Por Roberto Samora
SÃO PAULO (Reuters) - O Conselho Nacional de Política Energética (CNPE) decidiu nesta segunda-feira que a mistura de biodiesel no diesel será mantida em 10% até 31 de março de 2023, e que o Brasil poderá adotar um percentual maior do biocombustível, de 15%, a partir de abril, de acordo com nota do Ministério de Minas e Energia.
A definição da mistura maior B15 ficou para o próximo governo, acrescentou o ministério.
O CNPE decidiu que a partir de abril poderá vigorar o teor previsto na resolução CNPE de outubro de 2018, que dispõe sobre a evolução da adição obrigatória de biodiesel, caso não haja nova manifestação do conselho.
O órgão considerou ainda que a adição obrigatória de biodiesel ao óleo diesel comercializado ao consumidor final admite qualquer rota tecnológica de produção, o que pode incluir o combustível R5 da Petrobras (BVMF:PETR4), um produto obtido pelo coprocessamento de diesel com óleo vegetal, que foi testado numa proporção de 95% e 5%, respectivamente.
Segundo o ministério, a adição de combustíveis obtidos por outras rotas tecnológicas, contudo, precisa da regulamentação pela Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP).
As decisões geraram protestos da indústria de biodiesel, produzido majoritariamente com óleo de soja e gorduras animais no Brasil.
O produto R5 da Petrobras poderia ser um concorrente do biodiesel, o que ameaça a indústria do biocombustível, que considera o combustível testado pela estatal como um outro tipo de produto que não poderia ser elegível à mistura.
"Não é biocombustível", disse o diretor superintendente da Ubrabio, Donizete Tokarski, à Reuters, ao comentar a possibilidade de o R5 vir ser adotado no país.
Procurada, a Petrobras não comentou o assunto imediatamente. A empresa tem afirmado que seu produto é eficaz, reduz emissões por ter um conteúdo renovável e tem composição química semelhante à do diesel derivado do petróleo.
Tokarski disse ainda confiar que o Brasil possa adotar o B15 a partir de abril, mas que o ideal seria que a mistura no início de março fosse de 14%, para não haver uma mudança tão brusca no percentual adotado.
A demanda de soja no Brasil para a produção de óleo para biodiesel poderia crescer cerca de 50% em 2023 ante 2022, caso o cronograma de evolução da mistura do biocombustível, com um B15, seja retomado, segundo a Associação dos Produtores de Biocombustíveis do Brasil (Aprobio).
O total de soja demandada para a produção de óleo para biodiesel subiria para cerca de 30 milhões de toneladas em 2023, na hipótese de um B15 na maior parte do ano.
No Brasil, cerca de 70% do biodiesel tem na soja a sua matéria-prima. Caso a demanda interna cresça para produção de óleo para o biocombustível, é provável que o setor reduza exportações do produto processado, que foram fortes em 2022, diante de uma mistura menor.
Para o presidente do Conselho de Administração da associação Aprobio, Francisco Turra, uma manutenção de B10 e a inclusão do diesel coprocessado no mandato da mistura poderão representar "um golpe de morte em todo o setor e para toda a cadeia produtiva de biodiesel".
Assim como a Ubrabio, Turra lamentou uma decisão tomada por um governo em final de mandato, que havia sinalizado que uma posição sobre a mistura do biodiesel seria discutida com a equipe de transição.
"A improvável inclusão de diesel coprocessado é outra questão que carece de suporte técnico, dado que a própria Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) não considera o produto como biocombustível", comentou.
Caso a decisão se confirme, o setor tratará com o governo eleito uma forma de reverter a decisão pelo impacto de "dimensões avassaladoras" sobre o setor de biodiesel e toda a cadeia produtiva.
(Por Roberto Samora; com reportagem adicional de Marta Nogueira)