Por Lisandra Paraguassu
BRASÍLIA (Reuters) -O Ministério da Saúde determinou o cancelamento definitivo do contrato com a Precisa Medicamentos para a compra de 20 milhões de doses da vacina Covaxin, do laboratório indiano Bharat Biotech, depois que auditoria da Controladoria-Geral da União demonstrou irregularidades em documentos apresentados pela Precisa na negociação com o ministério.
"O contrato, independentemente de qualquer outro ponto, ele já perdeu o objeto e o Ministério da Saúde apenas aguarda o posicionamento da Precisa para considerar esse assunto Bharat Biotech encerrado", disse Queiroga em entrevista coletiva, acrescentando que a vacina não teve ainda autorização emergencial para uso no país e os prazos de entrega não foram cumpridos.
Não há previsão de multa para o cancelamento do acordo.
De acordo com o ministro Wagner Rosário, da CGU, foram detectadas suspeita de fraudes em dois documentos. Um deles, uma suposta procuração da Bharat Biotech autorizando a Precisa a completar a negociação e venda do imunizante ao governo federal, exigido pelo ministério.
O segundo, uma "declaração de inexistência de fatos impeditivos", outro documento exigido por lei para que contratos sejam fechados com a União.
De acordo com Wagner Rosário, os técnicos da CGU encontraram indícios de que os dois documentos foram forjados. Ambos tinham cabeçalhos e pé em inglês, e assinatura do presidente da Bharat Biotech, mas o texto em português. A auditoria verificou que o documento pode ser uma colagem digital do texto em outro enviado pelo laboratório indiano.
A Precisa informou a CGU que não possuía o documento original, apenas o digital, enquanto a Bharat Biotech negou ter emitido qualquer um dos dois. Sem eles, a Precisa não poderia ter dado continuidade às negociações com o governo brasileiro.
No dia 23 de julho, depois de procurada pela CGU, a Bharat Biotech informou, em nota, não reconhecer os documentos apresentados e rompeu o acordo com a Precisa Medicamentos.
A CGU nega, ainda, irregularidades nas invoices que previam pagamento adiantado de 4 milhões de doses. De acordo com Rosário, os erros foram corrigidos e as invoices sequer foram encaminhadas para o departamento de pagamentos do Ministério da Saúde.
O ministro disse ainda que as datas das emissões das invoices estão sendo investigadas. De acordo com a denúncia levada pelo deputado Luis Miranda (DEM-DF) e seu irmão, o servidor do ministério Luis Ricardo Miranda, ao presidente Jair Bolsonaro, a invoice que previa o pagamento adiantado das vacinas, teria sido emitido em 18 de março. No entanto, Emanuela Medrades, diretora da Precisa, alega que o documento é de 22 de março. Os irmãos Miranda levaram a denúncia a Bolsonaro em 20 de março.
"O que foi afirmado pelo deputado Luis Miranda não foi confirmado, porque não temos certeza ainda se essas invoices foram encaminhadas no dia 18 ou no dia 22. Esses documentos constavam em anexo de e-mail que estava em um dropbox e estamos fazendo uma perícia para verificar se foi enviado ou não", disse Rosário. "Caso não tenha sido enviado, inclusive a ida para se levar problemas (ao presidente) pode ser toda uma falsidade."
O governo chegou a pedir à Polícia Federal que investigue Luis Miranda por denunciação caluniosa, tentando preservar o presidente do crime de prevaricação. Isso porque Bolsonaro admitiu que recebeu a denúncia de Miranda, mas disse que passou ao então ministro da Saúde Eduardo Pazuello, e não à PF ou CGU para que investigassem.
Rosário disse ainda que a auditoria da CGU não encontrou indícios de sobrepreço no contrato para compra da Covaxin, apesar de a indiana ser a mais cara dos imunizantes negociados pelo governo federal.
"Tivemos acesso à gravação e reunião e não existe em qualquer momento proposta de preço, apenas oferta de imunizante que não tinha preço fechado e esperavam que ficaria em 10 dólares. Posteriormente, em reunião em 2021, a empresa informa que os preços fechados eram de 15 dólares", disse o ministro.
Rosário afirmou ainda que a CGU fez um levantamento dos preços praticados pela Bharat Biotech em outros locais do mundo e os valores por dose estão entre 13 e 18 dólares.
Em nota, a defesa da Precisa afirma que "a auditoria da CGU conclui aquilo que a Precisa Medicamentos vem reiteradamente afirmando à CPI, Polícia Federal, Tribunal de Contas da União e à imprensa: a contratação foi regular, atendeu ao interesse público, sem sobrepreço e sem qualquer irregularidade nas invoices".
"A respeito dos documentos confeccionados com colagem, como citado pelo ministro, é importante esclarecer que uma perícia técnica já apontou que a autora daqueles documentos é a empresa Envixia, parceira do laboratório Bhrarat Biotech e não a Precisa Medicamentos, que apenas recebeu o referido documento", afirmam os advogados.
"Este laudo já foi entregue a CPI e demais autoridades públicas e a Precisa Medicamentos destaca seu manifesto interesse em uma perícia oficial da Polícia Federal, para que não reste dúvidas da lisura de toda a contratação e postura da empresa ao longo do processo", acrescenta a defesa.
(Reportagem de Lisandra ParaguassuEdição de Alexandre Caverni)