Por Letícia Fucuchima
SÃO PAULO (Reuters) - A Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE) deve começar a testar, já no início de 2023, novas regras relacionadas à segurança do mercado livre de energia, em evolução vista como importante conforme as negociações no chamado "ACL" crescem e se aproximam do mercado financeiro.
Em coletiva de imprensa nesta segunda-feira, o presidente do conselho de administração da CCEE, Rui Altieri, disse que a agência reguladora Aneel deve pautar, em sua primeira reunião de 2023, a abertura de uma consulta pública sobre regras de salvaguardas financeiras e monitoramento prudencial do ACL.
"A expectativa é abrir a consulta pública... mas já autorizar que a CCEE faça uma operação sombra", disse Altieri, acrescentando que o período de teste segue a lógica adotada alguns anos atrás na transição do cálculo do preço de curto prazo (PLD) semanal para o horário.
Deverão ser implementados, a partir do ano que vem, mecanismos para mitigar eventuais perdas decorrentes de inadimplência na comercialização de energia no mercado de curto prazo (MCP).
Um dos exemplos é o aporte de garantias por parte dos agentes que comercializam energia. Também está prevista a criação de um fundo financeiro, a ser gerido pela CCEE, cujos recursos poderão ser utilizados em caso de inadimplência. Haverá ainda um "monitoramento prudencial", com implementação de exigências proporcionais ao risco representado por cada agente.
"A ideia é... aproveitar esse ano para aprender e também tirar as dúvidas e enfrentar problemas... O espelho que procuramos é o mercado financeiro, tentar trazer ao mercado de energia elétrica tudo de bom que tem no mercado financeiro", acrescentou Altieri.
A segurança do ACL entrou no foco das atenções da CCEE há alguns anos, dado o avanço do setor na negociação de produtos financeiros atrelados à energia, como derivativos. A ideia é evitar problemas de "default" no mercado de entrega física de energia --no qual a CCEE atua--, o que poderia impactar também obrigações firmadas no âmbito do mercado financeiro.
ABERTURA DE MERCADO E SOBRECONTRATAÇÃO
A CCEE já está se preparando para a abertura do mercado de livre de energia para todos os consumidores de alta tensão a partir de janeiro de 2024, e vê como inexorável a ampliação da medida para o restante dos consumidores, ainda que isso esteja agora em compasso de espera devido à transição entre governos.
Segundo Altieri, cerca de 170 mil consumidores de alta tensão, como pequenas e médias empresas, estão aptos a aderir ao ACL a partir de 2024. No entanto, 35% desse total não poderão efetuar a migração pois já utilizam sistemas de geração distribuída de energia --telhados solares, por exemplo.
Para que o mercado livre possa receber essa nova onda de migrações, a CCEE considera necessário avançar com pautas como o fortalecimento do agente varejista --tipo de comercializadora que atenderá consumidores de menor porte-- e a simplificação do sistema de faturamento das contas de luz.
Esse movimento de migração a partir de 2024 deverá ocorrer de forma lenta, prevê Altieri, de forma que as distribuidoras terão tempo de se prepararem e não devem sofrer com grandes desequilíbrios por sobrecontratação, avaliou.
A CCEE calcula que as distribuidoras terão sobras de energia nos portfólios de contratos até 2025, principalmente em razão da previsão de baixo crescimento do mercado regulado de energia nos próximos anos.
A situação de sobrecontratação permanecerá mesmo com um volume grande de energia que será descontratado nos próximos anos, em medidas como a descotização das hidrelétricas da Eletrobras (BVMF:ELET3).
Conforme a última revisão das projeções feitas em conjunto por CCEE, ONS e EPE, a carga de energia elétrica deverá crescer 2,7% em 2023, considerando um incremento do PIB de 0,7%, após 2,0% previstos para 2022. Para o período 2023-2027, estima-se alta de 3,4%, em média, por ano, com base em um avanço médio anual de 2,2% no PIB.
NOVOS NEGÓCIOS EM ENERGIA
Em sua agenda de temas estratégicos para 2023, a CCEE incluiu ainda a pauta de "novos negócios", a fim de estudar como aproveitar novos recursos e tecnologias no setor elétrico. São exemplos disso a regulamentação de serviços de armazenamento de energia e potência de usinas, bem como a aproximação dos mercados livre e de geração de distribuída.
"Será que a gente consegue fazer uma proposta de interligação da GD com o mercado livre? Podemos fazer, mas tem muitos desafios: deixar de ter o subsidio da rede, a questão tributária", disse Altieri.
(Por Letícia Fucuchima)