Por Marcela Ayres
BRASÍLIA (Reuters) - O ministro da Economia, Paulo Guedes, indicou nesta quinta-feira que o Banco Central seguirá transferindo resultados cambiais positivos ao Tesouro, investida que ajudaria o governo a fazer rolagem mais suave da dívida nos quatro primeiros meses de 2021.
Ao ser questionado em audiência no Congresso sobre o avanço da dívida bruta sobre o Produto Interno Bruto (PIB), ele afirmou que o governo não se conforma com esse nível --que fechará 2020 perto de 100%-- e que se esforçará para derrubá-lo.
"Vamos desinvestir, vamos privatizar, o Banco Central enquanto estiver fazendo transferências continua fazendo transferências, nós vamos desalavancar bancos públicos e nós vamos derrubar a dívida/PIB de novo com mais energia, com mais ímpeto, com mais determinação", afirmou.
Guedes justificou que houve aumento expressivo da dívida para fazer frente aos gastos com enfrentamento ao coronavírus. Segundo o ministro, sem o avanço das reformas, houve pressão sobre os juros num momento em que o Tesouro precisou elevar substancialmente os leilões de títulos públicos.
Na lei sobre as relações entre Tesouro e BC, de 2019, há uma brecha para esse repasse, mas desde que seja usado para pagamento de dívida.
A legislação estabelece que os ganhos cambiais devem em geral permanecer em uma reserva do BC para cobrir perdas futuras com a flutuação cambial, mas prevê a possibilidade de repasses pontuais ao Tesouro em caso de "severas restrições nas condições de liquidez" afetarem o refinanciamento da dívida pública.
"As reformas acabaram se atrasando um pouco e aí as necessidades de rolagem de dívida se acumularam muito e, às vezes, você vai ter que girar duas, três, quatro, cinco vezes o que você girava", disse Guedes.
"Num momento como esse, há uma pressão sobre os juros. Então em vez de você fazer essa pressão é melhor o Tesouro, então, receber algumas transferências e, com essas transferências, ele tira o pé do acelerador, não precisa rolar tanta dívida em tão curto espaço de tempo", acrescentou.
Segundo o ministro, a programação do governo é para que nos primeiros quatro meses de 2021 --quando vencem cerca de 600 bilhões de reais em títulos-- o Tesouro não fique "numa situação de dificuldade em que tenhamos que pagar qualquer juro, o juro que o mercado queira.
"Nós já estamos nos preparando exatamente para fazermos uma rolagem mais suave, mais tranquila da dívida", afirmou.
O ministro avaliou que os juros longos estão mais altos, mas ponderou que a situação seria revertida com a aprovação do pacto federativo. Por ora, o governo está encurtando o prazo da dívida, admitiu ele.
"Não é nada ainda que nos ameace, está longe ainda de ameaçar, mas são sinais desagradáveis que os mercados estão enviando para nós. É justamente pedindo atenção às reformas", disse.
No fim de agosto, o governo aprovou a transferência imediata ao Tesouro de 325 bilhões de reais do resultado cambial do BC do primeiro semestre, após um pedido de 445 bilhões de reais que mirava para dar tranquilidade à gestão de curto prazo da dívida pública.
Na decisão, o Conselho Monetário Nacional (CMN) deixou a porta aberta para que mais recursos sejam repassados ao Tesouro, ainda neste ano, "caso haja necessidade".
Na primeira metade do ano, o BC registrou saldo positivo de 478,5 bilhões de reais com operações cambiais, composto por ganho de 535,8 bilhões de reais com reservas internacionais, diante da alta do dólar frente ao real, e perda de 57,3 bilhões de reais com swaps cambiais. A maior parte desse ganho é contábil, já que as reservas não foram majoritariamente vendidas, mas apenas marcadas a mercado conforme o novo patamar do dólar.
No segundo semestre até o dia 23 de outubro, o resultado do BC com operações cambiais ficou positivo em 43,1 bilhões de reais, com ganho de 52,8 bilhões de reais com as reservas e perda de 9,7 bilhões de reais com swaps.