Por Camila Moreira
SÃO PAULO (Reuters) - O alto nível do desemprego no Brasil vai conter as pressões inflacionárias até 2019 mesmo com as expectativas de recuperação econômica, e contribuirá para que a alta dos preços permaneça em torno do centro da meta oficial neste período, possibilitando manter a trajetória de queda dos juros.
Segundo especialistas ouvidos pela Reuters, o principal canal que vai captar esse cenário é o setor de serviços, cuja inflação é mais atrelada ao poder aquisitivo da população, que verá o desemprego subir ainda mais neste ano, para acima 13 por cento, com recuperação lenta em seguida.
"Mesmo que exista retomada, a economia ainda opera muito abaixo da capacidade, o que significa que há muita máquina ociosa e mão de obra desempregada", avaliou o economista-chefe da Votorantim Corretora, Roberto Padovani. "Não vemos movimento forte o suficiente para o ciclo econômico gerar pressão inflacionária."
Depois de dois anos de contração, a expectativa é de que a atividade econômica se estabilize no meio de 2017, com o Produto Interno Bruto (PIB) crescendo 0,48 por cento neste ano e indo a 2,3 por cento em 2018, segundo a mais recente pesquisa Focus do Banco Central, que ouve semanalmente uma centena de economistas.
Apesar disso, especialistas calculam que o pico do desemprego acontecerá em meados deste ano, com a taxa medida pela Pnad Contínua chegando a até 13,5 por cento e com renda em queda. A partir daí, a tendência é de estabilização, com o país vendo melhora mais clara do mercado de trabalho somente a partir de 2018, mas ainda de forma bastante gradual.
O Brasil terminou 2016 com número recorde de mais de 12 milhões de pessoas sem trabalho e taxa de desemprego de 12 por cento.
LENTO CONSUMO
O excesso de mão de obra ociosa mantém os salários baixos e provoca retomada mais lenta do consumo, o que acaba ajudando a segurar a inflação. Em 2014, o consumo das famílias subiu 2,3 por cento, mas em 2015 já recuou 3,9 por cento. Ao longo do ano passado, foi caindo a cada trimestre e, no terceiro, a perda foi de 3,4 por cento sobre o mesmo período de 2015.
Os especialistas consultados preveem novo ano de fraqueza do consumo em 2017, apresentando retomada somente em 2018. Nas contas do economista do banco de Tokyo Mauricio Nakahodo, o consumo das famílias deve subir apenas 0,6 por cento este ano, com aumento de 2,5 por cento em 2018.
"Em um ambiente de taxa de desemprego muito alta, o trabalhador não tem poder de barganha para conseguir aumentos reais, a demanda do consumo não cresce de forma acelerada, e isso leva a menor pressão sobre os preços", explicou Nakahodo.
Diante desse cenário, o setor que mais sofre com a queda da demanda é o de serviços, segundo economistas, contribuindo para menor pressão inflacionária.
De 8,09 por cento em 2015, a inflação desse setor caiu a 6,5 por cento no ano passado e deve subir cerca de 5 por cento em 2017 e 2018, ou até menos, segundo economistas.
O movimento da inflação de serviços vem sendo acompanhado de perto pelo BC, que iniciou novo ciclo de afrouxamento monetário em outubro passado e já reduziu a Selic em 1,25 ponto percentual, a 13 por cento ao ano.
Esse comportamento mantém ancoradas as expectativas de alta de preços para os próximos anos próximas ou no centro da meta, que, para 2017 e 2018, é de 4,5 por cento pelo IPCA, com margem de 1,5 ponto percentual.
"A mensagem é que a inflação está rapidamente convergindo para o centro da meta, e boa parte disso é por causa do desemprego", destacou Padovani.
Na pesquisa Focus desta segunda-feira, a projeção para o IPCA já é de alta de 4,47 por cento.
O IPCA fechou 2016 a 6,29 por cento, dentro da meta oficial, indo a 5,35 por cento em janeiro no acumulado em 12 meses.