O presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) cobrou "cumplicidade" dos Poderes Legislativo e Judiciário no esforço de medidas para o corte de gastos e disse que vai vencer "outra vez" a "gana especulativa do mercado financeiro". O presidente afirmou que essa investida pelo ajuste fiscal deve contar com a participação do Congresso e de empresários.
"Se eu fizer um corte de gasto para diminuir a capacidade de investimento do Orçamento, a pergunta que eu faço é a seguinte: o Congresso vai aceitar reduzir as emendas de deputados e senadores para contribuir com o ajuste fiscal que eu vou fazer? Porque não é só tirar do orçamento do governo. Os empresários que vivem de subsídio do governo vão aceitar abrir mão um pouco de subsídio para a gente poder equilibrar a economia brasileira? Eu não sei se vão aceitar", afirmou Lula, em entrevista ao podcast PODK Liberados, apresentado pelos senadores Jorge Kajuru (PSB-GO) e Leila Barros (PDT-DF).
A entrevista foi gravada na última quarta-feira, 6, e exibida pela RedeTV! e no YouTube na noite de domingo, 10. Lula afirmou ainda que o tema é "uma responsabilidade do Poder Executivo" e "é uma responsabilidade do Poder Judiciário". "Quero saber se estão dispostos a fazer corte naquilo que é excessivo, se o Congresso está disposto também a fazer um corte nos gastos, porque aí fica uma parceria e uma cumplicidade para o bem, para que todo mundo faça o sacrifício necessário para a gente colocar a economia em ordem."
Mercado e ruralistas
Em outro tema de sua entrevista, o presidente voltou a provocar o mercado financeiro, afirmando que vencerá a "gana especulativa". "Eu vejo o mercado falar bobagem todo o dia. Sabe, eu não acredito nisso, não, porque eu já venci eles uma vez e vou vencer outra vez. A economia vai dar certo porque o povo está participando do crescimento desse país", declarou Lula.
"Conheço bem o discurso do mercado, conheço a gana especulativa do mercado, e eu às vezes acho que o mercado age com uma certa hipocrisia para tentar criar confusão na cabeça da sociedade", continuou o petista.
O presidente afirmou também que não é mais considerado o inimigo da bancada ruralista no Congresso. "Eles estão ficando mais sustentáveis e ambientalistas. Correm o risco de não conseguir vender sua soja, vender sua carne", afirmou o petista. "O agronegócio nunca recebeu tanto dinheiro quanto no governo desse 'comunista', que eles tratam assim", disse Lula.
Além da bancada ruralista, a relação com o Congresso como um todo melhorou, segundo o presidente. "Vocês nos ajudaram a chegar aonde chegamos", disse Lula, aos dois senadores. "Estamos aprovando tudo." Ele ressaltou ainda que vê como normal o fato de algumas propostas serem rejeitadas pelos parlamentares.
Venezuela e EUA
Ao falar de um tema que causa forte desgaste ao seu governo, o presidente procurou se esquivar e disse que a ditadura de Nicolás Maduro "é problema da Venezuela, não do Brasil". "Não posso ficar me preocupando em brigar com Nicarágua e Venezuela, preciso brigar para fazer esse país dar certo", afirmou o petista. Assim como a Venezuela, a Nicarágua vive uma ditadura, sob o comando de Daniel Ortega.
Lula disse ainda que não cabe a ele questionar a Suprema Corte de outro país, em referência à instância máxima do Judiciário da Venezuela, que avalizou a reeleição de Maduro nas eleições de julho, apesar das denúncias de fraude. "Quero que a Venezuela viva bem, e eu vou cuidar do Brasil."
O presidente petista também afirmoou que pretende manter uma relação de chefe de Estado com o presidente eleito dos Estados Unidos, Donald Trump, a despeito de toda as diferenças políticas com o republicano.
"Não cabe a mim gostar de Trump, cabe entender que o povo americano foi soberano para eleger seu presidente", afirmou o petista. "Espero que Trump trabalhe pela paz e pelo povo americano, e espero ter uma relação civilizada", disse Lula.
"Temos relação histórica com os Estados Unidos e queremos manter", afirmou o petista, ao relembrar os bons contatos que manteve com George W. Bush e Barack Obama durante os dois mandatos anteriores, entre 2003 e 2010.
Questionado sobre a recriação dos ministérios da Cultura e da Igualdade Racial, que haviam sido extintos na gestão de Jair Bolsonaro (PL) e de Michel Temer (MDB), respectivamente, o presidente defendeu a volta das pastas. "Estamos construindo isso porque achamos necessário. Durmo tranquilo com a certeza de que vamos consertar esse país."
Apostas
Ele defendeu ainda uma legislação rigorosa para as bets e citou denúncias de manipulação de resultados de jogos de futebol contra atletas brasileiros. "Não é possível que a gente tenha manipulação na sociedade brasileira", disse o presidente na entrevista exibida na noite de domingo. "Esses meninos que estão jogando no exterior não têm que entrar em falcatrua. Também está em jogo que tipo de ser humano queremos", declarou. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.