Por Stefano Rebaudo
(Reuters) - Um forte movimento de venda nos mercado de títulos que impulsione os rendimentos pode ser uma perspectiva assustadora para os bancos centrais, mas o Federal Reserve pode receber bem uma liquidação que eleve as taxas dos Treasuries para níveis que reflitam melhor a condição robusta da economia.
Rendimentos persistentemente baixos são uma característica dos mercados de títulos em todo o mundo desenvolvido, com os bancos centrais em sua maioria sem pressa para aumentar as taxas de juros, enquanto um excesso de economia de dinheiro global mantém a dívida em constante demanda. As taxas dos títulos caem quando os preços sobem, e vice-versa.
Mas é nos Estados Unidos que a contradição entre a recuperação econômica e os rendimentos dos títulos é mais gritante.
Mesmo com o crescimento em curso para ultrapassar 6% neste ano e expectativa de redução do programa de compra de títulos do Fed no final deste ano, os rendimentos de dez anos dos Treasuries ainda estão presos em pouco acima de 1,3%.
O Fed provavelmente se alegrou com os baixos rendimentos nos estágios iniciais da recuperação econômica, mas agora precisa dos títulos para responder ao fim da recessão associada à pandemia, disse Padhraic Garvey, chefe de pesquisa para as Américas do ING Bank.
Os preços atuais, dizem os analistas, parecem mais consistentes com o aumento da incerteza econômica, ao passo que rendimentos mais altos alinhariam os mercados aos sinais vindos dos bancos centrais.
"Para facilitar isso, argumentamos que é preciso haver um 'tantrum' (onda de vendas). Se o Fed fizer um anúncio de redução de estímulos... e não houver nenhum 'tantrum', isso na verdade é um problema para o Fed", disse Garvey, do ING.
Analistas dizem que um 'tantrum' no mercado de títulos envolveria uma alta de 75 a 100 pontos-base nos rendimentos dentro de um par de meses.
O "taper tantrum" original, de 2013, impulsionou os rendimentos dos EUA em pouco mais de 100 pontos-base nos quatro meses após o então chefe do Fed, Ben Bernanke, sugerir uma redução das medidas de estímulo.
Mas esse tipo de salto repentino nos rendimentos parece improvável agora, dada a clareza com que o Fed tem desenhado seus planos de reduzir a compra de títulos. E, como 2013 mostrou, os "tantrums" do mercado de títulos trazem efeitos colaterais desagradáveis, incluindo fortes vendas de ações e custos de empréstimos mais elevados em todo o mundo.
Uma média favorável, dizem analistas, pode ser alta de 30 a 40 pontos-base nos yields, para 1,6% a 1,8%.
NECESSIDADE DE MUNIÇÃO
Além de desejar rendimentos mais altos para refletir melhor o ritmo de crescimento econômico, o Fed também precisa recuperar alguma munição para conter quedas econômicas futuras.
A taxa básica de juros "overnight" do Fed é de zero a 0,25%, e as autoridades dos EUA, ao contrário do Banco do Japão e do Banco Central Europeu (BCE), não estão inclinadas a considerar juros negativos.
O Fed não vai querer se ver na posição do BCE e do banco central japonês, cujas opções de estímulo no momento se limitam a cortar ainda mais as taxas a território negativo ou comprar mais títulos.
Jim Leaviss, diretor de investimentos da M&G Investments para renda fixa pública, disse que os formuladores de políticas provavelmente gostariam que a taxa dos fundos do Fed fosse de 2% "de forma que quando chegarmos à próxima desaceleração, o Fed tenha algum espaço para cortar taxas de juros sem atingir o limite inferior de zero rapidamente".
Outra razão pela qual rendimentos mais altos podem ser bem-vindos é porque os bancos gostariam de curvas de rendimento mais íngremes para aumentar a atratividade de se fazer empréstimos de longo prazo financiados com empréstimos de curto prazo de depositantes ou mercados.
Thomas Costerg, economista sênior da Pictet Wealth Management, observa que a diferença entre a taxa de fundos do Fed e os rendimentos de 10 anos de cerca de 125 pontos base agora está bem abaixo da média de 200 pontos base observada durante os picos anteriores de expansão econômica.
Ele acredita que o Fed favoreceria uma inclinação de rendimento de 200 pontos base, "não só porque validaria sua visão de que o ciclo econômico está bem, mas também porque uma inclinação de 200 pontos base é saudável para a transformação da maturidade do setor bancário".