. Além do Brasil ser membro dos BRICS, que buscam uma alternativa ao dólar no comércio internacional, o país é um dos que buscam a regulamentação das redes sociais.

A presença de Elon Musk, dono do X, e a aproximação do Mark Zuckenberg, da Meta Platforms (NASDAQ:META) (dona do Facebook, Instagram e Whatsapp) com Trump podem exercer pressão para que o Brasil não regulamente as redes sociais sob a ameaça de imposição de tarifas, especialmente sobre os produtos de maior valor agregado.

Há um componente político nessa questão: o ex-presidente Jair Bolsonaro é aliado de Trump, e os EUA podem exercer alguma pressão para que o ex-presidente volte a se tornar elegível, além de buscar a limitação do trabalho do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Alexandre de Moraes, nas investigações nos inquéritos das fake news e dos ataques de 8 de janeiro em Brasília.

Por fim, a política do dólar forte pode impactar negativamente o real e o desempenho do mercado de ações no Brasil. A tendência é de alta do dólar em relação ao real, e a continuidade de uma economia forte e em crescimento nos EUA, com uma política de juros elevados pelo Fed, deve concentrar o fluxo financeiro aos EUA e menor dispersão de alocação de capital para os outros países, inclusive o Brasil.

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