Por Lisandra Paraguassu e Roberto Samora
BRASÍLIA/SÃO PAULO (Reuters) - O governo federal está preparando uma medida provisória para autorizar a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) a importar 1 milhão de toneladas de arroz com o objetivo de evitar impactos das chuvas excessivas no Rio Grande do Sul nos preços do cereal, já que muitas lavouras do Estado foram atingidas por enchentes.
"A Conab vai buscar o arroz no mercado internacional", disse o ministro da Agricultura, Carlos Fávaro, em entrevista a jornalistas após reunião no Palácio do Planalto.
A medida extraordinária ocorre mediante os enormes estragos causados pelas chuvas no Rio Grande do Sul, Estado que normalmente responde por cerca de 70% da produção nacional de arroz. Não há notícias de compras da estatal Conab no mercado internacional de grãos na história recente no país.
Mais cedo, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva havia mencionado preocupações com a inflação, diante da perda de produção no Estado. "Portanto, se for o caso para equilibrar a produção, a gente vai ter que importar arroz e feijão para que a gente coloque na mesa do povo brasileiro um preço compatível com aquilo que ele ganha."
Segundo Fávaro, a ideia inicial é a importação de 200 mil toneladas. Se o preço estabilizar, o governo suspenderá as compras externas. O ministro não mencionou o volume de recursos necessários.
Os preços do arroz posto nas indústrias do Rio Grande do Sul tiveram poucas oscilações desde a ocorrência das enchentes, na semana passada, com a saca de 50 kg sendo cotada a 106,74 reais na segunda-feira, conforme o indicador Cepea/Irga-RS.
Segundo o consultor privado Carlos Cogo, os negócios estão paralisados em meio às enchentes, o que explica a relativa estabilidade dos preços. No entanto, ele ressaltou que os preços devem subir quando as perdas ficarem mais claras.
"Isso não é imediato. Está tudo paralisado. Arroz é o primeiro que vai explodir o preço", disse Cogo à Reuters.
O Estado havia colhido quase 80% da área plantada com arroz antes das chuvas, segundo dados do Instituto Rio Grandense do Arroz (Irga), uma indicação inicial de que as perdas seriam limitadas ao volume não colhido.
Mas o ministro da Agricultura lembrou que as inundações também atingiram silos, o que resultará em mais perdas, além das áreas que não tinham sido colhidas, especialmente aquelas cultivadas nas beira dos rios, as mais afetadas pelas enchentes.
A produção gaúcha de arroz estava estimada antes das enchentes em 7,5 milhões de toneladas, enquanto a colheita brasileira como um todo estava prevista em pouco mais de 10 milhões de toneladas.
"Geralmente são silos que ficam perto de rios para a questão fluvial, e são grandes silos, então é expressivo, mas realmente é muito difícil de quantificar isso", disse o presidente da Federação das Cooperativas Agropecuárias do Estado do Rio Grande do Sul (FecoAgro/RS), Paulo Pires.
Já o presidente da Federação da Agricultura do Estado do Rio Grande do Sul (Farsul), Gedeão Silveira Pereira, qualificou a questão dos silos como "pontual", citando problemas na região central do Estado, além da área litorânea.
Além de silos e lavouras, as inundações mataram animais em granjas, paralisaram abates de suínos e aves em algumas regiões e deixaram máquinas e tratores debaixo d'água. Também prejudicaram a infraestrutura do Estado, ameaçando a oferta de grãos para exportação nos portos, já que a ferrovias e estradas estão bloqueadas. Há ainda problema no abastecimento de combustíveis.
PACOTE DE AJUDA
Conforme o ministro da Agricultura, ao fazer importações, o governo não pensa em concorrer com produtores de arroz do Rio Grande do Sul. Ele lembrou que mais de 70% do cereal gaúcho já havia sido colhido antes das chuvas, mas algumas lavouras serão perdidas, enquanto silos também foram afetados pelas enchentes, que deixaram ao menos 95 mortos e 131 desaparecidos.
Fávaro disse ainda que os próprios produtores reconhecem que não têm condições de atender a demanda devido a dificuldades logísticas no Estado, o que explica o movimento em direção à importação.
Ele disse ainda que a ideia do governo é importar arroz pronto para consumo, já beneficiado.
Segundo o ministro, o Conselho Monetário Nacional (CMN) fará uma reunião extraordinária para apreciar um pedido de prorrogação por 90 dias dos débitos do setor agropecuário do Rio Grande do Sul.
O presidente da Farsul, que se reuniu mais cedo com o ministro, disse à Reuters que o socorro é importante para garantir a retomada do Rio Grande do Sul, importante produtor agropecuário.
"Se não arrumarmos uma recomposição para dívidas dos produtores, vai ter influência nas próximas safras, não somente na próxima", disse ele, lembrando que o Estado deixou de colher, por conta da seca, algo em torno de 30 milhões de toneladas nas últimas duas safras, especialmente soja.
Na safra atual, o Estado caminhava para uma colheira recorde de cerca de 22 milhões de toneladas de soja. Até as inundações, havia colhido cerca de 75% da área, e há incerteza sobre quais poderão ser salvas. Para o dirigente da Farsul, uma parte ainda poderá ser colhida. Ele evitou fazer estimativas.
"Tem agricultores que perderam máquinas e equipamentos, animais. Por isso, precisa realmente de recurso muito vigoroso do governo, com prazo longo e juro baixo, para poder recompor a vida dessas pessoas, para que elas possam retornar ao campo."
(Reportagem de Lisandra Paraguassu, em Brasília, e Roberto Samora, em São Paulo; Edição de Pedro Fonseca)