Por Ricardo Brito
BRASÍLIA (Reuters) - A Advocacia-Geral da União (AGU) divergiu de manifestação anterior de secretaria do Ministério da Fazenda e afirmou ao Supremo Tribunal Federal (STF) que a tabela de frete de transporte rodoviário de cargos, instituída pela medida provisória 832, "visa a corrigir grave distorção no setor, prejudicial aos caminhoneiros".
Chancelada pela ministra-chefe da AGU, Grace Mendonça, o documento sustenta que a atuação do Estado no domínio econômico é legítima e que há necessidade de se regulamentar os valores dos fretes para promover condições razoáveis de ele ser realizado em todo o território nacional de modo a valorizar o trabalho humano.
"Logo, percebe-se que a edição da medida provisória nº 832/2018 não viola os princípios da livre iniciativa e da livre concorrência, de modo que os referidos primados não devem ser interpretados de forma isolada, devendo-se observar o texto constitucional como um todo, interpretando-o de modo sistemático", diz o documento.
A posição da AGU contrasta com a de outro órgão de governo que também se manifestou ao Supremo, corte que analisa ações que contestam a legislação que instituiu a política de preços mínimos para o setor.
A Secretaria de Promoção da Produtividade e Advocacia da Concorrência (Seprac), vinculada ao Ministério da Fazenda, enviou uma nota técnica ao STF na qual critica a medida provisória.
A secretaria sugere uma atuação do Estado de forma a assegurar que a norma defenda o interesse público e não privados que queiram se esquivar da livre competição.
"É necessário que o Poder Público supervisione ativa e sazonalmente aquele programa, ou aquela política pública, para verificar se os objetivos propostos estão sendo alcançados", afirma a nota técnica, ao defender "idealmente" que tivesse havido uma análise de impacto regulatório antes da entrada em vigor da MP.
"Sem essa supervisão ativa, o tabelamento seria tão somente 'um acordo privado de fixação de preços', ou um cartel institucionalizado pelo Estado", completa o texto.
O órgão da Fazenda entende ser necessário que o "afastamento da concorrência", que pode ocorrer com a política de preços mínimos de frete a partir da medida provisória, ocorra na "menor amplitude possível e pelo menor lapso de tempo possível".
A posição da Seprac foi encaminhada ao ministro Luiz Fux, relator no Supremo de duas ações que tentam suspender os efeitos da medida provisória. Ele pediu a manifestação de vários órgãos envolvidos nessa questão antes de julgar o caso.
Ao longo do documento, a secretaria cita ainda que a MP causou um efeito cascata e ainda provocou o descontentamento dos produtores agrícolas, que não teriam condições de arcar com preço do frete -- segundo estimativas, aumentaria em cerca de 150 por cento.
"Por todo exposto nesta nota, é possível concluir que a Medida Provisória 832, de 2018, ao reintroduzir o tabelamento em setor aberto à livre concorrência sem a devida análise do impacto que a medida terá sobre os demais mercados e, em última análise, sobre o consumidor, não conseguirá assegurar, conforme propôs, 'a existência digna, conforme os ditames da justiça'", finaliza a manifestação.
Antecessora da Seprac, a Secretaria de Acompanhamento Econômico (Seae) elaborou no ano passado um outro parecer apontando que o tabelamento de frentes causaria prejuízos à economia e à produtividade, além do risco de elevação de preços ao consumidor e de aumento de custos em praticamente toda a economia. O parecer foi anexado à documentação enviada pela Fazenda ao STF nesta sexta-feira. [nL2N1T60WN]
A tabela de fretes instituída pela MP atende reivindicação dos caminhoneiros, cuja paralisação interrompeu o abastecimento de alimentos e produtos em todo o país, além de gerar perdas de 15 bilhões para o PIB. [nL1N1TE236]
O tabelamento do frete também é alvo de questionamentos na Justiça de exportadores e produtores rurais, que consideram a medida inconstitucional. [nL1N1TE236]
(Edição de Iuri Dantas)