Por José de Castro
SÃO PAULO (Reuters) - O presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, destacou nesta segunda-feira que o BC continuará monitorando se o crédito está chegando na ponta e que se for preciso a instituição anunciará mais medidas para aperfeiçoar o direcionamento dos recursos.
Ele disse acreditar que a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) conhecida como "Orçamento de Guerra" --que, entre outras ações, permite ao BC comprar títulos diretamente no mercado-- será aprovada pelo Congresso Nacional e ajudará a melhorar a fluidez do mercado de crédito.
O chefe do BC afirmou, ainda, que o cenário analisado pelo Comitê de Política Monetária (Copom) em sua última reunião --em 17 e 18 de março-- mudaram.
Na ocasião, o colegiado cortou a Selic em 0,50 ponto percentual e avaliou que tanto uma redução maior no juro quanto afrouxamentos monetários adicionais poderiam se tornar "contraproducentes" se resultarem em aperto das condições financeiras.
"Em nenhum momento dissemos que a política monetária não era efetiva, que tinha perdido efetividade e que não estávamos olhando para isso", afirmou Campos Neto na live promovida pelo Grupo Estado.
O presidente do BC foi questionado sobre a reação do mercado de juros a comentários feitos por ele mais cedo nesta segunda-feira em videoconferência fechada à imprensa. "O que falamos é que entendemos que as condições que tínhamos no Copom mudaram muito de lá para cá, inclusive as expectativas de inflação."
As taxas de DI tiveram fortes quedas, com o DI janeiro 2021 --que concentra apostas para o patamar da Selic ao fim de 2020-- fechando na casa de 2,8%. O juro básico está atualmente em 3,75% ao ano.
Perguntado sobre a reação do mercado nesta segunda ao noticiário político doméstico, Campos Neto disse que "não teve nenhum grande fator no mercado" que tenha chamado sua atenção.
"Nosso trabalho não é muito comentar o que está acontecendo (do lado político), mas entender o que isso significa para a nossa política." Para Campos Neto, há "pouca dúvida" de que a PEC será aprovada e não existem "grandes dificuldades" no Congresso para aprovar as medidas.
O dólar fechou na segunda maior cotação da história, e o Ibovespa ficou praticamente estável.
FLUIDEZ DO CRÉDITO
O presidente do BC foi perguntado várias vezes sobre como a autoridade monetária garantiria que o crédito chegue a quem mais precisa e a que preço.
Campos Neto respondeu que o que o BC pode fazer agora é monitorar se isso está acontecendo. Mas ressalvou que se for necessário mais medidas de direcionamento poderão ser anunciadas, sem dar mais detalhes.
"Entendemos que o Brasil fez mais cedo (medidas) e mais quantidade, fez mais direcionamento, então isso deve começar a fluir melhor", disse, admitindo, contudo, que isso não significa que o preço do crédito será o mesmo de antes, já que, argumentou, o prêmio de risco está maior.
Ele citou dados divulgados mais cedo pelo próprio BC sobre concessões de crédito em março, quando o país já sofria o baque do Covid-19. As concessões aumentaram, e, segundo o BC, esse desempenho está relacionado às medidas tomadas pela autarquia para promover o bom funcionamento do mercado financeiro.
Campos Neto citou que, da linha de 91 bilhões de reais criada pelo Conselho Monetário Nacional (CMN) para o Banco Central conceder empréstimos aos bancos com garantia de debêntures, já houve operações totalizando "mais ou menos" 9 bilhões de reais.
Mas tem havido "pouca demanda" do lado de operações com Depósito a Prazo com Garantia Especial --cujo garantia do Fundo Garantidor de Crédito (FGC) foi elevada para 40 bilhões de reais.
Entre as operações compromissadas com títulos em moeda estrangeira, "mais ou menos 15%" do total esperado já foram realizados, disse o chefe do BC. E já existem empréstimos aprovados com lastro em letras financeiras garantidas.
"De certa forma, o potencial de 1,2 trilhão (de reais nas medidas), estamos caminhando nele."
Campos Neto classificou como "falta de conhecimento" propostas de venda de dólares das reservas a fim de levantar recursos para investimento em infraestrutura, por exemplo. Segundo ele, dado o histórico da formação das reservas no país, vendê-las com esse fim seria o mesmo que emitir dívida, o que elevaria a dívida líquida.
ATUAÇÃO COM TESOURO
O chefe do BC disse que não há ideia de "competir" com o Tesouro Nacional no mercado de títulos públicos, mas "complementar", e que a intenção é atuar no mercado de juros quanto se perceber disfuncionalidades.
"O Tesouro pode entrar. Ele vai ter as limitações, e a gente vai estar sempre agindo em coordenação", afirmou. Campos Neto frisou que o objetivo não seria "forçar" a curva longa de juros para baixo em momentos de estresse, mas "evitar que ela suba de forma disfuncional".
Campos Neto disse que o Tesouro tem limitações de caixa --o qual, segundo ele, atualmente atende a seis meses de vencimentos--, enquanto o BC tem um balanço com "espaço bastante grande".
O BC pode atuar no mercado secundário de títulos via leilão e "hoje" não há "nenhuma" dificuldade de financiamento para o governo, também porque as taxas de juros caíram.