No momento em que a disposição do presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, sobre a agenda de revisão de gastos é colocada em dúvida pelo mercado financeiro, o secretário do Tesouro Nacional, Rogério Ceron, buscou fazer uma diferenciação entre o que seria uma política de corte de gastos - "chavão" criticado pelo petista - e uma política que observe a dinâmica de crescimento das despesas e que adeque esse avanço às regras fiscais. "Não vi nada novo nas falas do presidente. Estamos no estágio de apresentar a Lula o diagnóstico das despesas públicas. Não foi feita nenhuma declaração com novidade em relação ao que está sendo discutido", comentou Ceron em coletiva de imprensa sobre os dados do Tesouro de maio.
Questionado sobre as declarações do presidente, o secretário do Tesouro afirmou que o olhar da equipe econômica está voltado para garantir que a dinâmica de crescimento das despesas do governo seja compatível com o arcabouço fiscal no médio e no longo prazo. Isso não seria a mesma coisa que eliminar, por "corte", um programa social, disse Ceron, num esforço de suavizar o discurso sobre a revisão de gastos, que enfrenta resistências da ala política do governo Lula.
"Posso diminuir o crescimento de um programa, para ele crescer a uma taxa X, não Y. Não estou cortando, mas fazendo crescer numa dinâmica confortável as regras. Isso é importante porque não é uma política fiscal econômica que busca Estado mínimo, mas uma política que vai equilibrar as demandas fiscais que são importantes para a responsabilidade fiscal. Por isso esses termos, de corte, fica no chavão, e atrapalham um debate mais sereno, de olhar dinâmica pelo lado de crescimento das despesas", respondeu Ceron.
Apoio 'irretocável'
O secretário do Tesouro Nacional afirmou que Lula tem dado apoio de forma "irretocável" para a agenda da equipe econômica de revisão de gastos. "Sinalizações são de total apoio à equipe, muitas vezes há interpretações sobre trechos das colocações... Mas digo que o presidente tem nos apoiado de forma irretocável", disse.
Ceron reconheceu que, no momento, surgiu no mercado um "elemento de dúvida" sobre a dinâmica de crescimento das despesas, mas afirmou que a área econômica vai mostrar que as regras fiscais serão cumpridas, e que as medidas necessárias para manter a trajetória de gastos aderente ao arcabouço fiscal serão adotadas.
"No início do ano passado, em vários momentos, falaram que medidas de receita não seriam aprovadas, não gerariam impacto, e no fim hoje estamos vendo que todo o conjunto de ações estão funcionando. É inegável que receitas estão recuperando de forma saudável, mostrando que tínhamos razão. Agora surge outro elemento de dúvida sobre a dinâmica das despesas, que também, com serenidade, vamos mostrando que elas vão ser cumpridas e vão manter dinâmica que permitam o cumprimento das regras pactuadas com a sociedade", respondeu Ceron, segundo quem o trabalho será de fazer com as expectativas sejam ancoradas.
Questionado se a preocupação do mercado sobre o atual cenário fiscal seria exagerada, Ceron disse que respeita as opiniões e o debate, mas pontuou também que as expectativas sobre o resultado primário e a trajetória da dívida pública sobre o PIB não pioraram nos últimos meses. "O que há de alguma forma existe é sentimento que se elevou riscos fiscais principalmente em relação a se estas dinâmicas de gasto vão permitir ficar dentro do limite de 2,5% de avanço das despesas. Nosso dever como equipe econômica é dar sinalizações de que essas dinâmicas serão observadas e seus limites rigorosamente cumpridos", disse.
Despesas antecipadas e crédito extra ao RS
O secretário do Tesouro Nacional disse que o crescimento das receitas em maio, que registraram avanço de 8,3%, está mantendo o ritmo de recuperação da base fiscal como "almejado" pela equipe econômica. Em contraponto, antecipações de despesas ajudaram a elevar o déficit no mês, que ficou em R$ 60,893 bilhões. As despesas em maio avançaram 14%.
Segundo Ceron, no mês, houve uma mudança no calendário de pagamentos da Previdência, que pesaram nos gastos, além um avanço importante no Benefício de Prestação Continuada (BPC), que cresceu 17,4% em maio, em relação ao mesmo período do ano passado.
Os créditos extraordinários para auxílio ao Rio Grande do Sul também aumentaram essa conta, com acréscimo de R$ 6,4 bilhões nas despesas. Novamente, Ceron chamou atenção também para o incremento do déficit previdenciário, que, disse, "merece atenção".
Em 12 meses, o déficit do governo central chega a R$ 268,4 bilhões, o que conta com a contaminação do pagamento de precatórios e de antecipações de pagamentos feitos no primeiro semestre. No ano até maio, o déficit acumulado foi de R$ 29,998 bilhões.
Segundo Ceron, desse valor, R$ 13 bilhões não são contabilizados para o cumprimento da meta do primário, por se tratarem de créditos extraordinários direcionados ao socorro do Rio Grande do Sul.